Tempo de saudade
Dia de Finados começa com homenagens na Capital
Centenas de pessoas visitaram os túmulos de entes queridos com flores e materiais de limpeza na manhã deste sábado (2)
— Que saudade da vó, mãe!
A frase de uma pequena menina, ao redor dos seus seis anos, é a primeira voz que a reportagem da Zero Hora ouviu ao passar pelo arco do Cemitério Santa Casa, na Capital, na manhã deste sábado (2) de Finados. Ao atravessar a estrutura, com a tradicional mensagem incrustrada em latim “Volta para o lugar de onde vieste”, a fala ecoou o sentimento de saudade e de carinho que preencheu a manhã silenciosa deste sábado que viria a seguir, quando centenas de pessoas visitaram os túmulos de entes queridos para prestar suas homenagens.
Acompanhada da sua mãe, Elsa Maria, 82 anos, a professora Patrícia Davila Iser, 52 anos, era uma delas. Na ala vertical do cemitério, onde estão dispostos os caixões em gavetas, mãe e filha limparam e floriram o espaço em homenagem a um tio e uma tia da família.
— É uma forma de homenagear tudo o que eles fizeram por nós. Demonstrar o meu sentimento de amor, que cada ano se torna mais forte. De saudade — conta Patrícia.
E o hábito já virou tradição. Há 20 anos, desde o falecimento da sua madrinha, as duas vêm todo dia 2 de novembro, carregadas de flores coloridas e material de limpeza.
— Minha madrinha tinha um canteirinho (na sua casa), gostava muito de flores — recorda ainda a afilhada.
Do outro lado da rua, no Cemitério São Miguel e Almas, outra dupla de mãe e filha prestava suas homenagens, em um dos andares dos vários prédios característicos do espaço. Desta vez, para um filho — e irmão.
— Me sinto um pouco mais confortada. Não sei te explicar. É o modo que eu acho de matar a saudade. De ficar um pouco mais próxima dele — explica a irmã, Gabrielly Cristiane Valério, 28 anos, auxiliar de serviços gerais, enquanto decorava o túmulo com uma rosa amarela.
Conhecido como "Lipe", o irmão faleceu em um acidente de moto, há cinco anos, quando tinha 22.
— E dia 15 (de novembro) a gente vem de novo. É quando ele fazia aniversário — adianta a mãe, Kelly Cristiane Garcia Valério, 51 anos, também auxiliar de serviços gerais.
No térreo, em meio a sepulturas suntuosas do local, alguns jazigos já estavam sendo limpos logo cedo pelas mãos de Carina Cristina Vieira. No seu caso, a limpeza faz parte do seu trabalho como florista, que passou de avó para mãe, e de mãe para filha.
Segundo ela, nunca imaginou trabalhar com isso. Mas sua mãe envelheceu e ficou doente.
— A partir daí, tive que aprender na marra. Quer dizer, na dor — revela Carina à Zero Hora.
E a sua dedicação não se restringe ao dia 2 de novembro. Além de trabalhar em uma das bancas de flores na Avenida Professor Oscar Pereira, vem todo sábado limpar alguns jazigos. É assim há anos.
— Hoje, pensei em fazer algo bem especial, para que as famílias (que irão visitar os jazigos mais tarde) se alegrem, não fiquem tristes — detalha a florista, enquanto manuseava com uma tesoura e toda a sua técnica alguns lírios.
Do lado de fora dos cemitérios, a venda das tradicionais floriculturas já estava movimentada desde às 7h da manhã. Na Rosa Bischoff, que está localizada em frente à Praça da Saudade, há 11 anos, a florista Karina Araujo diz estar com uma expectativa "bem grande" para esse ano:
— Acho que deve ser até maior do que foi no ano passado. As pessoas estão com grande dificuldade financeira, muitas desempregadas, mas estamos percebendo que muitas vêm aqui nem que seja para levar uma rosinha para quem amava tanto.
Entre as mais pedidas, os crisântemos, as rosas e os cravos se destacam. Parte delas vem de São Paulo e outra, do Rio Grande do Sul.
— Geralmente, compra-se as flores que as pessoas mais gostavam em vida — acrescenta Karina.
Em todo o país, o Instituto Brasileiro de Floricultura (Ibraflor) estima um crescimento de 6% a 7% na comercialização de flores, se comparado com 2023. No Rio Grande do Sul, a perspectiva é de que as vendas sejam parecidas, principalmente no interior do Estado.
Com relação à movimentação de pessoas neste sábado, Fernando Ribeiro, coordenador operacional do Cemitério São Miguel e Almas, acredita que seja maior do que em anos anteriores:
— Não teve feriadão, então muitas pessoas devem acabar optando por visitar o cemitério nesta data mesmo.
Confira a programação
Para receber os visitantes nesta data, estabelecimentos funerários de Porto Alegre e Região Metropolitana prepararam uma programação especial. Missas, sessões de cinema ao ar livre e bênção a pets e humanos são algumas das atividades previstas.
No Cemitério Jardim da Paz, localizado no bairro Agronomia, na Capital, por exemplo, ocorreu pela manhã uma chuva de pétalas. A coordenação do espaço calcula que 180 quilos foram lançados do ar.