Deixa a vida nova entrar
Reynaldo Gianecchini volta ás novelas após vencer o câncer
Ator fará o motorista Nano em Guerra dos Sexos
Impossível entrevistar Reynaldo Gianecchini e permanecer imune às reflexões que cada resposta dele propõe. Depois de superar um câncer no sistema linfático, o ator volta à telinha como o motorista Nando, na novela das sete Guerra Dos Sexos, que estreia na TV Globo no dia 1º de outubro. Renovado, aos 39 anos, ele fala sobre as experiências pós-internação que o fizerame o fazem se sentir um garoto.
Diário Gaúcho - Como foi a sua primeira relação sexual após ter alta hospitalar?
Reynaldo Gianecchini - A parte amorosa está bem suspensa na minha vida. Sexo é uma retomada. Engraçado, estou me sentindo um adolescente de novo. É revisitação do velho. Uma coisa nova, que não é nova, mas parece nova. Tem uma excitação nisto, uma redescoberta.
Diário - E procura um novo amor?
Reynaldo - Fiquei muito tempo afastado disso, virei uma chavinha para cuidar de outro departamento. E agora, retomar vai ser legal. A vida vai ter que me trazer essas coisas. Estou esperando elas irem vindo, sem ansiedade.
Diário - Tem vontade de ser pai?
Reynaldo - Ainda não bateu. Pensei muito na questão de continuidade, no sentido da vida. Isto está na minha cabeça. Um dia, vou querer ter. Antes, teria que encontrar a mulher com quem tivesse vontade de ter filhos.
Diário - Por que tornou pública a sua doença?
Reynaldo - Não tenho o que esconder. Sou ser humano, não super-homem. Tive que buscar força, e me fez bem falar sobre o câncer. Foi terapêutico. Expor a sua fragilidade tira você dessa coisa de herói. Mostra que a vida tem os seus obstáculos, que é legal você encarar de cabeça aberta.
Diário - A que tipo de tratamentos alternativos recorreu?
Reynaldo - Me ofereceram todo tipo que você pode imaginar no mundo de alternativas. Comia graviola, que todo mundo fala que é anticancerígena. Muitas pessoas, de diferentes crenças, vieram rezar para mim. E aceitei. O pessoal do Centro Espírita de Franca (em São Paulo) veio. Eles rezaram, e fiz a operação espiritual porque o meu pai estava envolvido com essa crença. Mas, uma hora, preferi buscar a minha força interior.
Diário - Trocou impressões com amigos como Hebe Camargo e Claudia Jimenez, que enfrentaram a doença?
Reynaldo - Meu tratamento não me permitia muito contato com as pessoas. Desde o primeiro momento, recebi muitos e-mails e respondia ao máximo que dava. Mas a minha rotina era bem agitada no hospital. É difícil ficar mantendo correspondência, mas me sentia absurdamente acarinhado com tudo o que me mandavam. Recebi uma visita do Lula (que teve câncer na laringe) e falamos da parte divertida da doença, da careca e outras amenidades.
Diário - Como foi o primeiro dia em casa depois que recebeu alta?
Reynaldo - Receber alta foi uma alegria muito grande. Teve festa, bolo no hospital. Mas, quando fui para casa, vi que estava muito debilitado. Cheguei cheio de energia, pensando que ia fazer mil coisas, mas fui direto para a cama. Vi que tinha que respeitar o corpo. Demorei um mês para começar a fazer algo. Tinha consciência de que seria um dia de cada vez, sem ansiedade, para viver tudo o que se tem para viver, com todos os cuidados.
Diário - Como foi provar algo que, há muito tempo, você não comia?
Reynaldo - O que eu mais tinha vontade, quando não podia (durante o tratamento), era comer fruta e tomar água. Nada melhor do que tomar água com gosto de nada. Foi uma delícia, eu me esbaldei! Hoje, a minha alimentação mudou radicalmente. Não foi algo racional, mas evito comida industrializada. Tirei açúcar, lactose, glúten. A gente não pode ficar neurótico, nem antissocial. Se tenho vontade, como pizza, sorvete... Mas isto não faz parte do meu dia a dia.
Diário - Tomou um porre quando acabou a dieta médica?
Reynaldo - O vinho nunca foi proibido. Dizem que é saudável tomar uma tacinha por dia. Até na época em que fazia quimioterapia, o médico deixava. Mas não tive vontade. Não tenho nada contra. De vez em quando, você tem mais é que tomar um porre na vida. Desde que saiba de si. Posso beber pra caramba, que não caio nem dou vexame. Às vezes, quando se é muito certinho, é legal dar uma sujada (risos).
Diário - Que lugares quis visitar?
Reynaldo - Além de estar com a natureza, quis encontrar gente querida, que fez parte da minha vida e, há muito tempo, eu não via. Fiz uma loucura no mapa: fui para Rússia, Estados Unidos, Israel, Itália e Espanha.
Diário - O seu primeiro personagem na volta à tevê tinha que ser leve?
Reynaldo - Encararia um vilão. Sei separar as coisas, mas nada é por acaso. Nando, de Guerra Dos Sexos, veio numa hora muito boa. Ele se mete em um monte de confusão, dá tudo errado na vida dele. Com Juliana (Mariana Ximenes), é romântico e sonhador, mas rola uma atração com Roberta (Gloria Pires). Esta leveza do personagem, da novela, é menos desgastante do que fazer um vilão. A gente grava cada palhaçada que você não acredita que está fazendo aquilo! Parece coisa de criança, e, agora, estou nesse clima. Só uso camisa do Mickey, no espírito anos 80, que estão voltando na minha cabeça. E a novela se passou nessa época...
Diário - Lembra da interpretação do Nando, feita por Mário Gomes na primeira versão da novela, em 1983?
Reynaldo - Eu assisti, mas jamais tentaria imitar o Mário. Ele era saudável, bonitão, esportista. Eu era adolescente e achava bem legal. Mas procuro não ver, para fazer o meu Nando.
Diário - Como foi o primeiro dia de gravação de Guerra Dos Sexos?
Reynaldo - Inaugurei o set. Fui para uma ilha, já tinha um clima de superprodução. Geralmente, quando se começa, é devagar, mas Jorge Fernando (diretor) só deu as coordenadas e gritou "Gravando!". Voltar foi muito gostoso. Estou com gás, e foi bom terminar a primeira cena. Todo mundo foi carinhoso comigo, e, até hoje, nas ruas, as pessoas são receptivas. A minha equipe na novela, mais ainda.
Diário - Teve frisson na primeira cena com Gloria Pires?
Reynaldo - A primeira cena já era de beijo, e tenho tamanho respeito por ela quetive que quebrar o gelo. Se não, fico pagando de admirador demais. Mas isto foi no início. É fácil se entrosar com ela. Nos bastidores, é uma querida. E, em cena, devolve a bola redondinha.
Diário - Como é voltar a fazer par com Mariana Ximenes?
Reynaldo - Em Passione (2010), a gente se entrosou bem, gostava de estudar junto (na pele dos vilões Fred e Clara). Agora, ela é a princesinha, e eu, o romântico. Em outras "encarnações", a gente se estapeou, foi horrível um com o outro. É uma delícia exercitar isto com a mesma parceira. Mari virou uma companheira da vida.
Diário - Como surgiu esta parceria com o autor Silvo de Abreu?
Reynaldo - Ele foi o cara que apostou em me dar papéis diferentes, me fez entrar no universo da comédia com o Pascoal, de Belíssima (2005), e chamou para fazer o vilão Fred, de Passione. É um amigo, um conselheiro. Quando me convidou para Guerra Dos Sexos, topei fazer sem saber o que era.
Diário - E o galã, hoje, tem medo ou vontade de envelhecer?
Reynaldo - Não importa quanto tempo a gente vai viver. E, sim, como a gente vai viver. Quero que o meu dia a dia seja incrível! O resto, pra mim, é tão irrisório... A gente não sabe de nada. E isto não tem importância.
Diário - O que mudou em você?
Reynaldo - Diferente mesmo é o meu olhar sobre a vida. Vivo com mais lentidão. Com a correria, a gente passa e não vê. Hoje, sinto e ouço mais, presto mais atenção, olho mais as pessoas.
Diário - Você está tão calmo, que parece um monge budista...
Reynaldo - Engano seu. Ninguém é uma coisa só. Posso ser terrível também. Busco o equilíbrio, tento ser melhor para as pessoas, no trabalho e mais dedicado à família. Isto vem com a idade. O tempo te deixa mais tranquilo, menos intolerante. Mas tenho um vulcão aqui dentro, pronto para entrar em erupção a qualquer momento.
Diário - O que diz para quem sofre um drama como o que enfrentou?
Reynaldo - O importante é encarar tudo de frente. Tudo tem uma razão. Nada é por acaso. Todo mundo tem o seu desafio. Se o seu desafio é esse que apareceu, não cabe muito questionar. É o que é. Você não tem controle. Se você encarar um dia de cada vez, sem fazer disso um drama, pode ter certeza de que não vai ser difícil. Nada é tão cabeludo. No mínimo, você vai ver um sentido naquilo. Nos tornamos seres humanos melhores quando vencemos desafios.
Guerreiro na luta contra o câncer
Em agosto de 2011, Reynaldo Gianecchini foi diagnosticado com um tipo raro e agressivo de câncer no sistema linfático.
Entre agosto e dezembro, foram diversas internações no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, para realizar sessões de quimioterapia.
Em meio ao tratamento, seu pai, Reynaldo Cisoto Gianecchini, 72 anos, faleceu devido a um câncer no pâncreas.
Em janeiro deste ano, o ator submeteu-se a um autotransplante de medula óssea.
Em fevereiro, exames indicaram a cura de Reynaldo. Já em março, ele retornou ao trabalho, voltando aos palcos com a peça Cruel.