Zona Sul
Mureta erguida na orla de Ipanema, em Porto Alegre, divide opiniões de moradores e frequentadores
Construção faz parte da reforma do calçadão, que foi danificado pela enchente de 2024. Trabalhos no local só devem ser concluídos em janeiro de 2026


Uma nova estrutura divide a faixa de areia e o calçadão da orla de Ipanema, na zona sul de Porto Alegre. Um pequeno muro, ou uma mureta, de 45cm, está sendo construído ao longo dos dois quilômetros de extensão da orla e sua funcionalidade tem sido questionada por quem caminha pelo local.
— Não serve para nada, né? É um banco. Se isso fosse uma proteção (contra enchente) teria que estar virado para o outro lado. Isso aí não vai gerar proteção nenhuma. (A mureta) já foi construída e reconstruída várias vezes. É muito frágil. Toda a construção (da orla) é frágil — comenta Anna Maria Braz Grigol, 54 anos, que mora desde a infância na região.
A mureta faz parte do projeto elaborado pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade de Porto Alegre (Smamus) para reconstrução da orla de Ipanema após a destruição causada pela enchente de maio de 2024. Ela não é, no entanto, uma estrutura de proteção contra cheias.
— Na verdade é uma contenção para o calçadão, não é sistema de proteção. O que a gente tem ali é uma contenção, é uma cortina de concreto com função de quebra-onda, para evitar danos à estrutura que vem depois, e que também serve como um banco — explica Alex Souza, diretor de Áreas Verdes da Smamus.
Entre os frequentadores da orla ouvidos pela reportagem no local, na quinta-feira (6), o servidor público, Ernani Kern, 55, era um dos poucos que realmente sabia a utilidade da estrutura:
— No início eu achei que era para proteger de inundação, mas depois fiquei sabendo que era para proteger o calçamento só aqui, que várias vezes quebrava tudo. Tudo bem. Mas eu acho que faltou planejamento. As áreas de acesso para o Guaíba ficaram ruins.
Antes da enchente de 2024, a orla possuía uma contenção feita com pedra grês assentada em argamassa, uma estrutura que com o impacto da água acabava sofrendo muitos danos. À medida que o Guaíba avançava, causava estragos à barreira e ao calçadão como um todo.
— Quando essa parte que segura o calçadão sofre dano, a calçada também se perde e vai embora. Com o advento da enchente, vimos a necessidade de ter uma estrutura mais robusta, mais resiliente, mais adaptada — detalha Souza.
Com a nova mureta, a ideia é que a demanda por manutenção do calçadão seja menor e que ele sofra menos impacto nos períodos de cheia.

— Todos os dias eu caminho aqui. Está muito bom, muito bonito. Assim a água também não passa e protege um pouco. Porque com a água ninguém pode, né? — avalia Lisiane Almeida, 55, que trabalha como cuidadora.
Acesso ao Guaíba
Ao longo dos dois quilômetros de mureta estão espalhados sete pontos de acesso à faixa de areia ou ao Guaíba. São rampas, escadas e até mesmo aberturas mais largas para a passagem dos caminhões que auxiliam na manutenção da área, como na retirada de troncos e galhos da água.
— Essas rampas eu achei que ficou muito bom, só achei que ficaram muito espaçadas umas das outras — comentou a vendedora Rafaela da Silva, 22.
Já a mestranda Júlia Geyer, 25, ficou confusa com algumas aberturas, já que elas permitem que a água passe:
— Eu não sei muito bem, o plano inicial acho que era para contenção da água né, mas eu não sei, tem umas partes que vão ficar abertas. Eu não sei dizer se vai funcionar, a gente vai ter que esperar pra ver.

Apesar da incerteza sobre a funcionalidade, Júlia elogiou os cuidados da obra com a acessibilidade. Apontou o uso dos pisos táteis, que auxiliam as pessoas com baixa visão, e as rampas de acesso, que permitem que quem tem alguma restrição de locomoção consiga ir até o Guaíba.
Conclusão da obra
Inicialmente prevista para julho e depois para dezembro de 2025, a reforma da orla só deve ser totalmente concluída em janeiro de 2026. A demora também foi criticada por frequentadores.
— Eu achei meio demorado, né. Eles, inclusive, fizeram e desmontaram uma parte, tiveram que refazer. Eu acho que precisava ser mais organizado — aponta a mestranda Júlia.

O diretor da Smamus explica que os atrasos se devem à cheia do Guaíba no mês de junho.
— A nossa ideia é que até a semana de Natal e Ano-Novo a gente esteja com 95% concluído. A estrutura da calçada, do calçadão, mobiliário, que é banco, lixeira, bicicletário, vai estar tudo já pronto, vai estar instalado e as pessoas hoje já estão usando o espaço, já estão transitando, o calçadão já está livre para quem circula — diz Alex Souza.
Os 5% que ficarão para o próximo ano se referem a parte do enrocamento de pedra, que também é uma contenção para proteger a estrutura do calçadão, e a conclusão da reforma dos banheiros que ficam próximos aos Arcos de Ipanema.
O investimento na obra é de R$ 11 milhões, contando com recurso de contrapartida da construtora Multiplan, que está erguendo um empreendimento na Zona Sul.
Proteção contra enchente
O sistema de proteção contra cheias na zona sul de Porto Alegre é uma responsabilidade do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae). Para trazer mais segurança a moradores e comerciantes, estudos seguem sendo desenvolvidos pela empresa Rhama Analysis. O investimento é de R$ 5,8 milhões.
O projeto de atualização do sistema contra cheias foi assinado em 15 de outubro de 2024 e sua entrega é esperada para o primeiro semestre de 2026. Conforme o Dmae, o contrato prevê um projeto para a atualização do sistema existente, entre os bairros Sarandi e Cristal, e uma definição de viabilidade de ampliação da proteção ao sul, abrangendo o trecho de 50 quilômetros entre a avenida Diário de Notícias e o limite com Viamão.