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Última despedida

Luis Fernando Verissimo é sepultado em Porto Alegre

Em meio a aplausos, o corpo do escritor deixou o Salão Júlio de Castilhos da Assembleia Legislativa, onde estava sendo velado, e foi encaminhado ao cemitério São Miguel e Almas, em cerimônia restrita a familiares

31/08/2025 - 08h52min

Atualizada em: 31/08/2025 - 08h53min


Carlos Rollsing
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Camila Bengo
Camila Bengo
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Às 16h55min deste sábado (30), em meio a aplausos calorosos e olhares emocionados, o corpo do escritor Luis Fernando Verissimo deixou o Salão Júlio de Castilhos da Assembleia Legislativa do Estado, onde ele estava sendo velado desde o meio-dia. O ataúde seguiu para sepultamento no Cemitério São Miguel e Almas, em ato reservado a familiares e amigos próximos.

O velório esteve aberto a quem desejasse se despedir do escritor até seu encerramento. A informação inicial era de que uma cerimônia de despedida restrita a familiares seria realizada a partir das 16h45min, quando as portas seriam fechadas ao público externo. Contudo, o fim da cerimônia foi anunciado ao microfone às 16h55min, e o corpo do escritor foi cortejado pelo público até a saída da Assembleia Legislativa.

O esquife que guardava o célebre escritor, romancista e saxofonista permaneceu com o tampo fechado. Um buquê de rosas brancas repousava sobre o ataúde, junto de uma flâmula do Internacional, uma das paixões de Verissimo. O vermelho da bandeira era esmaecido, mas, para a alegria do imortal das letras e das palavras, ostentava os dizeres: "Campeão do Brasil".

O clima era de tranquilidade durante o velório, apesar da dor da despedida. Estiveram presentes familiares do escritor, como a esposa Lúcia Verissimo e os filhos Fernanda, Mariana e Pedro. Amigos e autoridades também comparecem, como o presidente da Assembleia Legislativa, Pepe Vargas (PT), que celebrou os personagens de Verissimo, a sua capacidade de captar de forma bem-humorada os aspectos da vida cotidiana e a contribuição para as artes. 

— Quando eu era prefeito de Caxias do Sul, ele foi patrono da feira do livro. Teve um debate e perguntaram quem era a musa inspiradora do Verissimo. Ele respondeu que, além da Lúcia, a musa inspiradora dele, como cronista, era o prazo de entrega — recordou Pepe.

O prefeito Sebastião Melo chegou às 12h30min. Verissimo é natural de Porto Alegre, nascido em 26 de setembro de 1936, filho do histórico escritor Erico Verissimo.

— A cidade se despede de um dos ícones da escrita, do jornalismo e das artes. Um legado enorme para a literatura do Brasil. Que descanse em paz — afirmou Melo.

Pedro Verissimo comentou a relação do seu pai com Porto Alegre e o carinho recebido nos dias que antecederam a partida. O escritor viveu por alguns anos nos Estados Unidos entre a infância e o início da vida adulta. Também residiu por um período no Rio de Janeiro, na década de 1960. A maior parte de seus 88 anos, contudo, foram desfrutados na capital gaúcha.

Ele tinha um amor especial por Porto Alegre. Tanto que nunca quis sair daqui, mesmo sendo um autor de alcance nacional. Sempre a base foi aqui. Uma relação muito forte com a cidade. E isso passou para a gente (família). Eu morei fora bastante tempo, mas voltei por compartilhar desse carinho. E isso retorna. O afeto nos últimos dias foi enorme. Uma onda de calor humano que não muda nada (sobre a morte), mas conforta, sem dúvida — comentou Pedro.

O ex-governador Tarso Genro celebrou a arte de Verissimo, mas também a cidadania e o posicionamento. A Velhinha de Taubaté, um dos personagens mais destacados do escritor, ironizava a ditadura militar. Não por acaso, foram à despedida uma miríade de políticos de esquerda.

— Ele é um dos cinco grandes intelectuais da história do Rio Grande do Sul. Uma capacidade extraordinária de se comunicar com o público. E teve a coragem cívica de se posicionar em todas as grandes questões que o país atravessou — saudou Tarso.

O ex-senador Pedro Simon chegou, em cadeira de rodas, por volta das 16h, permanecendo até o fim da cerimônia. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, que está em Porto Alegre para um ato do Grupo Hospitalar Conceição (GHC), também compareceu representando o chefe do Poder Executivo nacional, Luiz Inácio Lula da Silva.

Presidente de Honra da Associação Riograndense de Imprensa (ARI), Batista Filho, destacou o caráter cidadão de Verissimo e relembrou que, além de colorado, ele também nutria simpatia pelo Botafogo.

— Ele tinha um humor clássico e uma crítica profunda de extremo conteúdo social. Luis Fernando retratava o outro, as pessoas, exatamente como elas eram, pulsando verdade e trazendo uma forma de captar interiores. Por isso, ele foi impressionante no seu escrever, que era um combate permanente às desigualdades sociais. Ninguém fotografou o brasileiro de melhor forma que o Verissimo — declarou.

O governador Eduardo Leite, que decretou três dias de luto no Rio Grande do Sul, chegou à Assembleia Legislativa em torno das 14h30min e permaneceu na cerimônia por cerca de 15 minutos.

— A produção e a obra que ele tem, naturalmente, faz com que permaneça vivo — homenageou Leite.

O velório também foi marcado pela presença de artistas e personalidades da cultura gaúcha, como o músico Duca Leindecker, o ator Zé Vitor Castiel, a jornalista Katia Suman e os escritores Luís Augusto Fischer, Martha Medeiros, Sergio Faraco e Eduardo Bueno.

Jornalista com atuação em distintas redações do Brasil, Bueno salientou o privilégio de ter compartilhado com Verissimo a profissão e a amizade.

— Convivemos na casa dele e nas redações do Estadão e da Zero Hora. Eu fiz parte da articulação que, primeiro, o tirou da Veja, onde ele era mal pago, e o levou para o Estadão. Depois, fizemos uma transição dele de volta para a Zero Hora na década de 90 — declarou Bueno, em seu característico tom debochado.

Ele ainda comentou que, por ser gaúcho, cresceu lendo Erico Verissimo. Bueno comparou os estilos de escrita de pai e filho ao dizer que, para ler Erico, é preciso quase trajar o smoking, enquanto Luis Fernando oferece uma "leveza cotidiana iluminante". 

Bueno lembrou que a eloquência verbal não era a principal característica de Verissimo, que ganhou fama de falar pouco. Mas, diz Bueno, o escritor se manifestava de forma incisiva nas reticências e entrelinhas:

— Isso se repetiu nos nossos fabulosos embates desportivos. Eu sou um arauto do imortal Tricolor e ele era representante do outro time aquele (Inter). Eu falava. Ele escutava. E, quando eu tinha certeza que estava ganhando, ele dava um contra-ataque mortífero e acabava empatando o jogo.

Jornalistas e autoridades ligadas ao Grupo RBS também estiveram presentes, como a apresentadora Cristina Ranzolin, a diretora-executiva de jornalismo e esporte Marta Gleich, e o publisher e presidente do Conselho da RBS Nelson Sirotsky. 

Luis Fernando Verissimo foi colunista de Zero Hora durante décadas, o que foi lembrado por Sirotsky:

Luis Fernando Verissimo é alguém que ficará para a eternidade e que teve uma jornada memorável na nossa história. Através da sua obra, seus livros e suas crônicas, ele construiu um legado que é eterno.


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