Cotidiano
"The Office" gaúcho? Série retrata rotina de um mercadinho da periferia de Porto Alegre
Produção gravada no bairro Bom Jesus mistura humor e crítica social para mostrar o dia a dia do estabelecimento


Uma comédia que nasce na pandemia, da vivência e da vontade de contar histórias reais que acontecem em uma periferia. É assim que surge Do Bairro, ambientada em um mercadinho da zona leste da Capital.
Criada pelo produtor audiovisual Freddy Paz, a produção gaúcha é financiada pela Lei Paulo Gustavo, que apoia projetos culturais por meio de editais.
A série tem previsão de oito episódios de até 30 minutos e acompanha o cotidiano do teimoso Agenor e de sua filha, Bianca, que sonha em viver de arte, em meio aos desafios de manter o pequeno negócio da família funcionando.
Inspirada na trajetória do próprio criador — filho de dono de mercadinho da Vila Bom Jesus —, Do Bairro aposta em um "The Office gaúcho", contando com uma pitada de humor e muito afeto para mostrar a relação entre pai e filha e discutir temas sociais, familiares e de pertencimento.
— Do Bairro nasce na pandemia, 2020, meio que fechou tudo. Eu voltei a trabalhar no mercadinho da família, e vi como uma oportunidade de voltar para ajudar minha tia, que tinha assumido o mercadinho. Eu já não vi os clientes como clientes, via como personagens. O espaço já não via como mercadinho, via como locação — afirma Paz.

O roteirista e diretor, Luiz Santana, lembra que os personagens foram moldados para refletir o cotidiano da periferia e a linguagem regional.
— Séries como The Office e Abbott Elementary são séries que têm uma linguagem que eu sempre pensei que poderia funcionar bem na nossa proposta. Com o tempo, outras coisas começaram a vir, e, principalmente, a necessidade de abrasileirar e regionalizar a série. A gente traz referências de linguagem do Sul, da periferia — diz Santana.
A trama reúne personagens marcantes do universo popular brasileiro: o açougueiro Maicosuel, fissurado por ufologia; Pamela, mãe solo e nova caixa do mercadinho; Dinei, o “faz-tudo” que tenta recomeçar a vida; e Jaqueline, mulher negra e trans, profissional de TI.
Para o ator de 54 anos Marcelo Herreira, que interpreta Agenor, o dono do mercado, a série encontrou o equilíbrio ideal para mostrar o que há de mais autêntico na rotina de quem vive e trabalha na periferia.
— Quando eu recebi o convite, quando eu li o roteiro, eu achei o mais legal disso que é uma comédia familiar nesse sentido, não só da família que trabalha no mercado, mas é uma comédia para todos os públicos nesse sentido e, ao mesmo tempo, traz o real do que acontece no mercado de bairro — diz Herreira.
Já Bianca, vivida pela atriz Silvana Rodrigues, de 39 anos, que também cresceu em bairro popular, conta que sua trajetória se mistura com a da personagem, uma vez que as duas escolherem viver, ou sobreviver da arte.
— Eu me reconheço muito nela. Era muito distante pra mim pensar numa carreira artística. Então, nesse momento, a Bianca e a Silvana estão completamente entrelaçadas na busca de seguir uma caminhada de realizações, audiovisual e não só — conclui Silvana.
A proposta visual mistura o olhar tradicional da câmera com o falso documentário gravado pela própria Bianca. Ela registra o cotidiano do local, enquanto tenta ajudar o pai a reorganizar o negócio.
Do Bairro é, ao mesmo tempo, um retrato e uma celebração da vida em comunidade — com humor, afeto e crítica social. Um convite para enxergar o cotidiano dos mercadinhos de bairro como ponto de encontro, memória e resistência cultural.