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Bairro Arquipélago

Como está a Ilha do Pavão, que não terá posto de saúde reconstruído após redução do número de moradores

Enquanto parte da população deixou a região após a enchente, outros decidiram permanecer por vínculo comunitário ou necessidade

24/07/2025 - 10h36min


Zero Hora
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Jefferson Botega/Agencia RBS
Ana Cristina Trindade, 48, precisa de atendimentos médicos mensais e lamenta a falta da UBS na Ilha do Pavão.

Do outro lado da ponte móvel do Guaíba, saindo do centro Porto Alegre, a Ilha do Pavão é a porta de entrada do bairro Arquipélago. É lá que fica a única das 14 unidades básicas de saúde (UBS) destruídas pela enchente em Porto Alegre que não será reconstruída. A prefeitura justifica a decisão com base na redução do número de atendimentos após a saída de moradores da região.

Não há consenso sobre a quantidade exata de pessoas que permanecem na Ilha do Pavão. A Associação Comunitária Vitória estima que, antes da enchente, cerca de 360 pessoas vivessem no local. Agora, calcula que tenham sobrado 180. Já a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) trabalha com uma redução de 500 para cem moradores. Na ilha, restam casas abandonadas, algumas já ocupadas por moradores que tiveram as suas destruídas pela água.

Sentimento da comunidade

Segundo a associação, muitos moradores foram para abrigos oferecidos pelo programa Estadia Solidária, da prefeitura. Outros aguardam a concessão de um imóvel por meio do programa Compra Assistida, do governo federal. 

Para a líder da Associação Vitória, Cristina de Almeida Cardoso, a saída de pessoas da região e a preocupação com alagamentos mudou o sentimento da comunidade. 

Ficou bem triste, porque antes a gente se reunia aqui na frente, toda a galera. E as pessoas estão tristes. Há pouco, deu duas vezes cheia de novo: a água baixou, subiu, baixou, subiu. Está bem complicado — relata.

Sem a unidade básica de saúde, os atendimentos passaram a ser feitos quinzenalmente por uma equipe móvel da prefeitura, geralmente às terças-feiras à tarde.

Posto "faz falta", diz moradora

A alternativa para quem vive na Ilha do Pavão é buscar atendimento na Unidade de Saúde Navegantes, que fica a cerca de 15 minutos de ônibus ou pouco mais de meia hora a pé. A maioria dos moradores trabalha com reciclagem e relata dificuldade para pagar a passagem até o posto.

Moradores também afirmam que, mesmo quando conseguem chegar à US Navegantes, nem sempre são atendidos. Segundo eles, há casos de superlotação e de recusa no atendimento, sob a justificativa de que os moradores deveriam ser atendidos na própria ilha. A situação é considerada especialmente difícil para idosos, grávidas e pessoas com problemas que impedem a locomoção.

Procurada pela reportagem, a Secretaria Municipal de Saúde afirma, em nota: "A US Navegantes realiza os atendimentos normalmente para os moradores da Ilha do Pavão, que hoje já são, na prática, parte da população de referência".

Vínculos comunitários

Residente da Ilha do Pavão há mais de 10 anos, Ana Cristina Trindade, 48, aguarda há dois anos uma cirurgia para tratar uma hérnia na barriga e necessita acompanhamento mensal.

— O posto (da Ilha do Pavão) está fazendo muita falta mesmo. Estou pensando em me mudar, pela questão da saúde e da água também — desabafa.

Apesar das dificuldades, ainda há muitos moradores que dizem não querer sair da Ilha do Pavão. Entre os motivos, estão os vínculos comunitários e a possibilidade de criar animais e armazenar materiais recicláveis, algo que consideram mais difícil de fazer em outros locais — especialmente, em apartamentos, que são os imóveis mais frequentemente cedidos em auxílios governamentais.

O padre Rudimar Dal'Asta, que realiza trabalho comunitário nas ilhas, relata:

— O pessoal gosta de morar nas ilhas. Apesar das enchentes, é um lugar bom. Existe muito essa questão da solidariedade, das amizades, tem escola, tem as doações, tem uma convivência. 

Unidades ainda não foram reconstruídas

Das 14 unidades de saúde que ficaram fechadas após a enchente, nove ainda não tiveram as reformas concluídas e continuam operando de forma provisória:

  • Clínica da Família Diretor Pestana
  • Farrapos
  • Fradique Vizeu
  • Ilha da Pintada
  • Ilha dos Marinheiros
  • Mário Quintana
  • Nova Brasília
  • Sarandi
  • Vila Elizabeth

A UBS da Ilha dos Marinheiros, próxima da Ilha do Pavão, foi demolida após a enchente por danos estruturais. Na terça-feira (22), a prefeitura iniciou a montagem de uma estrutura provisória no local, que até então recebia atendimento por meio de uma unidade móvel. Não há previsão para a construção de uma estrutura definitiva. 

A unidade da Ilha da Pintada está em obras, que foram atrasadas por conta de alagamentos no último junho. A Secretaria Municipal de Saúde não informa previsão de conclusão da reconstrução da estrutura. 

*Produção: Fernanda Axelrud


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