Celebrações
No centenário, disco, peça e homenagem para Gildo de Freitas
A partir desta quarta (19), em Viamão, evento celebra a obra do Trovador. Um dos destaques é uma montagem teatral, que passa em revista a obra do artista.
Viamão, a cidade que Gildo de Freitas (1919 — 1982) escolheu para morar durante boa parte de sua vida, sedia, a partir de quarta-feira (19), dia em que ele comemoraria um século de vida, uma intensa programação, de graça, para celebrar os cem anos de nascimento do Rei dos Trovadores, como ele ficou conhecido.
Entre os destaques, uma peça encenada por alunos da cidade e um disco que traz relíquias da obra do gênio, um dos maiores artistas gaúchos de todos os tempos. Hoje, Retratos da Fama relembra a brilhante trajetória de Gildo, com uma entrevista exclusiva com a viúva do astro, Dona Carminha, e traz detalhes dos eventos que homenageiam o astro.
No teatro, jovens revivem a história
Entre as atrações previstas para celebrar o centenário de Gildo, uma das que chama mais atenção é a iniciativa de nove alunos da Escola Estadual Farroupilha, de Viamão. Sob o comando de Wesley de Souza Marques, empresário da família Freitas, e com o auxílio do diretor da instituição, Jussemar da Silva, os estudantes passaram a encenar, desde fevereiro deste ano, a peça A História do Poeta de Branco, que conta a vida do trovador, e que será apresentada hoje, em uma programação especial, que vai até domingo (confira no final desta matéria).
— Esse grupo de alunos tem feito apresentações ligadas ao nativismo e ao tradicionalismo desde o ano passado. Em setembro, depois de uma apresentação na Semana Farroupilha, passaram a alimentar a vontade de fazer outras peças ligadas ao tema. Então, surgiu o desejo neles de homenagear o Gildo — explica Jussemar.
Menina vive Gildo
A peça passa em revista a vida de Gildo, desde seu nascimento, o casamento com Dona Carminha, em 1941, até o sucesso como trovador, na década de 1950, e suas andanças pelo Interior do Rio Grande do Sul. Na montagem, curiosamente, quem, interpreta o artista é uma menina, Iasmin Cannez, 16 anos.
— Em uma das reuniões, perguntaram: "Quem quer fazer o Gildo"? Nenhum menino se manifestou. Aí, eu disse: "Já que ninguém vai, eu vou". É uma coisa nova, as pessoas que já viram algumas pré-estreias acharam o máximo que o Gildo seja interpretado por uma menina — comemora Iasmin.
A jovem conta que se apaixonou pela trajetória dele:
— Percebi que a vida do Gildo teve altos e baixos, que ele teve dificuldades na infância. Depois, tu notas que ele era incrível, não tem pra ninguém. Ter feito a peça me integrou mais com a cultura do Estado. Os adolescentes de hoje são muito dispersos com a cultura gaúcha, não reconhecem o quão rica é.
Disco recupera obras-primas perdidas
Para Jorge de Freitas, 73 anos, um dos cinco filhos de Gildo (os outros quatro são Neuza, 72, Paulo, 71, Zeca, 70, e Leovegildo, 61), presenciar e participar de celebrações pelo legado do pai é um momento especial. E suado.
— Foi uma briga. Para que as homenagens saíssem, tivemos muitas parcerias, de fãs, amigos e pessoas que acompanharam a vida do pai — afirma Jorge, que segue cantando a obra do patriarca em shows.
"Tudo que fazem pra ele, eu fico contente"
Aos 94 anos, dona Carminha, viúva de Gildo, esbanja saúde em sua casa, no bairro Formosa, em Alvorada. Lá, rodeada de fotos e lembranças do eterno parceiro, ela comemora todas as iniciativas feitas para celebrar a obra do artista.
— Estou gostando muito de tudo isso. O Gildo foi muito bom para o povo. Tudo que fazem pra ele, eu fico contente. E fico muito emocionada ao ver que o povo não esqueceu do Gildo — diz.
Surpresa
Ao receber a visita dos alunos que encenam a peça sobre a vida de Gildo, ela se emocionou e ficou surpresa, pois não sabia da homenagem. Articulada, elogiou a iniciativa dos estudantes que levam o legado do Rei dos Trovadores para os mais jovens. Quando perguntada sobre o que sente mais falta de Gildo, a resposta veio na hora.
— Tenho saudade como as pessoas têm dele. Gildo era muito amado pelo povo. É um artista que deixou muita saudade. Especial, de primeira _ finaliza, arrancando risos dos estudantes.
Cinco dias dedicados ao Rei dos Trovadores
— O evento ocorre no Parque de Eventos Arroz com Leite (RS-040, Parada 69), em Viamão, desta quarta-feira (19) até domingo (23). Confira a programação especial - toda com entrada franca.
Nesta quarta-feira (19):
— 13h: abertura oficial das celebrações com uma missa
— 16h: lançamento do CD comemorativo aos cem anos do artista
— 17h: encenação da peça teatral A História do Poeta de Branco, que conta a história do trovador.
— 20h: show de Jorge Freitas, com participações de Teixeirinha Filho e Teixeirinha Neto
Nesta quinta (20):
— 9h30min: programação livre, com tertúlias
— À tarde: apresentações de CTGs
— 17h30min: baile com o grupo Gildeiros do Tuga
Sexta (21)
/// 9h30min: exposição com a obra de Gildo
/// 19h: show com integrantes da família Freitas
/// 20h30min: baile com Fundo de Campo
Sábado (22)
/// 15h30min: apresentações de músicos locais
/// 19h: apresentações de gaiteiros
/// 21h: baile com Vento Sul
Domingo (23)
/// 14h30min: final do concurso de gineteada
/// 17h: show com atração a ser definida
/// 20h: show de Jorge de Freitas
Discografia
/// Lançou 15 discos enquanto vivo. O primeiro foi O Trovador dos Pampas, em 1964.
/// Após sua morte, foram lançados, entre coletâneas e reedições, 10 álbuns.
Faixas inéditas
Entre as homenagens ao centenário de Gildo, uma dos mais caras para Jorge é o lançamento de um CD (R$ 15, à venda no evento) com 12 faixas, batizado 100 Anos - Gildo de Freitas. O álbum foi construído a partir de gravações de fãs (a maior parte, feitas em fitas cassetes que foram digitalizadas) que assistiram a shows e trovas do músico. No disco, a faixa Centenário, em especial, emociona Jorge.
— O pai fez uns versos que ele queria cantar quando fizesse cem anos. Fui para estúdio e cantei esses versos. Virou uma das músicas do disco — revela o músico, que completa:
— Tem, inclusive, uma trova feita pelo pai, na casa do Teixeirinha (1927 - 1985).
E duas canções que não chegaram a ser gravadas: A Volta da Gabriela, e A Resposta do Cachorro Recalcado. Daqui pra frente, para tentar manter a obra de Gildo viva e presente, Jorge revela que tem o projeto de promover, no dia do falecimento do pai, 4 de dezembro, um rodeio ou um festival nativista.
Gildo: vida e obra
Leovegildo José de Freitas, Gildo de Freitas, nasceu em 1919, no bairro Passo D'Areia, em Porto Alegre - à época, zona rural da Capital. Aos 12 anos, fugiu de casa e foi cantar em canchas de carreira e bocha. Em 1941, casou-se com Carminha e ganhou destaque na década de 1950, quando conheceu Teixeirinha (1927 - 1985), seu parceiro em duelos musicais e com quem teve uma amizade conturbada.
Pioneiro
Brilhou em faixas como Eu Reconheço que Sou um Grosso e Desafio de um Paulista e de Um Gaúcho. De acordo com a biografia Gildo de Freitas - O Rei dos Trovadores (Plus Editora, R$ 46,80, preço médio), que foi ampliada e será lançada hoje, em Viamão, ele se tornou mais popular quando incorporou aos versos ritmos regionais como o xote, a rancheira, vanera e a milonga.
Anos antes de gravar canções e trovas, já havia conquistado popularidade em apresentações nas salas de cinema, em circos, rodeios e nos programas de rádio pelo Interior. Nos anos 1950, época de ouro da trova, a notoriedade veio ao lado de nomes como Luiz Miller e, principalmente, Tereco (ambos já falecidos) que o próprio Gildo dizia ser melhor do que ele. Foram históricos os seus duelos no Grande Rodeio Coringa, um dos mais famosos programas regionalistas da história da Rádio Farroupilha (680 AM).
"Trovando, Gildo de Freitas conquistou o Rio Grande do Sul porque era mesmo imbatível, com sua aguda inteligência natural, seu conhecimento das coisas campeiras, seu poderoso carisma e sua incrível facilidade para fazer versos esplêndidos. E ele não era modesto, tinha nítida consciência desses atributos como se pode ver em uma de suas músicas, Dizem que o Poeta É Louco", diz Juarez em dos trechos da obra.
Único registro
Sua única aparição registrada na TV aconteceu um pouco antes de ele falecer, em 1982. Com Edson Dutra e Everton Dutra, de Os Serranos, e vocais da dupla Gauchinhas Missioneiras, cantou Eu Reconheço que Sou um Grosso no Galpão Crioulo, apresentado pelo parceiro Nico Fagundes (1934 - 2015).
— Ele muda a letra nessa gravação para homenagear o tio Nico (no final da faixa). Só foi lá porque era o advogado e amigo dele — diz Ernesto Fagundes
Em 1982, após complicações decorrentes de enfisema pulmonar, cirrose, problemas cardíacos e hemorragia interna, o astro faleceu aos 63 anos. Se corpo foi sepultado em Viamão.