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Investigação 

Relator da CPI da Pousada Garoa conclui que tragédia foi causada por negligência do proprietário

Os 12 vereadores que compõem a comissão voltam a se reunir na quinta-feira para votar se concordam ou não com o documento elaborado por Marcos Felipi (Cidadania)

24/06/2025 - 10h04min

Atualizada em: 24/06/2025 - 10h04min


Vitor Rosa
Vitor Rosa
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Ronaldo Bernardi/Agencia RBS
Incêndio destruiu prédio da Pousada Garoa, na Avenida Farrapos, em Porto Alegre, em abril de 2024.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apurou o incêndio na Pousada Garoa, em Porto Alegre, concluiu que houve negligência grave no caso e sugeriu que o proprietário do local, André Kologeski, seja responsabilizado civil e criminalmente.

O incêndio, em abril de 2024, deixou 11 mortos e 15 feridos, entre eles pessoas em situação de rua que estavam abrigadas no local por meio de contrato com a prefeitura. A CPI foi instaurada pela Câmara de Vereadores para apurar as responsabilidades no caso. O relatório foi apresentado nesta segunda-feira (23).

De acordo com o vereador Marcos Felipi (Cidadania), “restou evidenciado ao longo dos trabalhos desta CPI que o proprietário da pousada tinha pleno conhecimento das condições estruturais inadequadas do imóvel, bem como da inexistência de medidas mínimas de segurança exigidas por lei”.

O relator da CPI afirma que não encontrou elementos suficientes para responsabilizar criminalmente agentes públicos, como o então presidente da Fasc, Cristiano Roratto, e a fiscal de serviço, Patrícia Mônaco. 

“Não se poderia exigir do gestor da pasta uma conduta preventiva em relação a fatos dos quais não tinha ciência”, apontou o relatório.

O documento recomenda o envio dos resultados ao Ministério Público e ao Poder Judiciário para que avaliem as descobertas feitas durante a CPI.  

“Recomendamos o imediato encaminhamento deste relatório e dos documentos colhidos (…) para que sejam adotadas as medidas legais cabíveis, com o enquadramento por aqueles que detêm expertise técnica nos termos da lei penal e assegurar justiça às vítimas e seus familiares”, conclui o texto.

Vitor Rosa/RBS TV
Marcos Felipi, relator da CPI da Pousada Garoa, e Pedro Ruas, presidente da Comissão.

O relator da comissão afirma que, mesmo após um incêndio anterior em outra unidade da rede em 2022, nenhuma providência efetiva foi adotada.

“É especialmente grave o fato de que o proprietário da Pousada Garoa recebeu orçamentos formais com detalhamento das melhorias que deveriam ser realizadas, como a manutenção e substituição de extintores, adequações elétricas e placas de sinalização. Mesmo em posse dessas informações e tendo condições e dever de agir, optou por ignorar as recomendações técnicas e seguir operando o estabelecimento em condições inseguras”, disse Felipi no relatório.

O vereador também destaca que teria ocorrido discriminação entre os hóspedes:

“Havia orientação para que os clientes encaminhados pela Fasc fossem direcionados aos piores quartos, uma vez que os mesmos já estavam acostumados com esse tipo de situação”, escreveu o relator.

Sobre a origem do incêndio, o relatório admite que ainda não há definição se foi um ato criminoso ou acidental, mas depoimentos sugerem que o fogo foi causado de forma proposital. Ele também reforça que “a ausência de um plano de prevenção contra incêndio, equipamentos vencidos, ausência de funcionários treinados e problemas estruturais contribuíram diretamente para o agravamento da tragédia”.

Próximos passos

Os 12 vereadores que compõem a CPI voltam a se reunir na quinta-feira (26) para votar se concordam ou não com as conclusões do relator. Uma das possibilidades é a apresentação de um "relatório paralelo", como é chamado quando há um voto divergente com a justificativa de um vereador.

O vereador Pedro Ruas, do PSol, presidente e responsável por propor a comissão, adiantou ao Jornal do Almoço, da RBSTV, que irá apresentar um outro relatório com a responsabilização de agentes públicos: 

— Havia alguém que garantia esse serviço. O chamado garantidor da lei era a prefeitura e seus agentes, que são responsáveis pela situação que as pessoas viviam lá. Então essa omissão penalmente relevante dessas pessoas tem que ter sim uma forma de punição.

Indiciamento na Polícia Civil

O incêndio foi investigado pela Polícia Civil, que indiciou Kologeski, Roratto e Patrícia Mônaco por incêndio culposo. O Ministério Público analisa o caso e definirá se oferecerá denúncia à Justiça. Caso seja aceita, eles passam a responder pelo incêndio.

Contraponto

O que diz a defesa de André Kologeski

A defesa de Kologeski rejeitou, em nota, a conclusão da CPI. Segundo os representantes, a fiscalização da pousada era constante e tinham conhecimento da prefeitura. Também nega irregularidades como extintores vencidos, alegando que essas acusações visariam forçar uma responsabilização criminal indevida.

"A defesa não reconhece a legitimidade dessa encenação circense travestida de CPI e exige a reabertura imediata do inquérito policial, para que a verdadeira cadeia de responsabilidades — inclusive do poder público — seja efetivamente apurada", afirma a nota (leia a íntegra abaixo).

Veja a nota na íntegra:

Nota do Jurídico à Imprensa — Pousada Garoa

A Defesa de André Kologeski denuncia a farsa político-eleitoral montada sob o nome de “CPI da Pousada Garoa”, conduzida pelo vereador Pedro Ruas, que explora a tragédia para fazer palanque eleitoral antecipado, instrumentalizando a dor das famílias para fins pessoais. A chamada CPI jamais buscou a verdade: atuou desde o início como um espetáculo articulado entre oposição e governo, com o único objetivo de blindar os agentes públicos e fabricar um bode expiatório isolado.

É absolutamente falsa a narrativa de ausência de fiscalização: as instalações eram fiscalizadas diariamente por agentes públicos da FASC, com pleno conhecimento da Prefeitura, que renovou contratos durante seis anos consecutivos. Também é mentira a acusação de extintores vencidos e supostas irregularidades estruturais — falácias criadas para tentar forçar, artificialmente, uma acusação de dolo eventual contra o proprietário, onde nunca houve dolo nem omissão. A Pousada Garoa, na realidade, cumpria uma função social de acolhimento, suprindo a ausência do próprio Estado no atendimento da população em situação de rua.

Enquanto tentam manipular versões para esconder a responsabilidade coletiva do sistema público, a imprensa independente — como demonstrado no trabalho do jornalista Jonas Campos — apresentou imagens do possível autor do incêndio fugindo da cena, escancarando as graves omissões na investigação criminal. A Defesa não reconhece a legitimidade dessa encenação circense travestida de CPI e exige a reabertura imediata do inquérito policial, para que a verdadeira cadeia de responsabilidades — inclusive do poder público — seja efetivamente apurada.

Assessoria Jurídica

Pousada Garoa

O que diz a defesa de Cristiano Roratto

O advogado Fabio Correa dos Santos enviou a seguinte nota:

O relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito, apresentado nesta data pelo Vereador Relator Marcos Felipi, retrata com precisão os fatos ocorridos no trágico incêndio da Pousada Garoa, alinhando-se de forma clara com a linha de defesa de Cristiano Roratto, ao apontar elementos que indicam a origem criminosa do sinistro.

A CPI foi contundente ao destacar o depoimento do morador mais antigo da pousada, que apresentou, com firmeza e riqueza de detalhes, o nome, a fotografia, o RG e o CPF do indivíduo que, segundo ele, iniciou o incêndio após acalorada discussão com outros residentes — incluindo uma das vítimas fatais. Tal informação foi ignorada no inquérito policial original.

O relatório se mostrou criterioso, técnico e corajoso ao confrontar diversas omissões da investigação conduzida pela Polícia Civil. Entre os pontos ignorados pelo inquérito, destacam-se: o boletim de ocorrência registrado por moradores antes do incêndio, vídeos e áudios captados no local, e os testemunhos de pessoas que estavam presentes no momento dos fatos, todos desconsiderados de forma injustificável.

O documento da CPI recomenda expressamente a reabertura do inquérito policial, com a realização de diligências urgentes para identificar o indivíduo que foi visto em fuga no momento exato do início do incêndio, conforme registrado em imagens e corroborado por testemunha ouvida sob sigilo, que confirmou sua identidade e o envolvimento direto após as discussões havidas no interior do prédio.

É hora de virar a chave: a verdade está emergindo, e não pode mais ser ignorada.

A reportagem também entrou em contato com os demais envolvidos e não obteve retorno até a mais recente atualização deste texto.

Relembre o caso

Uma unidade da Pousada Garoa na Avenida Farrapos foi atingida por um incêndio na madrugada de 26 de abril de 2024. O prédio fica entre as ruas Barros Cassal e Garibaldi, a poucos metros da estação rodoviária. O fogo começou por volta das 2h30min e se espalhou rapidamente pelos quartos da pousada.

Os bombeiros encontraram 10 vítimas. No dia 6 de maio, um homem que fora ferido no incêndio e estava hospitalizado faleceu, ampliando o total de mortos para 11.


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