Massacre em Orlando
Homofobia motiva denúncias diárias nos Estados Unidos e no Brasil
Machismo e fanatismo religioso estimulam violência contra homossexuais
O massacre de 49 pessoas em uma boate nos Estados Unidos chama a atenção para um cenário de violência contra homossexuais que, embora poucas vezes ganhe manchetes, se repete todos os dias em países como EUA e Brasil.
As origens do ódio são complexas e, na avaliação de especialistas, combinam fatores como repressão sexual, machismo e fanatismo religioso. Como resultado desse caldeirão de intolerância, o FBI registra uma média diária de três crimes com motivação sexual em território americano – mesmo número de denúncias de violência encaminhadas todos os dias ao governo federal brasileiro por meio do serviço Disque 100.
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Os episódios de agressão costumam mesclar histórias pessoais conturbadas a discursos ou ambientes que legitimam a violência, como, por exemplo, interpretações fundamentalistas da religião. O psicanalista Mario Corso sustenta que as explosões de raiva contra homossexuais, muitas vezes, envolvem pessoas inseguras de sua própria sexualidade.
– Pessoas com uma homossexualidade ultrarreprimida, por exemplo, precisam matá-la de alguma forma. Podem acabar matando outras pessoas – analisa Corso.
A violência tende a se intensificar quando o autor assume discursos que vilanizam os gays como "pecadores", "imorais" ou "depravados" a fim de justificá-la. O Estado Islâmico, que reivindicou participação no atentado americano, mata homossexuais nos territórios que ocupa.
– O preconceito é sempre aprendido, não é uma coisa natural. É aprendido em casa, nos jornais, na TV, assim como na religião. Em uma sociedade mais respeitosa com a diversidade, é mais difícil ocorrer esse tipo de coisa – afirma o doutor em sociologia e professor de Psicologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Henrique Nardi.
Nos últimos anos, o ódio sexual também se abasteceu de sucessivas conquistas do movimento gay – em países como Estados Unidos ou Brasil, a Justiça reconheceu o direito de homossexuais se casarem.
– Antigamente, se considerava normal os homossexuais não terem direitos ou terem de ficar escondidos. O fato de terem somado várias conquistas e serem mais visíveis faz com que algumas pessoas exteriorizem a violência como uma forma de reação – interpreta Nardi.
O atirador de Orlando, Omar Mateen, teria se irritado ao ver homens se beijando em público semanas antes de praticar o atentado. Pesquisas mostram que a intolerância é comum também no Brasil. Um levantamento realizado com 8,1 mil alunos da UFRGS em Porto Alegre, por exemplo, revelou no ano passado que 87% dos entrevistados apresentavam algum grau de preconceito de gênero. Esse índice era maior entre homens, praticantes de alguma religião e provenientes de cidades com menos de 100 mil habitantes. Um dos autores do estudo, Angelo Brandelli Costa lembra que o acesso fácil a armamento pesado é um fator agravante em regiões como os EUA. Mas ele acredita ser possível estimular a tolerância:
– Diversas soluções se mostraram úteis. Educação e contato, ou seja, viabilização e inclusão da diversidade, foram aquelas que se mostraram mais eficazes. Pautar a diversidade sexual e de gênero como variações da normalidade nas escolas e universidades é fundamental.
OS CRIMES DE ÓDIO NOS EUA
Causas mais comuns entre 5,4 mil delitos motivados por intolerância nos Estados Unidos:
Raça 47%
Orientação sexual 18,6%
Religião 18,6%
Etnia 11,9%
Identidade de gênero 1,8%
Deficiência 1,5%
Gênero 0,6%
– Em 2014, o FBI registrou 1.178 crimes motivados pela orientação sexual da vítima nos Estados Unidos
Fonte: FBI
DENÚNCIAS MAIS COMUNS NO BRASIL
Queixas mais comuns de violência contra gays*:
Discriminação 42,3%
Violência psicológica 39,5%
Violência física 17,3%
Negligência 4,1%
Violência sexual 3,1%
Outros 2,2%
– No Brasil, a Secretaria de Direitos Humanos recebeu 1.201 denúncias de violência contra gays em 2015.
*A soma supera os 100% porque uma denúncia pode envolver mais de um tipo de violência.
Fonte: Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República