Entrevista
Jéssica Ellen sobre autora de "Amor de Mãe": "Ela mete o dedo nas feridas"
Atriz que vive Camila na trama ainda falou sobre a suspensão das gravações e sua experiência dentro da novela em entrevista ao Gáucha+
Uma das estrelas de Amor de Mãe, atual novela das nove na RBS TV, a atriz Jéssica Ellen conversou com a rádio Gaúcha na tarde desta terça-feira (30). A intérprete de Camila narrou como foi a suspensão das gravações, em março do ano passado, além de adiantar parte do destino de sua personagem na trama de Manuela Dias. Aviso de spoiler: é um final feliz.
A entrevista já começou com Jéssica revelando aos apresentadores do Gaúcha+, Kelly Matos e Leandro Staudt, que as gravações de Amor de Mãe sempre foram muito intensas. Por conta disso, parte do elenco nem tinha ideia de quão séria a situação do coronavírus era, até a Globo decidir suspender seu núcleo de entretenimento:
— Quando a gente recebeu a notícia de que a novela iria parar por conta da covid-19, foi uma grande surpresa para todo mundo, porque acho que na história da TV nunca tinha acontecido algo que parasse as gravações. No primeiro momento, a gente não entendeu muito bem. Eu, particularmente, estava gravando muito, todos os dias, numa escala de horário muito intenso. Então, eu não conseguia acompanhar de perto o avanço da doença.
Uma vez que as gravações foram suspensas, ela teve a chance de analisar a gravidade da situação, o que a fez concordar com a decisão da emissora.
— Acho que foi uma atitude prudente da empresa como um todo, de colocar a nossa saúde em primeiro lugar. Porque se a gente não estiver bem, o entretenimento não vai acontecer também, né? Então, acho que foi um ato de muita coragem e em prol da saúde de todos os funcionários.
Assim que as produções saíram do ar, surgiu o questionamento: como retornar? Jéssica contou que ninguém esperava ficar mais de três meses longe dos estúdios da Globo e haviam muitas dúvidas sobre acrescentar a pandemia à narrativa da novela.
— A gente falou: “Não, gente, isso já vai estar resolvido” ou “As pessoas não vão querer mais falar sobre a doença, a gente tem que manter a trama como era”. E aí, a gente foi vendo que foram passando os meses e o cenário só piorava, né? — recordou a atriz. — Então, acho que foi uma solução muito inteligente da Manuela Dias, que é a autora, e do José Villamarim, que é o diretor da novela. Os dois cabeçaram muito bem, assim, essa retomada. Acho que foi uma escolha muito inteligente de colocar a pandemia dentro da novela, porque é uma novela realista, né? É uma novela contemporânea que fala do dia a dia dos brasileiros.
Jéssica defende que mesmo que seja difícil abordar a situação da covid-19, era a alternativa que manteria o espírito "verdadeiro" da trama. Mais do que isso: ela acha que é papel da arte justamente mergulhar de cabeça e explorar os meandros das questões difíceis e essenciais que permeiam a vida de grande parte dos brasileiros.
— A Nina Simone fala muito bem disso, que um artista reflete o seu tempo, né? As questões daquele momento, daquela fase da história. E eu acho que a televisão tem essa função muito latente, por chegar na casa de milhares de brasileiros, né? Então, eu acho maravilhoso, hoje em dia, numa novela, a gente conseguir abordar tantos temas que são fundamentais, importantíssimos de serem debatidos na televisão, porque são coisas que atravessam a gente no dia a dia, na nossa sociedade, a gente não consegue ter uma vida em paralelo.
A artista, então, elogiou a forma que a autora da novela conseguiu adicionar diferentes questões dentro de Amor de Mãe, dos desafios da educação brasileira à desigualdade social no país, passando pelo racismo e o tratamento dispensado às mulheres negras.
— A Manuela tem uma escrita que é muito realista, muito potente, muito bonita e ela toca nas feridas, né? Ela mete o dedo nas feridas e também tem lampejos de alegria e de felicidade, né?
Algumas das cenas envolvendo sua personagem, Camila, que acabaram viralizando nas redes sociais, demonstram bem essa dualidade da escrita de Manuela Dias. Um dos momentos é a formatura dela, em que a futura professora profere um emocionante discurso agradecendo o apoio da mãe, Lurdes (Regina Casé). No outro, ela está no hospital, depois de ser atacada dentro da própria escola, e desabafa com a mãe: como mulher negra, ela não aguenta mais ser obrigada a ser forte.
— Foi maravilhoso ter a chance de falar esse texto tão forte, né? E na TV aberta, pra tanta gente, porque eu acho que isso é um grito coletivo, né? Essas palavras que a Camila usou nessa cena, são palavras de muitas mulheres — destacou Jéssica.
Como a artista ressaltou, a imagem das mulheres negras é historicamente ligada a ideia de que elas são fortes e potentes, capazes de enfrentar tudo sem auxílio.
— Não foi dito pra gente que a gente podia ser frágil, que a gente podia ser vulnerável. Isso tudo ficou historicamente associado à delicadeza da mulher branca. Então, a mulher branca pode todas essas possibilidades e luta pela força, enquanto a mulher negra é tida como uma entidade superforte e que quando precisa de um colo não tem pra dar. Não tem alguém.
Por isso tudo, ela sente que foi "muito bonito" poder dar vida a Camila nas telinhas nacionais. Sobre o desfecho da novela, Jéssica conta que não recebeu os roteiros completos dos episódios finais — somente as cenas envolvendo sua personagem. Portanto, ela conhece a curiosidade do público e adianta um pouquinho do que podemos esperar sobre o destino de Camila:
— Eu sei que a Camila segue na educação, ela tem momentos bonitos, assim, no final da trama. A relação dela se mantém de maneira horizontal com os alunos, o que eu acho muito bonito, porque a história da personagem começa com isso, né? Ela se formando, ela indo pra escola pública, vivendo esse sonho e deparando com uma realidade que não é contada também, durante o estudo para o magistério. Então, é muito bonito ver que a personagem não desistiu do objetivo dela, né?
Confira a entrevista completa a seguir: