Notícias



Luto na música

Morre Arlindo Cruz, ícone do samba, aos 66 anos

Saúde do artista estava fragilizada desde 2017, quando sofreu um AVC. Ele passou por diversas hospitalizações desde então

08/08/2025 - 23h47min

Atualizada em: 08/08/2025 - 23h48min


Zero Hora
Enviar E-mail
Estadão Conteúdo
Estadão Conteúdo
Washington Possato/Divulgação
Ao longo da carreira, Arlindo Cruz foi responsável por mais de 700 composições.

O mundo do samba perdeu nesta sexta-feira (8) um de seus maiores ídolos: Arlindo Cruz, aos 66 anos. Ele morreu no hospital Barra D'Or, na zona oeste do Rio de Janeiro. A informação foi confirmada em uma publicação da família no Instagram.

"Arlindo parte deixando um legado imenso para a cultura brasileira e um exemplo de força, humildade e paixão pela arte. Que sua música continue ecoando e inspirando as próximas gerações, como sempre foi seu desejo", diz a nota.

A saúde do artista estava fragilizada desde 2017, quando ele sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) que deixou sequelas e provocou a sua despedida dos palcos.

Carreira teve início nos anos 1970

Arlindo Domingos da Cruz Filho nasceu em 14 de setembro de 1958, no bairro Piedade, também no Rio de Janeiro. Ele era filho de Arlindão Cruz, músico amador que promovia diversas rodas de samba em casa, e de Aracy Marques da Cruz. 

A música sempre esteve presente na vida do cantor e compositor, que tornou-se referência no samba. A trajetória de Arlindo começou cedo. Aos sete anos, ele deu os seus primeiros dedilhados no cavaquinho, presente que ganhou do pai. Aos 12 anos, o futuro sambista já tirava músicas de ouvido e aprendia a tocar violão com o irmão mais velho, Acyr Marques.  

Dedicado à música, Arlindo frequentou por dois anos a Escola Flor de Méier, onde estudou teoria, solfejo e violão clássico. Em paralelo, já trabalhava como músico profissional e fazia rodas de samba com outros artistas, inclusive com Candeia, a quem considerava padrinho musical e com quem gravou os seus primeiros discos.

Aos 15 anos, foi estudar em Barbacena (MG), na escola preparatória de Cadetes do Ar. Porém, a música acabou falando mais alto e o artista ingressou no coral da instituição, ganhando festivais da região. Aos 17 anos, tocou na roda de samba promovida por Candeia (1935-1978), um dos mais importantes nomes da história do samba.

Após deixar a Aeronáutica, ele passou a frequentar a lendária roda de samba do Cacique de Ramos, no Rio de Janeiro. Ali, aperfeiçoou-se ao lado de nomes como Jorge Aragão, Beth Carvalho, Ubirany e Almir Guineto, além de se aproximar de Zeca Pagodinho e Sombrinha. No primeiro ano no Cacique, já teve 12 canções gravadas por outros intérpretes.

O encontro dos sambistas chamou a atenção da cantora Beth Carvalho (1946-2019), que passou não só a frequentar o Cacique, mas também a recolher composições para seu repertório. No disco De Pé no Chão, lançado em 1978, Beth levou a roda de samba do Cacique para dentro do estúdio para que eles reproduzissem o som que faziam no encontro.

Neste período, surgia o Fundo de Quintal e, em 1981, após a saída de Jorge Aragão, Arlindo foi convidado para assumir o posto. Foram 12 anos de colaboração antes de seguir carreira solo em 1993.

Com Sombrinha, um de seus parceiros mais constantes, Arlindo compôs sucessos como Alto Lá, também com autoria de Zeca Pagodinho, e O Show Tem que Continuar, com a adesão de Luiz Carlos da Vila.

Com Zeca Pagodinho, fez outros tantos clássicos do samba e do pagode, entre eles, Bagaço da Laranja, Dor de Amor e Camarão que Dorme a Onda Leva, esse último com a participação de Beto Sem Braço. Com Acyr Marques, assinou Casal Sem Vergonha.

As músicas de Arlindo foram gravadas por nomes como Beth Carvalho, Alcione, Elza Soares, Maíra Freitas, Almir Guineto, Diogo Nogueira, entre outros intérpretes.

Em 2007, a cantora Maria Rita incluiu seis canções de Arlindo Cruz no álbum Samba Meu, o primeiro que dedicou inteiramente ao samba. Três delas se tornaram grandes sucessos, Tá Perdoado, Num Corpo Só e O Que é o Amor?. Maria Rita ainda gravou de Arlindo músicas como É Corpo, É Alma, É Religião e Saudade Louca.

A competência de Arlindo ainda se estendeu para o Carnaval, escrevendo sambas-enredo e embalando o desfile de agremiações como Grande Rio, Vila Isabel e Império Serrano – esta última homenageou o sambista no desfile de 2023, colocando-o em destaque em um de seus carros alegóricos.

Ao longo da carreira, o sambista gravou discos com regularidade. Em 2009, lançou dois volumes do MTV Ao Vivo. Recebeu cinco indicações ao Grammy Latino.

Ao longo da carreira, Arlindo também foi indicado cinco vezes ao Grammy Latino. Ele ainda ganhou o 26º Prêmio da Música Brasileira na categoria melhor músico de samba, em 2015.

Seu último álbum foi gravado ao lado do filho, Arlindinho, que seguiu a carreira do pai. Em 2017, pouco antes de Arlindo sofrer o AVC, eles lançaram juntos o álbum Dois Arlindos, no qual interpretaram músicas como Bom Aprendiz, Nega Samambaia e Pais e Filhos.

Arlindo ficou muito popular também por conta da televisão, ao participar, entre os anos de 2011 e 2017, do programa Esquenta, da TV Globo, apresentado por Regina Casé.

Em junho de 2025, a biografia do cantor, O Sambista Perfeito - Arlindo Cruz (Editora Malê), foi lançada durante a Bienal do Livro do Rio de Janeiro. O livro foi escrito por Marcos Salles. Segundo levantamento realizado pelo autor, Arlindo escreveu mais de 700 músicas.

Na época do lançamento, Babi Cruz comemorou nas redes sociais: "Tive muito medo desse livro não ficar pronto com ele aqui pertinho e é muito emocionante entregar esse livro nesse momento que ele está se recuperando de mais um problema de saúde. Só Deus sabe o tamanho dessa importância".

Estado de saúde

Arlindo vivia com sequelas de um Acidente Vasculhar Cerebral (AVC) sofrido em março de 2017. O quadro teve uma piora em julho de 2023, quando foi divulgado que o músico estava internado no Centro de Tratamento Intensivo da Casa de Saúde São José, no bairro Humaitá, no Rio de Janeiro, para tratar de uma pneumonia. Nesse mesmo ano, ele teve caxumba bacteriana e ficou quase um mês sob cuidados médicos em um hospital.

Em 2024, Arlindo precisou voltar ao hospital para tratar infecções do trato respiratório e urinário. Em julho desse mesmo ano, ele foi submetido a quatro extrações dentárias em ambiente hospitalar.

Em abril de 2025, o cantor precisou ser novamente internado para tratar de uma pneumonia. Na época, a equipe médica que cuidava de Arlindo afirmou em uma nota que "Devido à sua condição de saúde já delicada, o caso inspira cuidados redobrados". Ele teve alta em 18 de junho, depois de quase 50 dias internado.

Dias após a alta, Arlindo teve que retornar ao hospital pois seu estado de saúde voltou a se agravar. De acordo com sua mulher, Babi Cruz, o cantor lutava contra um bactéria resistente. 

— Foram mais de 30 pneumonias, então, a gente acredita que ele vai reverter mais essa, sem dúvida — declarou ela, à época. 

Apesar do otimismo, Babi afirmou que o sambista não respondia mais a estímulos.

AVC tirou o cantor de cena

Arlindo sofreu um AVC enquanto tomava banho em casa. O sambista ficou internado no hospital durante 15 meses, grande parte desse período na UTI. Durante a recuperação, ele passou por 14 cirurgias –sendo cinco delas na cabeça –, além de uma embolia pulmonar.

Ao voltar para casa, Arlindo enfrentou as sequelas do AVC que lhe tirou os movimentos do corpo e a fala. A nova rotina do compositor, que incluía sessões de fisioterapia e de fonoaudiologia, foi compartilhada pela Babi nas redes sociais, e pelos filhos, Arlindinho e Flora. Em entrevistas, Babi dizia que Arlindo queria viver.

No Carnaval de 2023, Arlindo foi enredo da escola de samba Império Serrano, no Rio de Janeiro. O sambista, com o apoio da família e a liberação dos médicos, desfilou no último carro da escola, sentado, ao lado da mulher, filhos e amigos, entre eles, Regina Casé, Marcelo D2 e Péricles. Apesar da popularidade de Arlindo e da sua ligação com a escola, a Império Serrano não fez um bom desfile e foi rebaixada para o grupo de acesso.

Logo após o Carnaval daquele ano, Babi anunciou que estava namorando André Caetano, que foi coordenador de sua campanha na disputa para uma vaga na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) – Babi não conseguiu se eleger.

O anúncio gerou debate nas redes sociais, já que Babi ainda era casada com Arlindo. Na época, ela se pronunciou por meio de uma nota publicada em seu perfil no Instagram.

"Nada do que aconteceu ou acontecerá na minha vida me impedirá de cuidar com todo amor e carinho da saúde do Arlindo, assim como eu sempre fiz", escreveu Babi na época.

Com Babi, Arlindo teve dois filhos, Arlindo Neto e Flora. Em um relacionamento extraconjugal, o sambista se tornou pai de Kauan Felipe.


MAIS SOBRE

Últimas Notícias