Notícias



Atividades de extensão 

Do quilombo para a universidade: projeto da Unisinos aproxima alunos de comunidades quilombolas

Iniciativas de impacto social contribuem com a formação dos estudantes, conforme docentes que integram o Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (Neabi) 

24/11/2025 - 14h39min


Sofia Lungui
Sofia Lungui
Enviar E-mail
André Ávila/Agencia RBS
Atividade alusiva ao mês da Consciência Negra, no campus da Unisinos em São Leopoldo, contou com diversas atividades religiosas e culturais.

Participar de ações de impacto social é fundamental para a formação no Ensino Superior – as atividades do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (Neabi) da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) são evidência disso. Conforme os docentes que participam do grupo, os alunos aprendem muito se engajando em práticas que contribuem para o bem-estar das pessoas, para além das tradicionais atividades em sala de aula. 

Além de pesquisa e ensino, as universidades desenvolvem projetos de extensão, que promovem a troca de saberes entre o universo acadêmico e a comunidade e garantem a formação integral dos estudantes. Um deles é o projeto Sementes de Identidade, que busca aproximar comunidades quilombolas da universidade

Conduzida pela Unisinos há três anos, a iniciativa ocorre no campus de Porto Alegre, que recebe crianças dos quilombos Kédi e Silva semanalmente para oficinas gratuitas. Também ocorrem atividades nos próprios quilombos, esporadicamente. Junto aos professores, os estudantes de graduação dão aulas de educação digital, por exemplo, e desenvolvem atividades culturais. 

André Ávila/Agencia RBS
O professor Jorge Luiz Teixeira é coordenador do Neabi da Unisinos e do curso de Educação Física da Unisinos.

— Diante de denúncias de racismo dentro da universidade, nós quisemos criar um projeto para melhorar nossas relações étnico-raciais. Temos dois quilombos próximos à universidade. Começamos a ouvir e acolher essas comunidades, entender suas necessidades. Assim, começamos a ofertar cursos e ações com as crianças, para que elas também sintam que esse território é permitido a elas — explica o professor Jorge Luiz Teixeira, coordenador do Neabi da Unisinos e do curso de Educação Física. 

Ele foi um dos idealizadores do projeto Sementes de Identidade. O grupo já promoveu atividades como curso de gastronomia, informática, esportes, e até brincadeiras e eventos. No Natal do ano passado, por exemplo, as crianças receberam a visita de um Papai Noel preto, contribuindo com sua construção identitária. No último domingo (16), participaram de um jogo de futebol antirracista na Escola de Futebol do Grêmio. 

— Comecei a participar [do projeto] ano passado, estou no 6º ano. Aprendi sobre os negros, informática, a mexer no computador. Aprendi a criar avatar e a colar as coisas no computador — conta Anderson, 12 anos, aluno da Escola Estadual De Ensino Fundamental Bahia.

A instituição de ensino é parceira da Unisinos no projeto, levando alunos à universidade duas vezes por semana para participarem das atividades. 

— As crianças, principalmente de escola estadual, elas não são preparadas para entrar numa universidade, muitos não almejam isso. Eles são preparados para trabalhar. É terminar o Ensino Fundamental, fazer um estágio, pegar um emprego, mas eles não têm a visão de ingressar no Ensino Superior. Então, é excelente que eles possam se enxergar na universidade, que vejam que podem dar passos mais largos e entrar para dentro de uma universidade — destaca a professora Lissandra Cardoso, da escola Bahia

Em evento na quarta-feira (18), parte da programação especial da Unisinos no mês de novembro, a professora Lissandra declamou um poema de Oliveira Silveira, poeta gaúcho que foi um dos principais articuladores da adoção do 20 de novembro como o Dia Nacional da Consciência Negra

Um grupo de alunos da escola também brilhou no evento no campus de São Leopoldo, cantando “Maria, Maria”, canção de Milton Nascimento. O encontro também contou com debate acadêmico e performances artísticas. 

Impacto na formação 

Para a egressa Luana Gonçalves Ferreira, que se formou no curso de Serviço Social em 2025, participar das atividades do Neabi ao longo da formação foi muito importante. Mesmo depois de formada, ela segue atuando como voluntária no grupo. 

— O projeto me fez perceber que, de fato, é possível mudar a realidade dessas crianças e das pessoas que estão inseridas nessas comunidades. O serviço social luta pelos direitos, pela igualdade, pela equidade, e a importância dele se dá no momento que a atuação e a formação acadêmica começam a caminhar junto a essas crianças, a essas comunidades — destaca Luana. 

André Ávila/Agencia RBS
A egressa Luana Gonçalves destaca que o projeto traz benefícios para os dois lados, porque contribui com a representatividade e o reconhecimento cultural das crianças quilombolas.

Ela acredita que o projeto traz benefícios para os dois lados, porque contribui com a representatividade e o reconhecimento cultural das crianças quilombolas, mas também para que os estudantes de graduação tenham contato com outra realidade. A professora Johanna Coelho, da Escola de Saúde da Unisinos, integra o Neabi e pensa o mesmo. 

— A gente procura romper com essa perspectiva de pesquisa mais branca e eurocentrada, por exemplo. Trazer as pessoas negras que a gente pesquisa como autores dos trabalhos, e não só citar ou falar deles, trazer caciques indígenas como autores dos artigos que a gente publica. Também trabalhamos com as comunidades indígenas, tanto de Porto Alegre quanto a comunidade Caingangue de São Leopoldo — explica Johanna. 

Gisele Lima, que também integra o núcleo, ressalta que projetos assim contribuem para uma formação humanizada, independentemente da área. 

— Estar junto dessas comunidades traz para eles uma outra realidade. Essas atividades buscam trazer impacto na vida dessas pessoas através do nosso trabalho, dos trabalhos de alunos de graduação. Nesse sentido, a gente consegue garantir uma formação mais humana, para além da sala de aula, para além da teoria — afirma. 

Últimas Notícias