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Atuação reforçada

Após ajudar atingidos pela enchente no RS, agência da ONU especializada em refugiados inaugura escritório em Porto Alegre 

Unidade da Capital será apenas a sétima da organização no Brasil

27/05/2025 - 12h22min

Atualizada em: 27/05/2025 - 12h23min


Mathias Boni
Mathias Boni
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Durante a enchente que devastou o Rio Grande do Sul em 2024, uma das organizações internacionais que se mobilizou para auxiliar os atingidos foi o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur). A instituição, ligada à Organização das Nações Unidas (ONU), mandou uma missão para ajudar, inicialmente, os refugiados que habitam o território gaúcho, mas acabou atuando em diversas frentes durante a tragédia. Para consolidar sua presença no Estado, reforçada pela atuação nos últimos meses, o Acnur inaugurou nesta segunda-feira (26) o primeiro escritório permanente em Porto Alegre.

— Temos uma atuação internacionalmente reconhecida na proteção aos refugiados que se deslocam, mas também é papel do Acnur ter uma resposta emergencial a crises humanitárias repentinas, como ocorreu no Rio Grande do Sul no ano passado — afirma o italiano Davide Torzilli, representante do órgão no Brasil desde janeiro de 2023, que esteve em Porto Alegre para a inauguração da representação.

O Acnur foi criado em 1950, com o objetivo principal de prestar auxílio aos cidadãos perseguidos e forçadamente deslocados de seus países após a Segunda Guerra Mundial. Sua atuação tem como base a Convenção das Nações Unidas Relativa ao Estatuto dos Refugiados, adotada em 1951 e que tem hoje cerca de 149 países signatários, incluindo o Brasil. As atividades da instituição se focam historicamente no auxílio internacional a refugiados, a cidadãos forçadamente deslocadas dentro de seu país, ou a apátridas, mas têm se voltado cada vez mais também a pessoas que são obrigadas a deixar suas casas em razão de tragédias climáticas

Durante a tragédia climática que atingiu o Rio Grande do Sul em 2024, os servidores da instituição se valeram da experiência em locais em conflito para contribuir com a organização de abrigos emergenciais, inclusive com a doação de itens como colchões, mochilas, utensílios de higiene e até casas provisórias.

— Atualmente são cerca de 140 milhões de pessoas no mundo que são refugiadas por guerras ou perseguições políticas e sociais em seus países, mas o número de pessoas que foram obrigadas a se deslocar de suas casas em razão de tragédias climáticas nos últimos 10 anos já chega a 220 milhões. A gente não define essas pessoas tecnicamente como refugiados climáticos, por questões técnicas da legislação, mas é uma expressão que ajuda a entender a condição destes deslocados forçados, que também estão no nosso escopo de proteção — reforça Davide Torzilli.

Essa atuação ampliada da agência contribuiu para o Acnur estabelecer seu primeiro escritório em Porto Alegre. A unidade na Capital será apenas a sétima da agência no Brasil, que também tem representações em Brasília (DF), São Paulo (SP), Manaus (AM), Boa Vista (RR), Pacaraima (RR) e Belém (PA).

O escritório do Acnur na Capital abrirá de segunda a sexta-feira, sendo localizado no sexto andar do prédio do Ministério Público Estadual, na Avenida Coronel Aparício Borges, 1.817, bairro Partenon. Serão quatro servidores atuando no local — a mineira Pollyana Lima será a coordenadora da unidade.

Empregabilidade e integração 

Faz parte do processo de acolhimento de refugiados e imigrantes forçadamente deslocados a sua posterior integração na sociedade que os recebe. Um dos principais meios para alcançar este objetivo é garantir que os cidadãos acolhidos tenham boas condições de empregabilidade.

Por isso, além do atendimento regular para regularização de documentos e status migratório, outro foco de atuação do escritório do Acnur em Porto Alegre será o de auxiliar na contratação dos refugiados e imigrantes forçados que estão no Estado.

Na terça-feira (26), a agência assina um memorando com a Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social (FGTAS), a fim de estabelecer uma cooperação institucional para fomentar a contratação destes cidadãos no Estado.

— A integração econômica e social dos refugiados e imigrantes forçados aqui no Rio Grande do Sul vai ser uma prioridade deste escritório. O Rio Grande do Sul é o terceiro Estado brasileiro que mais recebe venezuelanos através da interiorização na Operação Acolhida, e, ao mesmo tempo que esses refugiados precisam de empregos, o Estado também tem uma demanda crescente por mão de obra — ressalta Torzilli.

André Ávila/Agencia RBS
Torzilli é o chefe do Acnur no Brasil desde janeiro de 2023.

Para reforçar esse movimento de integração, deve ser anunciado no segundo semestre um conjunto de companhias gaúchas que integrarão a plataforma Empresas com Refugiados do Acnur, que hoje conta com cerca de 140 companhias no Brasil. Estas empresas têm programas especiais de contratação de refugiados e imigrantes forçados, e sua participação é fundamental para a integração socioeconômica destes cidadãos.

— A lei brasileira é uma das mais progressistas do mundo no que diz respeito aos direitos dos refugiados. Mesmo os solicitantes de refúgio, a partir do momento em que fazem essa solicitação, já passam a ter praticamente todos os mesmos direitos do que os brasileiros, podendo trabalhar legalmente no país, e também acessar os sistemas públicos de saúde e educação, por exemplo — destaca o representante do Acnur no Brasil. 

Cortes de Trump impactam agência

Um fator que vem dificultando a atuação global do Acnur nos últimos meses é o corte, por parte do governo de Donald Trump, de financiamento a agências ligadas à ONU. Os Estados Unidos são os principais financiadores destas organizações, mas Trump se notabilizou desde seu primeiro mandato como um opositor ao sistema das Nações Unidas.

— Os cortes dificultam muito, com certeza. Nos últimos meses, temos cortado cerca de até 40% das nossas atividades e de nosso staff em razão dessas dificuldades. Estamos vivendo um momento de crise do multilateralismo, com redução do apoio às respostas humanitárias, justamente em um momento em que essa necessidade só cresce — destaca Davide Torzilli.


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