Peregrinação de anos
Troca de mensagens em rede social pode colocar fim a busca de filha por mãe biológica após três décadas
Caso aconteceu em Charqueadas (RS), e as duas já trocam fotos e confidências
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Em 25 de fevereiro passado, a cuidadora de idosos Vanessa Silva de Souza, 34 anos, postou a seguinte mensagem no Facebook:
"Pessoal, nasci em Charqueadas em 20.03.90. Passei apenas 6 meses lá e fui doada. Não sei nada da minha família e nem onde nasci. Sei que na época o nome da minha mãe era Cristiane da Silva e que ela tinha 15 anos quando nasci. Queria saber mais do meu passado, quem sabe encontrar ela".
Menos de 24 horas após a postagem, Vanessa recebeu, na página Aconteceu em Charqueadas, a resposta pela qual aguarda há quase 35 anos. Estava em meio a mais de 150 recados e desejos de sucesso.
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"Oiiiii linda, eu me chamo Cristiane da Silva e tenho 51 anos. Há trinta e três anos eu tive uma filha linda e com o nome Vanessa da Silva. Minha mãe, com a prima dela, deram a minha filha. Eu passei muito trabalho na minha infância, então não queria que ela passasse o que eu passei, contra a minha vontade. Eu dei a minha princesa linda. Hoje eu estou bem, graças a Deus. Tenho outra filha linda, mas há anos que eu procuro pela a minha filha amada . Eu tenho até vergonha, mas eu sei que isso é obra de Deus. Não vejo a hora de botar no colo. Deus que sabe o que esta fazendo. Realmente, ela nasceu em 20. 03. 1990. Minha filha amada."
Uma prima, Marivone Maia, viabilizou a troca de telefones entre as duas. Elas ainda não se encontraram (Vanessa mora em Viamão, Cristiane em São Leopoldo), mas desde o primeiro contato trocam fotos, documentos (inclusive o registro de nascimento de Vanessa) e confidências.
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A reportagem conversou com as duas. Vanessa está cautelosa, mas otimista. Quer fazer exame de DNA antes de comemorar antecipadamente. Já Cristiane começa a chorar assim que se menciona o assunto.
— Olha, estou muito emocionada, muito, muito. Há 34 anos procuro minha filha. Desculpa estar desabafando assim, mas tá louco, eu amo minha filha, amo, amo. É tanta emoção. Só vai cair a ficha quando eu ver ela. Contei pra ela, ela entendeu — diz Cristiane, entre lágrimas.
Cristiane, hoje uma dona de casa e pensionista do INSS, relata que sua mãe (já falecida) e familiares decidiram que ela não teria condições de criar uma filha aos 15 anos. Foi uma gravidez não planejada. Ela mal conhecia o pai da criança e não tinha contato com ele.
Por um tempo Cristiane morou em um abrigo, depois voltou para a casa da mãe. Ela diz que, sem que tivesse noção, familiares acabaram doando o bebê para um casal, que criou a recém-nascida.
Cristiane disse que foi para São Leopoldo logo após sua mãe entregar o bebê a outra família. Mas, depois de um tempo, começou a procurar pela menina. Anos de busca por redes sociais. Chegou a encontrar, ano passado, uma outra Vanessa, nascida na mesma época. Fizeram teste de DNA e o resultado foi incompatível. Decepção de ambas as partes, conforme essa outra Vanessa relatou à reportagem, no último fim de semana.
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Já Vanessa assegura que o pai e a mãe que a criaram agiram com sinceridade: desde cedo admitiram que ela era adotiva.
— E me estimularam a procurar minha mãe biológica. São amorosos e adoro eles. Meu marido também apoiou — relata Vanessa.
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Agora, a esperança voltou. Cristiane não tem nenhuma dúvida de que a Vanessa com quem se comunica desde o dia do recado na página de Charqueadas é mesmo sua filha. A começar pela data de nascimento da certidão e também pelas fotos de quando era bebê. O tip-top que Vanessa usava nos primeiros meses de vida é praticamente idêntico a um que foi guardado por Cristiane, quando a menina lhe foi retirada para doação.
Mais do que isso, o que impressiona é a semelhança entre Vanessa e Cristiane, duas morenas de olhos puxados, com porte similar. Para não dar margens a dúvidas, aquela que agora já se considera filha quer confirmar tudo via DNA. Até por certo receio de decepção, as duas ainda não se encontraram. O abraço tem data marcada: o dia em que ambas forem coletar material genético no laboratório, em Porto Alegre.