Costa da Ipiranga
Moradores de bairro de Gravataí onde fica aterro que recebia lixo da enchente temem contaminação da água
Desde sexta-feira (19), por orientação do MP e da Secretaria do Meio Ambiente de Gravataí, o envio de entulhos vindo de Canoas e Porto Alegre está suspenso. Conforme o MP, o espaço precisa passar por adequações. Habitantes reclamam do mau cheiro e da estrada esburacada em razão do tráfego constante de caminhões
Mau cheiro, estradas esburacadas em função do volume de caminhões que trafegavam pela região, e medo em relação ao futuro da água. Moradores do bairro Costa da Ipiranga, na zona rural de Gravataí, pedem providências acerca do aterro São Judas Tadeu, que fica no local. A unidade recebia entulhos da enchente, mas teve o serviço suspenso na última semana.
Clarissa Rodrigues, 41 anos, e o marido, Paulo, convivem com o mau cheiro há semanas. Eles afirmam que o problema já existia antes da enchente, mas se agravou com o aumento no volume de resíduos levados até o aterro.
A residência do casal fica a 200 metros da entrada do aterro, e o odor impregnava a sala e o quarto.
— Temos até poço cavado aqui e essa possível poluição é uma grande preocupação, além do cheiro. Todos temos poços. Ter uma água que não é saudável para nós é preocupante — diz Clarissa.
A aposentada Edir Sanches, 67, conta que o problema vem impactando a rotina dela e até mesmo dos vizinhos, já que o cheiro invade as casas e afeta até os animais.
— A gente acorda com essa carniça, mesmo agora que eles estão proibidos, né? Antes, estava ainda pior e até os meus cachorros estavam doentes por causa desse cheiro insuportável — lamenta.
Desde sexta-feira (19), por orientação do Ministério Público (MP) e da Secretaria do Meio Ambiente de Gravataí, o aterro não recebe lixo vindo de Canoas e Porto Alegre. Conforme o MP, o espaço precisa passar por adequações.
A EGTR, responsável pela unidade São Judas Tadeu, foi questionada pela reportagem sobre as medidas que serão adotadas, mas não se manifestou até esta publicação. Na semana passada, após o pedido do MP, a empresa divulgou nota em que afirma que o aterro "está devidamente autorizado pelos órgãos competentes para operar" e que os responsáveis foram surpreendidos pela suspensão. O comunicado também diz que a companhia "atenderá as exigências que se mostrarem necessárias".
Preocupação com a água
As famílias também temem que o aterro São Judas Tadeu impacte os lençóis freáticos da região. São residentes de ao menos três ruas que ficam no entorno do terreno onde está o entulho.
A maioria dos moradores depende de poços artesianos e entende que, além do odor e do impacto na única via que dá acesso à RS-118, também possam ver sua água contaminada no futuro.
João Maier, 72, possui três poços artesianos no terreno em que reside.
— A gente tem medo que possa contaminar a nossa água — conta.
O movimento intenso no acesso ao aterro após a enchente também gerou problemas relativos à mobilidade. A Estrada Abel de Souza Rosa, que não é pavimentada, está cheia de buracos. No trecho mais próximo ao aterro há recomposição com pedras de calcário e brita, feita pela própria empresa.
Com os danos à estrada, dezenas de moradores relatam problemas nos seus automóveis. A empreendedora Sinara da Cruz Lopes, 53, que reside no bairro há uma década, caminha três quilômetros até chegar em um trecho da RS-118, onde pode chamar o transporte por aplicativo, que não vai até a rua em que ela reside.
— Toda nossa luta era por uma estrada melhor. A gente nem tem conseguido transitar e tem morador que precisa levar outra muda de roupa para trabalhar por conta do barro. Agora, por causa desse aterro, piorou infinitamente a situação — disse Sinara.
Reunião nesta quinta
Em entrevista ao Gaúcha Atualidade na quarta-feira, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, disse que, se a indefinição em torno do aterro de Gravataí continuar, será preciso alterar contratos a partir da próxima semana.
O plano B, segundo Melo, é enviar os detritos para Minas do Leão, o que, de acordo com ele, "vai custar três vezes mais".
Uma reunião sobre o tema, envolvendo as prefeituras de Gravataí, Porto Alegre e Canoas, a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM) e o Ministério Público, está prevista para esta quinta-feira (25).
Justiça nega pedido de responsáveis por aterro para retomar serviço
A 4ª Vara Cível Especializada em Fazenda Pública da Comarca de Gravataí negou liminarmente na quarta-feira (24) o pedido dos responsáveis pelo aterro São Judas Tadeu para retornar ao funcionamento. A empresa responsável pelo local solicitou a suspensão do ato administrativo que impede a continuidade do descarte dos detritos na área. De acordo com a gestora da unidade, houve falta de prévio processo administrativo e de ponderação acerca das consequências da medida. A decisão da Justiça considerou que a suspensão foi legitima por questões ambientais. Zero Hora tenta contato com os responsáveis pelo aterro.