O apito do primeiro jogo da Copa 2014 no Estádio Beira-Rio, palco da festa em Porto Alegre, vai soar daqui a um ano, em 15 de junho. Mas, até que os craques da bola assumam o espetáculo, é fora das quatro linhas que a partida está rolando.

Anunciada como uma sede do Mundial em 31 de maio de 2009, quatro anos depois, a Capital está no 0 a 0: nenhuma obra concluída.

Em compensação, os custos estão dando goleada. Em dois anos, quase dobraram. Em 2010, foi assinada a Matriz de Responsabilidades - um documento entre o município, o Estado e a União elencando os projetos prioritários. Os dez sob responsabilidade da prefeitura tiveram, em 2011, uma previsão de R$ 474,6 milhões. Hoje, o valor é de R$ 925,8 milhões. Isto é, 95% a mais.

A explicação do secretário

Se forem somadas as outras quatro obras do governo federal ou privadas, o aumento no mesmo período é de 42%: de R$ 1,289 bilhões para R$ 1,838 bilhões.

- O valor inicial foi uma estimativa, se deu em um ambiente de inexistência de projetos. Existe uma questão de fragilidade de planejamento - observa a assessora técnica do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE-RS), Andrea Mallmann Couto.

Questionado se a demora no início da execução alterou preços, o secretário de Gestão, Urbano Schmitt, esclareceu:

- Valores mudaram pelas alterações nos projetos.

A confiança do prefeito

O prefeito, José Fortunati, é otimista:

- Qualquer atraso que aconteça, não me preocupa. O que me preocupa é que as obras saiam do papel.

Ele apontou como dificuldades questões judiciais, a suspeita de um sítio arqueológico na Voluntários da Pátria e até a falta de areia no mercado, que interrompeu os BRTs.

O papel do Tribunal de Contas

Órgão responsável por fiscalizar o andamento dos dez projetos sob execução da prefeitura, o Tribunal de Contas acompanha todo o processo, desde a licitação.

- Fazemos visitas periódicas às obras e análise de documentos - explica Andrea.

Se a equipe constata algum tipo de situação que mereça correção, um relatório é produzido e encaminhado ao conselheiro-relator de cada obra, que vai avaliar a situação e determinar um pedido de providências ao município. Essa ação contínua já gerou, inclusive, economia em algumas obras.

A assessora técnica observa que as obras são custeadas com financiamento obtido junto à União e uma contrapartida do município. Todos os recursos, conforme a Lei de Responsabilidade Fiscal, são aprovados na previsão orçamentária da cidade.

Av. Severo Dullius

O prolongamento da Avenida Severo Dullius, no Bairro São João, parece distante da realidade. A obra aguarda a fase final do licenciamento ambiental para ser executada. Não há nem sinal de máquinas ou homens em atividade ao lado do aeroporto. Apenas na outra ponta, na Rua Dona Alzira, que deve ser o destino final da via, o trabalho anda. Porém, ainda há muitos quilômetros e entraves até que as partes se encontrem.

- Isso iria descongestionar a Sertório, todo mundo que fosse para a Zona Norte viria por aqui. Mas não vejo nem condições - lamenta o motorista Rudinei Moura, 42 anos.

Ele trabalha na região e circula por ali todos os dias. Acredita que a obra seria fundamental para desafogar o trânsito pesado de caminhões.

Rodoviária

Do local de trabalho que ocupa há 40 anos, o comerciante Iraul Vagner Machado Hernandez, 66 anos, consegue observar a evolução das obras no chamado Complexo da Rodoviária. Até onde sua visão alcança, ele já viu surgir os pilares que irão sustentar o viaduto que sairá da Avenida Júlio de Castilhos.

- Daqui, eu acompanho a obra e também os funcionários, que vêm buscar refrigerante - relata Iraul, que tem uma lancheria.

Ele está otimista, apesar de achar que a melhoria deveria ser mais ousada. Ele afirma que a mudança precisaria ter sido executada há dez anos. De qualquer forma, não desanima:

- Sempre que se faz alguma coisa, é bom. Vamos deixar que consumam o dinheiro fazendo obras.

Av. Voluntários da Pátria

A suspeita de um sítio arqueológico na Avenida Voluntários da Pátria travou a duplicação da via. Até que um estudo detalhado seja feito, o comerciante Simão Ronaldo Pretto, 42 anos, vai continuar na expectativa.

Dono de um restaurante na parte da avenida que ainda está em obras, ele viu o movimento cair em 60% desde que valas foram abertas.

- O acesso ficou complicado. Se eu não acreditasse que vai melhorar, já tinha largado - desabafa.

Ele teme que a obra não fique pronta a tempo, em função dos entraves que surgem a todo momento. Acredita que a falta de material, como a areia, e os dias úmidos podem dificultar. Mas Simão não desanima:

- A gente aposta no futuro. Acredito que vá ter um empenho no final.

Terceira Perimetral

Nos 28 anos como comerciante na esquina da Avenida Bento Gonçalves com a Terceira Perimetral, João Anibaldo Soares, 66 anos, viu o volume de trânsito crescer na região e os acidentes se acumularem. Por isso, é com bons olhos que vê a construção de um viaduto na região, uma das cinco obras no corredor da Perimetral.

- É uma esquina muito movimentada, com congestionamentos e acidentes com pedestre. A gente sabia que era necessário, hora ou outra iria sair - relata.

No dia a dia, ele observa que a rotina das pessoas foi alterada, em função das mudanças no trânsito. Barulho, barro e sujeira também se incorporaram ao cotidiano, e ele conta que precisa varrer a frente do seu estabelecimento várias vezes ao dia. Mesmo assim, é otimista:

- É um contratempo temporário para um bem da comunidade no futuro.

Protocolos empatados

*Valores dos projetos calculados em 2011

Sistema de ônibus rápidos (BRT) - R$ 246,7 milhões (era R$ 118 milhões*)

- Contam como quatro obras diferentes na Matriz de Responsabilidades da Copa: uma para cada trecho - Protásio Alves, Bento Gonçalves e João Pessoa - e outra para o sistema de monitoramento. Em estágio avançado nas avenidas Protásio e Bento, os novos corredores de ônibus entraram em marcha lenta na João Pessoa, em função do trânsito. Previsão: maio/2014

Viaduto e complexo da Rodoviária - R$ 31,5 milhões (era R$ 21 milhões*)

- Os pilares do viaduto que sai da Júlio de Castilhos já estão sendo erguidos e os pré-moldados que formarão a estrutura estão em construção. O edital para a construção da estação BRT teve de ser readequado após pedido do TCE. A promessa é de que a estação será licitada em junho, e a obra deve se iniciar em agosto. Previsão: maio/2014

Avenidas Beira-Rio e Padre Cacique - R$ 119,2 milhões (era R$ 82,3 milhões*)

- Já tem dois trechos (de um total de quatro) concluídos. A nova ponte sobre o Arroio Dilúvio deve ser inaugurada entre o final de junho e o início de julho. O viaduto Pinheiro Borda está em construção e tem parte da estrutura pré-moldada sendo montada em separado. O corredor BRT da Avenida Padre Cacique está em obras. Previsão: maio/2014

Prolongamento da Avenida Severo Dullius - R$ 83 milhões (era R$ 24 milhões*)

- Após nova alteração no projeto, a obra está em fase final de licenciamento ambiental. A construção será iniciada pela ponte sobre o arroio, ligando a atual avenida à futura extensão. Previsão: maio/2014

Obras da Terceira Perimetral - R$ 194,1 milhões (era R$ 120,4 milhões*)

- São cinco obras previstas para o traçado da Terceira Perimetral. O viaduto sobre a Avenida Bento Gonçalves se aproxima de 50% de conclusão. Na Anita Garibaldi, a trincheira começou a ser escavada no mês passado. O viaduto da Plínio Brasil Milano teve ordem de início em 25 de maio. O canteiro de obras está sendo instalado e o plano de desvios de trânsito está em fase de conclusão. A prefeitura apresentou uma nova metodologia de escavação ao TCE para vencer o cronograma da trincheira da Cristóvão Colombo. A trincheira da Ceará está em obras. Previsão: maio de 2014

Duplicação da Voluntários da Pátria - R$ 95,3 milhões (era R$ 30 milhões*)

- O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) passou a fazer o acompanhamento arqueológico da obra, para analisar a possível existência de patrimônio arqueológico no traçado do trecho 1, entre o Viaduto da Conceição e a Rua Ramiro Barcelos. O trecho 2, entre a Ramiro e a Avenida Sertório, foi licitado e deve ter ordem de início na segunda quinzena de junho - a licença ambiental ainda não foi concedida. Previsão: maio/2014

Duplicação da Avenida Tronco - R$ 156 milhões (era R$ 78,5 milhões*)

- Em obras em apenas dois pontos. O principal entrave é a demora nas desapropriações e na saída das famílias que vivem sobre o traçado da nova via. Além disso, a obra ainda não tem licença para remoção da maior parte das árvores que estão no traçado. Previsão: maio/2014

Aeromóvel no aeroporto - R$ 37,8 milhões (era R$ 29,8 milhões*)

- A última atualização da Trensurb aponta 94% de conclusão da obra. Previsão: segundo semestre de 2013.

Ampliação do terminal de passageiros do Salgado Filho - R$ 345 milhões (era R$ 335 milhões*)

- A reforma teve o projeto finalizado em maio. A Infraero promete o lançamento do edital para a obra ainda no primeiro semestre, início em setembro e conclusão em maio. Previsão: maio de 2014.

Ampliação da pista do Salgado Filho - R$ 200 milhões (permanece igual)

- O projeto segue em análise pela Infraero e o edital para contratação da obra é esperado para setembro. A obra não ficará pronta até a Copa.

Estádio Beira-Rio - R$ 330 milhões (era R$ 250 milhões*)

- Com 71% de conclusão até o final de maio, a reforma no estádio que receberá cinco jogos da Copa em Porto Alegre segue avançando. A principal frente de trabalho é a instalação da estrutura metálica que compõe a nova cobertura. Previsão: dezembro/2013

Calendário

2009 Início do jogo
Em 31 de maio, Porto Alegre é anunciada como uma das cidades-sede do Mundial de 2014.

2010 18min do 1º tempo
Assinada a Matriz de Responsabilidades, com a definição das obras prioritárias na Capital.

2011 36min do 1º tempo
Surge uma estimativa de investimento das obras sob responsabilidade do município: R$ 474,6 milhões.

2012 9min do 2º tempo
O ano é marcado pela revisão de todos os projetos e o início de obras, públicas ou privada (Beira-Rio).

2013 27min do 2º tempo
As melhorias estão em execução, com valor 95% acima do previsto em 2011: passou a R$ 925,8 milhões. Quatro de cinco anos já se foram e nenhuma obra está concluída. Numa projeção de um jogo de 90 minutos, estamos aos 27min do 2º tempo.

2014 Apito final
Será a hora de a bola, finalmente, rolar. E de vibrar (ou lamentar) pelo resultado do campo de obras.