Mini documentário
Horizonte descoberto: demolição do Esqueletão revela uma nova vista aos vizinhos
A imagem do centro de Porto Alegre mudou, mas não foi só. Para o prédio vizinho, a Galeria do Rosário, surgiu uma nova paisagem: a vista desobstruída para o pôr do sol no Guaíba
A demolição dos 19 andares do prédio que os porto-alegrenses se acostumaram a chamar de Esqueletão mudou a paisagem — e um pouco também o humor — do centro da capital gaúcha. Por décadas, aquelas paredes sujas e sem reboco destoaram do entorno histórico: o Mercado Público, o Chalé da Praça XV, o Largo Glênio Peres. Era um contraste diário entre o inacabado e o simbólico, a alvenaria crua diante dos cartões-postais.
Mas não foi só a imagem da região que mudou. Do prédio vizinho, a Galeria do Rosário, surgiu uma nova paisagem: a vista desobstruída para o pôr do sol no Guaíba — aquele que, no ufanismo gaúcho, é “o mais bonito do mundo”.
É essa transformação que o vídeo acima registra, fruto de um trabalho que começou em abril de 2023, quando foi anunciada a demolição do prédio. Na época, a equipe de fotografia de GZH se preparava para cobrir uma possível implosão, buscando pontos altos da cidade para registrar o momento. Mas a implosão nunca veio: o destino seria decidido na marretada. A demolição manual, iniciada em 2024, foi concluída um ano depois.
Mesmo sem o espetáculo da explosão, a história seguiu. O acompanhamento virou rotina e se transformou em um mini documentário sobre o fim de um vizinho e o renascimento de uma vista.
Entrei lá pela primeira vez quando 17 andares ainda estavam de pé. Queria fotografar o topo, mas percebi que a grande curiosidade estava ao lado: os vizinhos que ganhariam o horizonte.
— Agora, além do barulho da obra, que acabou, tem a vista. Melhorou, né? Consigo ver até a Arena do Grêmio — diz o alfaiate Osiris Miranda, há 40 anos na Galeria do Rosário, que trabalhou à sombra do Esqueletão e agora tem uma janela por onde entra luz e cores da cidade.

Três andares acima, no 18º, o protético Marcos Dias compartilha o mesmo alívio.
— Era um vizinho quietão, mas tinha vida própria — lembra, sobre o prédio que abrigava urubus e pequenas árvores nas janelas quebradas. E emenda: — A gente cansa a vista o dia inteiro (com o trabalho). Poder olhar pra fora agora é um presente.

O Esqueletão, oficialmente Edifício Galeria XV de Novembro, começou a ser construído nos anos 1950. Teve lojas comerciais nos dois primeiros andares, interdições por ocupações irregulares nos anos 1980 e 1990 e uma interdição definitiva em 2019. Quatro anos depois, veio a decisão final. Seria demolido sem nunca ter sido concluído.