Entrevista
Xuxa: "Existe muito ódio na vida e no coração de algumas pessoas que falam em nome de Deus"
Rainha dos Baixinhos lança "Maya – Bebê Arco-íris", livro com temática LGBT+ sobre uma criança que escolhe viver com um casal de mulheres
O amor — aos baixinhos, aos amigos e ao próximo —, marca registrada dos trabalhos de Xuxa Meneghel, carimba o novo projeto da apresentadora: o livro Maya – Bebê Arco-íris (Globo Livros, R$ 52). A obra discute a igualdade de gênero ainda na infância e virou polêmica antes mesmo de ser lançada oficialmente, nesta terça-feira (3), nas plataformas digitais.
A trama mostra a delicadeza e o encanto da anjinha Maya, que aceita deixar o céu para vir ao mundo espalhar o amor em uma família de duas mães. A personagem foi inspirada em uma Maya real, a afilhada de Xuxa e filha do casal de suas amigas Vanessa Alves e Fabiane Geledan.
Com ilustrações de Guilherme Francini, a obra já recebeu críticas de Sikêra Jr., apresentador da RedeTV!, que "acusou" a loira de "lançar um livro LGBT+ para crianças" e que os pais deviam ter cuidado com os pequenos. O posicionamento veio carregado de outras críticas, como a da deputada federal Bia Kicis (PSL-DF).
Mesmo com o retorno negativo, a Rainha dos Baixinhos segue tranquila a respeito de seu posicionamento. No momento, está se preparando para se despedir da Record, enquanto estuda novas possibilidades e também aproveita para divulgar seu outro livro, a biografia Memórias, lançada em setembro. Em entrevista por e-mail a GZH, a loira fala sobre as duas obras, as críticas e o carinho que carrega do Rio Grande do Sul e sua terra natal, Santa Rosa.
Maya foi inspirada em uma afilhada real e em seu contato com a sua filha Sasha. Além de debater a representatividade com os pequenos, qual foi sua preocupação com este livro?
Xuxa: Acredito muito que as crianças são como anjos que caem em nossas vidas, algumas delas inclusive se lembram da sua vida antes de nascer. Como no caso da minha filha, que me contava lindas histórias sobre o céu. Sei que é tudo muito lúdico, mas tentei passar a verdade nas palavras da Maya. Eu usei muito o que a Sasha me falava e da minha relação com Deus: aquele Deus do livro é aquele pelo qual eu acredito e rezo. É um Deus com coração, que não é vingativo e nem preconceituoso. Esse Deus de pecados não é meu. O meu Deus é de amor.
Como tem lidado com as críticas a respeito deste livro?
Como tudo que eu fiz e faço na vida, basicamente: como faço com minha alimentação vegana; com os namorados que tive; com o nascimento da minha filha; com a escolha de ficar do lado dos LGBT+ mesmo não sendo gay; de permanecer ao lado dos negros na luta contra o preconceito mesmo não sendo negra; ao lado de quem é especial, mesmo não tendo essas necessidades... Ou seja, de uma maneira ou de outra, sempre fui criticada em tudo e não seria diferente com o livro. O que me deixa triste é que eles nem leram, não é mesmo?
Acredita que o amor e as relações LGBTs precisam ser melhores debatidas ainda na infância? É com a naturalização que teremos uma sociedade mais igualitária?
Acho que o amor que não tem gênero, nem cor, deveria ser mostrado, elogiado, escrito e desenhado em todos os momentos da vida. Existe muito ódio na vida e no coração de algumas pessoas. Principalmente de algumas que falam em nome de Deus.
Além deste livro, pretende realizar outros projetos voltados para a causa LGBT+?
Meu público LGBT+ estará sempre em meus planos de vida e de trabalho, pois eu não trabalho para uma tribo, eu trabalho para quem gosta de mim. Eu não escolhi trabalhar para eles. Foram eles que escolheram meu trabalho e a mim para fazer parte da vida deles. E isso é um grande privilégio.
Como foi a troca com a parte de design e o ilustrador da obra?
Guizinho (Guilherme Fracini, o ilustrador) é um cara especial. Ele que escolheu o livro ou foi o livro que escolheu ele? Não podia ser outra pessoa. Ele é sensível e conheceu a personalidade da Maya antes da própria dinda aqui. Ele a desenhou como se estivesse olhando para ela todos os dias, como se realmente a conhecesse. O que eu fiz? Só aplaudi a sensibilidade e o lindo trabalho dele. Não falei nada, a não ser "parabéns e obrigada".
Em Memórias, você se comparou a Rita Lee e disse que falta muito para chegar até o nível dela. Por que?
A Rita é meio guru: suas roupas, seu profissionalismo, sua audácia, sua coragem... E a paixão declarada pelos bichos e crianças. Eu acredito que se existe um planetinha para cada tribo, eu devo ser do planetinha dela: amo a natureza, crianças e — como ela — eu já apertei o botão do f***-se para o resto faz tempo.
E quais outros artistas seguem como parâmetros na sua cabeça?
Não são muitos, pois me decepcionei com quase todos, mas a Hebe é uma grande inspiração. Brigitte Bardot também — na luta pela causa animal.
O Rio Grande do Sul está impregnado em diversas lembranças de Memórias. Quais partes mais te recordam o Estado e por que?
Minha linda Santa Rosa, com sua terra vermelha e cheiro de uma flor branquinha que dava na frente da casa da vó Carola. Santa Rosa me lembra férias, que também me recordam locais como Tramandaí e Gramado. Nossa... Que saudade! Que lindo é tudo aí: a Lagoa dos Patos, o rio Uruguai e — do outro lado — Posadas, com as compras que fazíamos... Que delícia! Me lembro da família toda, junta e feliz. Amo minha terra!!!