Papo Reto
Manoel Soares: "A lista"
Colunista escreve no Diário Gaúcho aos sábados
Eu fiz uma lista para meu velório, mas a lista de quem não quero que vá. Importante que você lembre que não estou, neste texto, falando de velório.
Boa parte das pessoas que vão a um velório, não é por gostar da pessoa que partiu, mas para ver o morto. Quando olham para alguém no caixão, tem algo estranho no rosto delas, como se se sentissem mais vivas, com um brilho sutil de superioridade. Comentam baixinho segredos que quem partiu pediu que fossem guardados, comentam da comida, falam dos algodões no nariz, da cor da pele e por aí vai. Nos velórios, quem vai se sente à vontade para fazer todo tipo de julgamento disfarçado de memórias saudosas e afetuosas. É como se quisessem se sentir mais vivos diante da morte dos outros. Lembre, não estou falando de velório, mas das pessoas que, quando estamos em uma situação ruim, vêm assistir nossa dor como quem traz solidariedade, mas, na verdade, ficam de camarote contando as horas das lágrimas.
É comum que vejamos isso com amigos que não são de verdade, aqueles que sempre trazem nas horas alegres os riscos de tristeza que acompanham o momento, não por cuidado, mas como uma mosca na sopa. Geralmente, eles não nos dão motivos concretos para expulsá-los da nossa vida, mas não entregam razões para ficar e, por uma educação cultural e um pacto informal, não os mandamos embora. Esses espectadores de nossos velórios precisam sair, porque emanam energias que contaminam as alegrias como gases tóxicos em quarto de bebê.
Eu já fiz a minha lista de quem não quero em meu velório, meu argumento é simples: quem não me respeitou na vida, não fará isso na morte.