Com os pés na comunidade
10 anos de Estrelas da Periferia: conheça quatro destaques que fizeram sucesso regional e até nacional
Grupo do Bola, MCs Dudinha e Dino e Guinter Vieira ganharam projeção no Estado e no país, depois de terem suas matérias publicadas na seção
Exatamente 10 anos após estrear nas páginas do Diário Gaúcho (em 7 de julho de 2009), Estrelas da Periferia celebra sua primeira década fiel ao propósito de dar espaço a novos talentos das comunidades. Ao longo do tempo, mais de 500 artistas tiveram suas histórias contadas na seção que começou no corpo do jornal e, em julho de 2014, ganhou a contracapa. Retratos da Fama revisita quatro destaques que fizeram sucesso regional - e até nacional - depois que tiveram sua arte revelada no Estrelas.
E, em uma referência ao Pitaco de Quem Entende que sempre traz dicas de radialistas e produtores aos músicos novatos, trazemos, desta vez, o Pitaco dos próprios personagens inspirando novas estrelas ainda por vir. Mais do que narrar as conquistas e batalhas do Grupo do Bola, de Guinter Vieira, de MC Dudinha e de MC Dino, o jornal se aproxima ainda mais dos seus leitores. Leva para suas páginas músicos que não tinham espaço na mídia, mas que já eram estrelas pelas periferias afora.
Samba de Gravataí tipo exportação
Em 2010, quando o Grupo do Bola reunia um "bando de moleques doidos que pareciam o Olodum e que só queriam fazer música", como define o percussionista Dione, os músicos residiam na Morada do Vale 1, em Gravataí, e nem sonhavam com o que vinha pela frente.
Nove anos depois, tudo mudou.
Os pagodeiros, que fizeram sucesso em 2014 no SuperStar, da Globo, moram em São Paulo desde o fim de 2016 e colhem os frutos de 12 anos de estrada, já que a banda foi fundada em 2007. Hoje, a formação tem Dione e Matheus (pandeiro e vocais), 26 anos, Saimon (vocal) e Robson (cavaco), ambos 28.
— Por morar em São Paulo, o mercado fica muito mais difícil porque tu concorre direto com artistas grandes. No bar onde tu quer tocar, perto da tua casa, a concorrência é com a Turma do Pagode. Mas estar aqui tem vários lados bons, tanto na parte logística quanto na agenda, pois nossos shows se concentram em São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e interior de São Paulo — explica Dione, que mostra orgulhoso a primeira matéria feita em Estrelas da Periferia que virou quadro e decora a sala da casa dos pais do músico.
A foto acima foi produzida onde a primeira matéria com o grupo foi feita, na Morada do Vale 1. O local tem significado para os artistas, pois era onde os músicos se encontravam quase que diariamente, antes de fundarem a banda. Os quatro integrantes atuais estão na banda desde a sua fundação. Três deles estavam no Rio Grande do Sul, na semana passada, por conta de shows na Região Metropolitana.
"Moleques da rifa"
No começo do grupo, os músicos suaram para conseguir comprar os instrumentos.
— A gente batia de porta em porta, e todo mundo falava: "Ah, olha os moleques da rifa aí". Depois, já com os instrumentos, a gente começou a tocar em tudo o que era lugar — relembra Saimon.
Com 10 shows marcados para julho, com músicas que ficaram conhecidas no país inteiro, como Santinha do Pau Oco e Quebra no Meu Camarote, os pagodeiros lembram que, entre os grandes momentos nos últimos nove anos, além do SuperStar, estão a gravação do primeiro DVD para mais de 80 mil pessoas, na beira da praia de Tramandaí, em 2015, e as suas participações no Encontro com Fátima Bernardes e Domingão do Faustão.
O dominical, conforme Matheus, teve um gostinho especial para eles:
— Foi muito forte, é o sonho de todo músico. O cara sempre pensa:
"Um dia, vou no Faustão". Quando tu tá lá tocando tua música, é um sonho!
Com tantas conexões, o Grupo do Bola comemora ter se aproximado de músicos que eram ídolos inatingíveis, como Rodriguinho, ex-Travessos.
— É um cara que tu nunca imagina que vai ser teu amigo, né? E o Rodriguinho é meu amigão, me chama pra ir na casa dele. Quando isso acontece, o cara tem que fingir naturalidade, né? — completa Matheus, aos risos.
Pitaco do Grupo do Bola
— Acho que o nosso grande segredo foi a união, vivendo os piores e os melhores momentos da carreira juntos. Sempre tivemos uma preocupação com o lado musical, com a nossa qualidade — avalia Dione.
Cria da vila nova pelo brasil afora e fenômeno na internet
Com apenas 14 anos, em 2013, MC Dudinha, da Vila Nova, já dava mostras de que saberia tirar proveito da internet para que sua carreira decolasse. À época, gravou de maneira artesanal o vídeo da sua primeira canção, Rolê de R1, e postou no Facebook. Resultado: mais de 6 mil curtidas, um número expressivo para uma adolescente que recém se lançava na música.
Hoje, seis anos depois, a internet segue sendo uma ferramenta poderosa para a funkeira, que comemora o bom momento, com números impressionantes para uma artista local: somados, três de seus clipes (das canções Fala na Cara, Quem Não Quer Sou Eu e Ao Meu Comando) têm mais de 8 milhões de visualizações no YouTube.
Dois deles, de Fala na Cara e Quem Não Quer Sou Eu, foram produzidos pelo mago dos clipes de funk no país. KondZilla produz faixas de nomes como Kekel e Kevinho, só para citar dois dos mais bombados.
— De lá pra cá, muita coisa mudou. Passei a fazer aula de canto, evoluí muito — comemora Dudinha, 19 anos.
Representatividade feminina
Além dos clipes, Dudinha ganhou destaque, nos últimos cinco anos, ao fazer shows fora do Estado, no Rio de Janeiro e em Minas Gerais. Por aqui, esteve no Planeta Atlântida, no palco Planeta Funk 92, neste ano. Além disso, ostenta uma respeitável média de 12 a 20 shows mensais.
Em seu espetáculo, a funkeira conta com uma equipe de balé, que tem de dois a oito integrantes, dependendo do formato do show.
— Quero crescer ainda mais, aprender e atingir o sucesso nacional, claro — confessa Eduarda Vanzin, nome de batismo de MC Dudinha.
Além de ser um dos destaques do funk gaúcho, ao lado de referências como MC Jean Paul, Tchesko e Dino, Dudinha é uma das poucas mulheres gaúchas a ganhar visibilidade no gênero. Em 2014, ela acreditava que isso poderia ser um diferencial.
Hoje, convoca a ala feminina para participar do movimento:
— Quando eu comecei, não tinha muita menina. Hoje, noto que surgiram algumas, mas a mulherada tem que aparecer mais.
Pitaco da Dudinha
— A galera que está começando tem que focar na qualidade das músicas. Qualidade é mais importante do que quantidade. Outra dica é conversar com gente mais experiente do meio. Eles sempre dão bons conselhos. E também tem que saber lidar com as críticas.
Referência do funk na Maria da Conceição
Aos 27 anos, MC Dino, é um dos principais funkeiros gaúchos. Porém, em 2012, quando foi entrevistado no Estrelas da Periferia, o jovem prodígio, morador da Vila Maria da Conceição, na zona leste da Capital, dava seus primeiros passos.
À época, Dino despontava na noite da Capital ao lado de quem viria a ser um dos principais produtores do funk: DJ Mart. Entre seus feitos, ele comemora o fato de já ter se apresentado cinco vezes nos palcos alternativos do Planeta Atlântida. Com 13 anos de estrada, Dino ostenta números de respeito: são cinco clipes gravados com KondZilla, como Tá Tendo Evolução e o mais recente A Culpa Não É Minha. Ao todo, já são 20 vídeos, com mais de 14 milhões de visualizações no YouTube.
Desde a metade de 2018, em um ritmo frenético, lançou nove clipes, quase um por mês, ao estilo de astros como Anitta, que apostam nesta estratégia.
— Mudou muita coisa de 2012 para cá. Hoje, sou um dos principais funkeiros do Rio Grande do Sul, mas penso mais adiante. Já fiz shows em Santa Catarina, no Rio de Janeiro, mas quero ser conhecido nacionalmente — comenta o inquieto músico, que ainda mora na Vila Maria da Conceição.
Rotina de estrela
Quando começou a ficar conhecido no Rio Grande do Sul, Dino passou por situações típicas de astros da música. Em três ocasiões, em um shopping da zona norte da Capital, teve de sair escoltado por seguranças, devido ao assédio.
— Eu estava almoçando. Daqui a pouco, começou a juntar um monte de gente em volta, tive que sair com os seguranças (risos). Ali começou a cair a ficha de que a coisa estava dando certo — relembra.
Outra situação curiosa ocorreu em 2014, quando conheceu o jogador de futebol português Cristiano Ronaldo, por intermédio de seu amigo Teckô, ex-jogador do Internacional. O craque estava com a delegação de Portugal na cidade de Campinas, em São Paulo, por conta da Copa do Mundo. Orgulhoso, Dino conseguiu entregar um CD para o astro.
Hoje, com uma média de 10 shows por mês, o músico não se restringe ao funk. Seu mais recente lançamento é um EP com faixas de trap, uma vertente do hip hop.
Pitaco do Dino
— O aperfeiçoamento é muito importante, e escutar algumas opiniões é legal. Não adianta achar que é "o cara" e não buscar crescimento. Musicalmente, tem que tentar "colar" em um produtor que faça uma batida "da hora".
Samba de Gravataí tipo exportação
Aos 31 anos, Guinter Vieira, destaque da seção em 2013 como talento do Bairro Santa Cruz, em Gravataí, foi buscar ares diferentes de sua cidade natal. Mais especificamente, os ares de Florianópolis, em Santa Catarina, onde mora desde 2017.
Vivendo há 12 anos de música, o sambista ganhou projeção fora do Rio Grande do Sul em outra de suas andanças pelo país, em 2014, quando foi morar no Rio de Janeiro. À época, tocou na banda de Arlindo Cruz, na de Arlindo Neto e com um dos mitos da história do samba nacional: Monarco.
— Ter tocado com o Monarco, que acredito que seja o maior ícone do samba nacional ainda vivo, foi demais. Minha estada no Rio mudou a minha carreira — reconhece Guinter.
Compositor de mão-cheia de faixas como Maria e Conceição, Guinter virou uma das referências do samba em Porto Alegre, fez seu nome na Cidade Maravilhosa e entrou forte no mercado catarinense.
— Mesmo tendo nascido no Rio Grande do Sul, eu não conhecia Florianópolis. Vim fazer um show aqui (Floripa) e me encantei. Então, alguns amigos começaram a "botar pilha" para que eu viesse morar aqui. Conheci muita gente, entrei bem no mercado e divido a agenda entre Floripa, Porto Alegre e Rio — comemora Guinter, que faz cerca de 16 shows mensais.
Pitaco do Guinter
— É preciso ter amor ao que se faz, tem que gostar da música. Além disso, profissionalismo faz a diferença: até hoje, no máximo, devo ter faltado ou me atrasado uma ou duas vezes para algum show.