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"Vamos comprar mais uvas": as escolhas dos consumidores para driblar preços altos e garantir a ceia de Natal

Valor pago por itens comuns na celebração ficou estável, na média, mas carnes e oleaginosas tiveram altas, enquanto batata e arroz ficaram mais baratos

15/12/2025 - 10h50min


Mathias Boni
Mathias Boni
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Todos os anos, a porto-alegrense Luciana Oliveira, 47 anos, segue o mesmo ritual: logo após os primeiros dias de dezembro, começa a peregrinação a diferentes pontos de compra da cidade, em busca dos itens que formarão sua ceia de Natal. Nesta rotina, Luciana percebe e busca driblar as variações nos preços dos ingredientes.

Conforme levantamento realizado em Porto Alegre pelo Núcleo de Pesquisa Econômica Aplicada do Instituto de Estudos e Pesquisas Econômicas (Iepe) da UFRGS com produtos comuns na ceia, a variação média do preço do conjunto de produtos em 2025, em relação ao ano passado, cresceu 0,20%. Embora na média tenha havido certa estabilidade, do grupo de 42 itens pesquisados, 20 apresentaram elevação nos preços, com altas que vão de 3,52% a 40,70%.

— Nos últimos anos a ceia tem ficado cada vez mais cara. Lá em casa, já trocamos o peru pelo chester, e nesse ano talvez a gente escolha alguma ave ainda mais barata. Nozes, castanhas e frutas cristalizadas, que a gente gosta, também estão com preços bem altos — queixa-se Luciana, que na sexta-feira (12) fazia compras no Mercado Público de Porto Alegre.

Os preços das carnes típicas do período subiram, em comparação com o ano passado, mostrou a pesquisa do Iepe. O peru, um dos itens mais consumidos nas ceias, teve elevação média de 7,20%. Bacalhau (4,66%), chester (7,09%), pernil (8,99%), tender (16,26%) e lombo de porco (17,93%) também registraram crescimento nos preços.

Já as oleaginosas, de forma geral, estão entre os itens que apresentaram maior elevação de preço neste ano em relação a 2024 na Capital. O produto que registrou maior crescimento foi a castanha-do-pará, com 40,70%, seguida pelas nozes, com 31,63%.

— As oleaginosas, como a castanha-do-pará, foram muito impactadas neste ano pela questão climática, já que secas no norte do país causaram a maior quebra de safra na produção dos últimos 20 anos. Como alternativa, é possível olhar para produtos que tiveram queda nos preços, como a ameixa seca (-9,01%) ou mesmo a azeitona (-8,14%) — aponta o economista Raphael Castro Martins, um dos membros da equipe do Iepe que realiza o estudo.

Estabilização em "patamar elevado" 

A pouca variação média de preços entre o fim de 2024 e este ano não significa que o consumidor não esteja encontrando dificuldades para comprar os itens da ceia. A estabilidade deste ano é precedida de seguidas elevações substanciais.

A média de preço dos itens, segundo a mesma pesquisa do Iepe, teve, em 2024, o crescimento em relação ao ano anterior de 6,56%. Em 2023, foi de 10,75%, em 2022, 16,85%, e em 2021, 13,74%.

— O comportamento do preço dos alimentos no domicílio foi muito positivo neste ano, inclusive foi o que mais ajudou a inflação nacional a ficar no intervalo da meta. Mas este é um fenômeno de 2025, já que nos últimos anos, principalmente desde a pandemia, o crescimento tem sido constante. Segundo os dados do IBGE, de janeiro de 2020 a novembro de 2025, a inflação dos alimentos a domicílio subiu 57%, enquanto a média do IPCA foi de 38%. A estabilização dos preços médios ocorreu neste ano, mas em um patamar que já estava elevado — explica o economista André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre).

Essa estabilização em patamar elevado é sentida pelos consumidores da Capital. Andréa Barcellos, 46 anos, moradora da Lomba do Pinheiro, vai trocar alguns itens da ceia deste ano que estão com preços mais altos.

— Os preços sobem mas o nosso salário não sobe junto. Nesse ano, algumas frutas que compramos para compor a ceia, como cereja e romã, estão muito mais caras do que ano passado, então vamos comprar mais uvas — ressalta Andréa.

Bruno Todeschini/Agencia RBS
Andréa Barcellos, 46 anos, já está fazendo compras para a ceia.

Os preços da cereja e da romã de fato subiram neste ano, com crescimentos respectivos de 22,01% e 12,81%. Já a uva registrou baixa, com 5,86% de queda no preço médio.

— Quando você fala com o consumidor, ele sente os preços pressionados, sim, por causa dessa sequência de crescimento inflacionário dos últimos anos. Se a inflação dos alimentos no domicílio subiu 57% e o IPCA 38% desde janeiro de 2020, e se o salário é corrigido com base no IPCA, há uma diferença de 19 pontos percentuais no período — reforça o economista André Braz. 

Ingredientes mais baratos

Vinte e dois itens pesquisados pelo Iepe apresentaram queda no valor em 2025. Alguns destes são partes fundamentais na maioria das ceias de Natal.

A batata foi o produto que registrou a maior queda percentual em todo o estudo, com 35%. Na sequência, está o arroz, com 30,11%.

Fios de ovos (24,61%), cebola (20%) e lentilha (12,96%) também registraram quedas importantes em 2025. Entre as sobremesas, o panetone de frutas (3,53%), o chocotone (7,53%) e o sorvete (6,62%) também apresentaram diminuição no preço neste ano.

— O jeito vai ser caprichar na salada de maionese e antecipar a lentilha, então. O resto que aumentou o preço, a gente reclama, mas acaba comprando igual. Natal é Natal, é só uma vez no ano — afirma Janilton Rodrigues, 62 anos.

Bruno Todeschini/Agencia RBS
Janilton acaba comprando mesmo alguns itens mais caros, para manter a tradição.


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