RECOMEÇO GAÚCHO
Um ano após a enchente, veja como está a Escola David Riegel Neto, restaurada pela comunidade
Instituição localizada em Eldorado do Sul, foi duramente afetada pela cheia de maio de 2024 e foi praticamente reconstruída, com doações e apoio de diferentes partes.


Eldorado do Sul foi uma das cidades mais afetadas pela enchente de maio de 2024. De forma devastadora, foi tomada pelas águas. No início daquele mês, a estimativa era de 20 mil a 30 mil desabrigados. Durante a cheia, o Diário Gaúcho acompanhou a situação da Escola Municipal de Ensino Fundamental David Riegel Neto, localizada no centro do município e duramente afetada pela enchente.
Agora, um ano após o episódio, o cenário é outro. As paredes marcadas de marrom pela lama e os móveis danificados deram lugar à esperança e ao cuidado dos funcionários, que reuniram forças para reerguer a escola. A partir de muitas doações e apoio de diferentes partes do Brasil, a David Riegel Neto foi reconstruída praticamente do zero.
Atualmente, a escola conta com 650 alunos. Antes da enchente, eram 800. A maior defasagem está no turno da noite, com alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Dos 150, apenas 80 voltaram. A estrutura da instituição também está quase finalizada. Com móveis doados e uma biblioteca improvisada, o que se vê é uma escola restaurada pela comunidade. Além disso, conta com uma novidade: a empresa Soprano, de Caxias do Sul, na serra gaúcha, irá realizar uma ação durante o mês de maio para fazer reparos nas salas administrativas, que foram deixadas de lado no início para a reforma de espaços que contemplavam os alunos. A iniciativa irá entregar móveis novos e a pintura de salas.
— Com esse apoio, acredito que a escola vai voltar a ser o que era — diz, esperançoso, o diretor Adriano Figueiredo.
A retomada
A David Riegel Neto foi a primeira escola a reabrir em Eldorado do Sul após a enchente, no dia 18 de junho. À medida que a calamidade era contida, a escola ficou com novos ares. Foram realizadas limpezas das caixas d’água, higienização dos aparelhos de ar- condicionado e a troca da parte elétrica. Adriano destaca que as doações foram essenciais para o recomeço. Kits com materiais escolares foram montados para os alunos a partir de contribuições de outras cidades, incluindo de fora do Estado.
— Recebemos muito apoio de pessoas de fora. Inclusive uma escola do interior do Estado nos mandou material escolar para que pudéssemos doar para os alunos — destaca o diretor.
Julio Haag, 37 anos, é professor das turmas do 1° e 5° anos do Ensino Fundamental e foi um dos braços que reergueram a escola. Morador de Porto Alegre, ficou um mês fora de casa. Ainda assim, saía às 5h da Capital para chegar a Eldorado:
— Quando nós chegamos lá, ainda estava tudo muito molhado, muito úmido ainda. Muitos insetos, animais e cobras. E tudo destruído. Salas estavam reviradas, muita lama e armários caídos com muitos livros — relembra o professor.
Mesmo com o cenário caótico diante de seus olhos, a vontade de reconstruir um espaço que era tão importante prevaleceu.
— O nosso objetivo era colocar as crianças para dentro da escola. Tentar voltar e reabrir a escola da forma mais simples e segura possível — ressalta o professor.

Quando a água baixou
Para o diretor – e muitos gaúchos – a rotina na época da cheia era monitorar o nível do Guaíba. Adriano foi o primeiro que viu a escola quando conseguiu chegar no centro de Eldorado, no dia 18 de maio. A situação era drástica. A água atingiu 2 metros de altura no local. Morador de Porto Alegre, o diretor se deslocou da Capital para o município pelo corredor humanitário, construído para que veículos pudessem trazer doações e ajuda. Outros alagamentos já haviam atingido Eldorado, diz Adriano, mas foi a primeira vez que a água alcançou a escola:
— Praticamente tudo foi destruído. Tudo o que era de madeira, computadores, impressoras e tudo que envolve tecnologia.
A primeira movimentação de reconstrução da escola, uma semana depois da cheia, foi com apoio de professores voluntários que estavam em cidades vizinhas e que conseguiram se deslocar para ajudar.
Mas muitos profissionais tinham perdido suas próprias casas. É o caso da professora Andrea Machado, 53 anos, moradora da Ilha da Pintada. Ela perdeu tudo o que tinha dentro de sua casa, inclusive seu carro, mas a maior preocupação era com os animais que tinha:
— Eu e meu marido saímos de casa em cima de uma lancha e não consegui levar meus cachorros — diz.
Com auxílio de voluntários, os animais foram encontrados. E mesmo com a casa inundada, Andrea foi ajudar na escola. Hoje, após um ano, ainda tem medo dos dias de chuva e sente o aperto dos momentos tristes que viveu. Mas diz, com orgulho, que auxiliou o lugar onde trabalha há 35 anos.

"A gente conseguiu"
De acordo com o professor Julio, as crianças foram voltando aos poucos, pois as famílias tinham perdido tudo, até a casa. Uma busca ativa foi realizada para mapear os alunos e muitos estavam fora do município. Para a professora Franciele Ribeiro, 35 anos, que trabalha com duas turmas do 1° ano no turno integral, todo o esforço valia a pena para poder acolher os alunos:
— Na hora do sufoco, a gente pensou que nunca mais seria possível colocar o pé dentro de uma sala de aula. Foi uma coisa de equipe, de querer fazer alguma coisa pelo lugar em que tu passas a maior parte do teu tempo.
Ela também destaca a importância de ter voluntários no primeiro momento para começar a limpar os entulhos:
— Até hoje, a gente olha o pátio da escola e a gente não acredita. Só conseguimos pensar: “Olha, a gente conseguiu”. A gente reconstruiu a nossa segunda casa — diz Franciele, emocionada.
*Produção: Ana Júlia Santos