Com o verão chegando...
Quedas de energia podem queimar aparelhos? Como se proteger e quando há direito a ressarcimento
Instabilidades na rede elétrica podem provocar prejuízo; veja os riscos e o passo a passo para buscar indenização


Rosa Maria Rodrigues, moradora de Capão de Canoa, viu parte de seus eletrodomésticos pararem de funcionar após uma queda de energia durante uma troca de postes na rua. A luz voltou com instabilidade, mas a geladeira, o micro-ondas, o aspirador, as duas televisões e a máquina de lavar queimaram.
Com a chegada das altas temperaturas e das tempestades de verão, por consequência, a rede elétrica opera sob maior carga, tornando estes casos mais frequentes nesta época do ano.
Diante do possível prejuízo, surge a dúvida: o que exatamente causa a queima de um aparelho? Como reduzir riscos? E quando a concessionária é obrigada a indenizar?
Para responder a essas perguntas, Zero Hora ouviu um especialista em engenharia elétrica e consultou o Procon, com objetivo de ajudar os consumidores sobre o que fazer nessas situações. Veja a seguir.
O que acontece na rede quando a energia volta?
A queda de energia é raramente o problema da queima de aparelhos. O risco, na verdade, surge no retorno, quando a tensão pode voltar desequilibrada e atingir diretamente os aparelhos ainda ligados.
Segundo o eletrotécnico Tiago Silveira, dois fatores explicam a maioria das queimas de eletrodomésticos. O primeiro é o mau contato interno: tomadas gastas, emendas improvisadas e quadros antigos criam pequenos arcos elétricos, que geram aquecimento e variações de tensão dentro da própria residência.
O segundo é externo: o rompimento do neutro da rede, que provoca o chamado retorno em meia fase.
— Quando o neutro falha, uma fase pode subir para perto de 380 volts e outra cair para algo como 60. Para o consumidor, tudo parece normal. Para o aparelho, é suficiente para destruir a placa — explica Silveira.
Quais aparelhos têm maior risco de queimar
Placas eletrônicas são as primeiras a sofrer. Isso porque televisores, computadores, micro-ondas, videogames e aspiradores robôs operam em tensões internas muito baixas e não toleram picos repentinos, como aparenta ser o caso dos itens de Rose que, segundo o laudo, receberam uma tensão acima do suportado pelos aparelhos, ocasionando a perda total.
Equipamentos com motor, como geladeiras, freezers e máquinas de lavar, apresentam outro tipo de fragilidade. Quando a energia retorna mais fraca do que o necessário, o motor tenta iniciar o ciclo sem força suficiente, superaquece e pode travar.

Além disso, o verão combina outros fatores que pressionam a rede elétrica: calor extremo, maior uso de ar-condicionado, temporais e quedas de árvores. Parte das estruturas ainda utiliza cabos aéreos antigos, mais sensíveis à corrosão e ao impacto de ventos fortes.
Raios também provocam surtos que percorrem rapidamente longos trechos da rede. Quando o sistema já está sobrecarregado, a chance de um retorno instável aumenta.
Como o consumidor pode reduzir os danos?
Segundo Silveira, a recomendação mais eficaz é simples: desligar tudo da tomada quando a energia cair. Religá-los somente após alguns minutos de estabilidade reduz significativamente o risco de dano.
Evitar improvisos, como adaptadores do tipo "T", extensões finas e transformadores usados diariamente, também ajuda. Esses dispositivos são pontos comuns de aquecimento e oscilação.

Outro aspecto é a adequação da instalação residencial. Disjuntores compatíveis, DR e DPS Classe II e III no quadro elétrico funcionam como barreiras para picos de tensão.
Seguir a NBR 5410, norma brasileira de instalações elétricas, também é importante, já que casos de ressarcimento podem ser negados se a residência estiver fora dos padrões mínimos de segurança.
Por fim, geladeiras e freezers exigem atenção, pois, como não é possível desligá-los devido à conservação de alimentos ou medicamentos, o especialista recomenda monitoramento contínuo ou uso de nobreaks específicos.
O que fazer quando o aparelho já queimou?
Em caso de itens danificados por quedas de energia, o primeiro passo é registrar o ocorrido nos canais oficiais da concessionária. Protocolar o evento o mais rápido possível ajuda a vincular o dano à oscilação.
Em seguida, é importante reunir informações e provas do ocorrido: data e horário aproximado da falha, descrição do dano, fotos e vídeos dos aparelhos e laudo técnico.
A CEEE Equatorial recebe pedidos de danos elétricos pela plataforma online. A solicitação ainda pode ser feita pela Agência Virtual, pela central telefônica, por atendimento digital ou ainda de forma presencial.
Para danos não elétricos, como perdas decorrentes de acidentes com postes, o contato é feito pelo telefone 0800 721 2333. A empresa informará se haverá vistoria, recolhimento do aparelho ou necessidade de laudo adicional.
Já para clientes da Rio Grande Energia (RGE), é necessário procurar os canais de atendimento da empresa (site, telefone ou presencial), informar a unidade consumidora, dados, data e horário da queima do equipamento. Por fim, deve-se estar presente no local no momento da vistoria, que pode ocorrer em até dez dias.
Procon pode ser acionado
No caso de Rose, para abrir o pedido de ressarcimento, a família precisou pagar R$ 300 pelo primeiro laudo, exigido antes da análise da concessionária. Sem poder consertar os aparelhos antes da perícia, os moradores passaram a depender de eletrodomésticos emprestados e ainda aguardam a resposta para solucionar o problema.
O diretor do Procon Porto Alegre, Wambert Di Lorenzo, reforça que a Resolução 1.000/2021 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) estabelece que a concessionária deve reparar, substituir ou indenizar quando houver falhas no serviço.
— Oscilações, retornos abruptos e episódios de meia fase caracterizam responsabilidade da distribuidora. A orientação é registrar, guardar protocolos e reunir o máximo de evidências — afirma.
Se a concessionária negar o pedido, o Procon pode acolher a reclamação, abrir processo administrativo e atuar na mediação. Persistindo o impasse, o consumidor pode recorrer ao Judiciário.
A concessionária tem prazo de 10 dias para vistoriar o equipamento e 15 dias para apresentar resposta. Se o pedido for aceito, o reparo, a substituição ou a indenização devem ocorrer em até 20 dias corridos.
Vale ressaltar, porém, que o aparelho não deve ser consertado antes da vistoria, já que isso pode levar à negativa imediata do pedido.