Dourados
Caso de médico gaúcho torturado e assassinado há um ano no MS terá primeira audiência nesta quinta-feira
Gabriel Paschoal Rossi, 29 anos, foi encontrado morto dentro de uma casa em julho do ano passado, após ficar dias desaparecido. Quatro réus – uma mulher e três homens – acusados de terem cometido o crime seguem presos
O desaparecimento de um médico gaúcho, em julho do ano passado, em Dourados, no Mato Grosso do Sul, terminou de forma trágica. Gabriel Paschoal Rossi, 29 anos, foi encontrado morto, com sinais de tortura, dentro de uma casa alugada na mesma cidade. Pouco mais de um ano após a descoberta do crime, a primeira audiência do caso será realizada nesta semana. Quatro réus continuam presos, acusados de terem torturado e assassinado a vítima.
A investigação do crime na época levou a Polícia Civil a concluir que Rossi foi morto por um grupo liderado por uma mulher. Segundo a apuração, Bruna Nathalia de Paiva, 30 anos, devia valores ao médico, estimados em cerca de R$ 500 mil.
Após ter sido confrontada por ele a realizar o pagamento, conforme a polícia, a mulher teria decidido matar o médico. Para concretizar o assassinato, ela teria contratado os executores.
Além da mulher, respondem pelo assassinato Gustavo Kenedi Teixeira, 28, Keven Rangel Barbosa, 23, e Guilherme Augusto Santana, 35.
Em depoimento à polícia, os três homens afirmaram terem sido contratados por Bruna para cometer o crime. Moradores da cidade de Pará de Minas, em Minas Gerais, os quatro viajaram juntos até o Mato Grosso do Sul. No caminho, cruzaram a fronteira até o Paraguai para adquirir duas armas de airsoft, que teriam sido usadas para surpreender e enganar a vítima.
“A família ainda vai demorar muito para superar isso”, diz advogado
Responsável por representar a família de Rossi no processo, como assistente de acusação, o advogado Thiago Santos Conrad diz que a expectativa é de que a audiência sirva para esmiuçar o processo e auxiliar na compreensão de como se deu o crime.
— A expectativa da família nessa audiência é confirmar todos os fatos e provas que foram anexados ao processo penal, com o inquérito policial, com oitiva de testemunhas, desvendando todos os fatos, os porquês desse crime tão bárbaro. Essa é a intenção da família, é ver se fazer justiça ao final desse processo — diz Conrad.
Nenhum dos familiares de Rossi foi indicado como testemunha no processo, já que, segundo o advogado, eles só tinham contato com o médico, sem ter informações sobre o fato em si.
— O impacto da família do Gabriel não poderia ser diferente, diante desse crime bárbaro. Levando em consideração como aconteceu esse crime, com as torturas, as agressões, o impacto não poderia ser outro: tristeza, dor, abalo emocional, psicológico da família. Somente em pensar que o Gabriel agonizou por alguns dias amarrado, torturado, machucado. É isso que mais pesa no consciente da família do Gabriel. A tristeza é muito grande. A família ainda vai demorar muito para superar isso — afirma o advogado.
Em relação aos fatos narrados pela polícia, de que o médico integrava um esquema de golpes, o advogado afirma que a família ficou surpresa e que não tinha nenhum conhecimento sobre isso.
— Era um jovem médico, sempre lutou por seus objetivos. Sempre correu atrás, sempre fez cursos para poder passar em Medicina. Um guri muito estudioso. Trabalhava em três hospitais. Buscava sempre suas conquistas, sonhos, objetivos. Uma pessoa muito solidária — diz Conrad.
Esquema de golpes
Segundo a investigação, o médico e Bruna se conheciam havia algum tempo e integravam o mesmo grupo envolvido em golpes. A Polícia Civil do MS apurou que as trapaças envolviam o uso de cartões clonados e saques com documentos adulterados.
Rossi seria o responsável por fazer os saques e repassar o dinheiro à quadrilha. Bruna é apontada como a pessoa que comandava o esquema, do qual o gaúcho faria parte. O médico teria passado a ameaçar a mulher, dizendo que entregaria o esquema à polícia.
Audiência desta quinta
Na audiência, prevista para ser realizada na tarde desta quinta-feira (22), por meio de videoconferência, devem ser ouvidas as primeiras testemunhas do caso. Nove pessoas foram indicadas pela acusação e defesas para darem seus depoimentos nesta data.
A expectativa é de que os réus sejam interrogados somente em outra audiência. Isso porque, antes de eles falarem, precisam ser ouvidas todas as testemunhas. Ainda não há nova audiência agendada, o que só deve ocorrer ao final da sessão desta quinta-feira.
Somente após ser finalizada esta etapa, chamada de instrução, é que o Judiciário definirá se os quatro devem ou não ser submetidos a júri pelo crime. Os presos são acusados de homicídio qualificado, tortura e furto qualificado.
O caso
O sumiço
O médico desapareceu em 26 de julho de 2023, data em que deixou o trabalho após concluir o plantão, em Dourados. O sumiço foi percebido durante o fim de semana, quando o gaúcho deixou de conversar com pessoas próximas. As buscas tiveram início na quarta-feira, 2 de agosto, quando foi realizado registro do desaparecimento.
A vítima
Natural de Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo, Rossi era formado em Medicina pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). Trabalhava na Unidade de Pronto Atendimento (UPA), na Caixa de Assistência dos Servidores do Estado de Mato Grosso do Sul (Cassems) e no Hospital da Vida.
Descoberta do crime
O médico residia num apartamento em Dourados, mas o corpo dele foi localizado numa casa alugada, em 3 de agosto do ano passado. Uma vizinha ligou para a polícia relatando odor desagradável e a presença de um carro — o de Rossi — parado no local havia uma semana. O veículo, um HB20, estava estacionado em frente à casa.
Quando os policiais chegaram ao local, encontraram o corpo de Rossi dentro do quarto, sobre a cama. O cadáver já estava em decomposição, indicando que a morte teria ocorrido dias antes. O corpo foi encontrado com pés e mãos amarrados, com sinais de asfixia.
Os presos
A polícia descobriu que o celular de Rossi emitia sinais em Minas Gerais. Naquele momento, suspeitava-se que o médico pudesse ter sido sequestrado. Após o sumiço, mensagens chegaram a ser trocadas com familiares e amigos dele. Segundo a polícia, quem enviava essas mensagens era Bruna, tentando se passar pela vítima. Amigos e pessoas próximas ao médico indicaram o nome de Bruna, que residia em Minas Gerais e manteria contato com Rossi havia algum tempo.
Com a localização do corpo, os investigadores descobriram que uma outra casa havia sido alugada em Dourados para o período de 26 e 27 de agosto. Nesse imóvel, que fica a cerca de cinco quilômetros de onde estava o corpo do médico, a polícia conseguiu obter imagens de câmeras de segurança. A partir daí, os suspeitos de envolvimento foram identificados. Com auxílio da polícia mineira, foram localizados os endereços dos suspeitos, que acabaram presos.
Como teria ocorrido a morte
Na manhã de 27 de julho, Rossi teria ido até a casa na Vila Hilda, em Dourados, para encontrar uma pessoa indicada por Bruna. O crime, segundo a investigação, já havia sido planejado. O grupo havia chegado ao Mato Grosso do Sul um dia antes e aguardava pelo médico.
Na casa, Rossi teria sido torturado pelos criminosos. Foi usada uma sacola plástica para asfixiar a vítima, que tinha também perfuração no pescoço. A perícia indicou que a morte de Rossi só teria acontecido cerca de 48 horas depois. Isso fez a polícia concluir que o médico não estava morto quando foi deixado no local, mas não conseguiu pedir socorro porque estava amarrado e ferido.
Contrapontos
O que diz a defesa de Gustavo Kenedi Teixeira
A advogada Débora Ferreira encaminhou nota assinada pelos advogados Talesca Campara de Souza, Cleber Paulino de Castro e Matheus de Lima Marta Correia, também responsáveis pela defesa de Gustavo Kenedi Teixeira.
Nela, a defesa afirma que está “empenhada e comprometida para apresentar as evidências de forma técnica e precisa” e que o réu “desde o ocorrido se colocou à disposição das autoridades com o objetivo de constatar a realidade dos fatos, oferecer esclarecimentos e colaborar com a investigação”.
Confira a nota na íntegra:
“A Defesa técnica, composta pelos advogados Talesca Campara de Souza, Cleber Paulino de Castro e Matheus de Lima Marta Correia, está empenhada e comprometida para apresentar as evidências de forma técnica e precisa, bem como, o Sr. Gustavo Kennedy Teixeira, desde o ocorrido se colocou à disposição das autoridades com o objetivo de constatar a realidade dos fatos, oferecer esclarecimentos e colaborar com a investigação e não se furtará de requerer ao juízo as diligências que entender necessárias para a elucidação dos fatos e a consequente busca pela justiça.
Durante análise processual constatou-se que, embora tenham sidos juntados diversos laudos periciais, a integralidade das provas que constituem elementos probatórios, ainda não constam nos autos do processo. A título esclarecedor, a defesa ressalta a importância de acesso a tais provas afim de possibilitar o exercício da plena defesa do Denunciado, que podem inclusive levar a eventuais apontamentos de nulidades processuais.
A audiência de instrução está agendada para o 22/08/2024, quando deverão ser ouvidas as testemunhas que foram arroladas tanto pelo Ministério Público Estadual, quanto pelas Defesas e, ao final, serão interrogados os Denunciados.
Sabemos da importância dos meios de comunicação, e por isso, solicitamos a compreensão e imparcialidade da imprensa e dos meios de comunicação. Destacamos ainda o quão fundamental é preservar a integridade do devido processo legal e garantir o respeito aos direitos de todos os envolvidos, em especial a presunção de inocência.
Nosso compromisso é zelar pela transparência e pela precisão na divulgação de informações relevantes à imprensa, assegurando que o andamento do processo seja comunicado de forma clara, ao mesmo tempo em que respeitamos integralmente o sigilo necessário”.
O que diz a defesa de Bruna Nathália de Paiva
A reportagem entrou em contato com a advogada Thaisa Fernandes de Noronha, responsável pela defesa de Bruna Nathália de Paiva, e aguarda retorno. O espaço está aberto para manifestação.
O que diz a defesa de Keven Rangel Barbosa e Guilherme Augusto Santana Coelho
O advogado Felipe Laranjo, que atua na defesa dos réus Keven Rangel Barbosa e do réu Guilherme Augusto Santana Coelho, foi procurado pela reportagem, que aguarda retorno. O espaço está aberto para manifestação.