Para o Carnaval
Mestre-sala corre com pesos na mochila para fortalecer a musculatura e suportar o peso da fantasia
Diário Gaúcho conta histórias de pessoas que se sacrificam para brilhar no desfile do Porto Seco
O desfile de uma escola de samba na avenida é o resultado de um trabalho coletivo que se desenrola durante um ano inteiro. Muitas cabeças se envolvem na criação do enredo, do samba, muitos braços se unem para dar forma, cor e brilho a alegorias e fantasias, para que muitas pernas e pés, em sincronia, mostrem o samba e a paixão pela agremiação em apenas 55 minutos - sempre, é claro, mirando o título.
Mas engana-se quem pensa que há glória sem sacrifício. Para que a escola conte seu enredo e encante o público e os jurados, cada componente renuncia o descanso, tira dinheiro do próprio bolso, e prepara o corpo até a exaustão, para oferecer o que tem de melhor em nome do seu pavilhão.
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O Diário Gaúcho conta a história de personagens de duas escolas de samba do Grupo Especial de Porto Alegre, que se sacrificam à sua maneira para dar vida a este espetáculo popular chamado Carnaval.
Por amor ao pavilhão
Quem vê a leveza da professora de dança Ana Marilda Bellos, 46 anos, e o vigor do segurança João Carlos dos Santos Viana, 44 anos, conhecido no meio carnavalesco como Caio, durante a apresentação deles como o primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira da Império da Zona Norte, não imagina que por trás do harmônico bailado há uma rotina pesada de exercícios físicos para preparar o corpo e enfrentar a passarela do samba.
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Depois de uma parceria bem-sucedida de quase uma década como casal de passistas, há três anos eles decidiram investir numa outra missão: defender o pavilhão da escola e encarar o julgamento dos jurados como um importante quesito.
- A preparação não começa, ela continua - explica Ana Marilda, que tem 36 anos de dedicação ao Carnaval.
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Para o desfile deste ano, os ensaios começaram em abril de 2015 com treinos na academia, aulas de zumba e corrida.
- Se a preparação começar em dezembro, não teria fôlego para o Carnaval. Desde que eu era passista já gostava de correr - explica Caio.
Mas não se trata de uma simples corrida: para fortalecer a musculatura das pernas, ele corre pelo menos três vezes por semana usando coturnos. Caneleiras com pesos completam o sacrifício na hora da dança. Outra tática, sugerida pelo coreógrafo do casal, Marcelo Chocolate, aí para garantir a firmeza para suportar fantasias que pesam entre 30kg e 45kg, é correr levando nas costas uma mochila com pesos.
- É a coluna que leva a roupa. E, para ter resistência, é preciso usar o peso. Se a gente não se prepara, a postura vai arqueando para frente, bate o cansaço e a dor nas costas - observa Ana Marilda, que colocou ímãs de geladeira por dentro da bandeira para ficar mais pesada.
A lista de sacrifícios ainda inclui a renúncia do tempo em família para conciliar os ensaios com os empregos de cada um, além do investimento financeiro, pois Ana Marilda e os pais custeiam a fantasia do casal, que este ano foi confeccionada em São Paulo.
- Meu décimo terceiro foi na fantasia, que é muito cara por causa dos faisões (plumas) - revela.
Caio finaliza:
- Quando toca o samba, a gente esquece de todo o sacrifício, tudo vai compensar.
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De olho na Avenida
- Como são quatro módulos julgadores, o casal precisa apresentar a coreografia com passos obrigatórios: apresentação da bandeira, cortejo do mestre-sala, porta-bandeira girar para os dois lados e a dança livre do mestre-sala (riscados no chão).
- No caso da Império, a coreografia tem 1 minuto e 26 segundos nos quais a escola fica parada na Avenida para a apresentação do casal diante de cada jurado.
- A bandeira não pode enrolar e nem bater no mestre-sala (apenas encostar na mão). O vento é o principal complicador durante a apresentação.
Dedicação exclusiva
É para ver uma Acadêmicos de Gravataí luxuosa na passarela Carlos Alberto Barcellos Roxo, que o professor Wagner Augusto Silveira, 41 anos, da comissão de Carnaval da escola, não hesitou em sacrificar o próprio orçamento doméstico e transferir seu endereço para o barracão da escola no Porto Seco.
- Apertar a vida financeira acontece, mas vale a pena pela escola, pelo perfil. A execução do Carnaval vai ter material considerado de luxo e somos pessoas que colaboram para que isso aconteça - explica Wagner, lembrando que a crise aumentou ainda mais o aperto, pois as verbas vieram pingadas.
Rafael Halfen, 17 anos, que é oficineiro do programa Mais Educação, e a professora Mariany Souza Barbosa, 33 anos, também fazem parte do grupo que vem se dedicando exclusivamente à escola de Gravataí. Diferente de alguns trabalhadores de outras escolas, que são remunerados, com o trio o trabalho é voluntário. As fantasias de destaques também foram custeadas por eles.
- É tudo por amor à escola. Amanhã (a escola fecha a primeira noite de desfiles, a partir das 4h55min) tudo vai valer a pena e a emoção é muito maior por conta disso (envolvimento com a confecção dos carros e fantasias) - afirma Rafael, que desfilará no chão, enquanto Mariany e Wagner sairão em carros.
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De olho na Avenida
- A escola faz mistério sobre os carros-alegóricos, não permitiu fotos em seu barracão, mas promete impactar na Avenida com mostrando as belezas da Reserva Ecológica do Taim. A comissão de frente é um dos segredos.
- Wagner fez toda a pesquisa e escreveu o enredo. Formado em Filosofia, Teologia e Relações Internacionais, ele terá um enredo de sua autoria na escola paulista Barroca Zona Sul.
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Foto: Luiz Vaz/Agência RBS
Foto: Luiz Vaz/Agência RBS