Campanha da Educação
Economia, dez. Educação, zero.
O Brasil é a sexta maior economia do planeta, mas amarga a 88ª posição no ranking da aprendizagem
Como uma nação como o Brasil, que ostenta o sexto lugar na lista das maiores economias do planeta, pode amargar a 88ª posição no ranking mundial de aprendizagem, publicado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) em 2011?
A partir da nova campanha institucional do Grupo RBS, lançada na terça-feira, sob o slogan A Educação Precisa de Respostas, o Diário Gaúcho buscou especialistas que expliquem a desigualdade e apontem saídas que nos levem a alcançar um ensino de qualidade.
Esta é a primeira de seis questões elaboradas por uma equipe a partir das metas de qualidade definidas pela ONG Todos pela Educação, que vão nortear a campanha.
Emprego não garante educação
Hoje, nós contamos a história de duas famílias da Capital. Os pais estão empregados, fazendo a engrenagem da economia girar, mas seu esforço não tem o mesmo reflexo na educação. Sem condições de pagar uma escola particular ou creche, não têm onde deixar os filhos pequenos no contraturno escolar.
A solução é deixá-los sob a supervisão dos irmãos mais velhos. Assim, as crianças, que poderiam desfrutar de turno integral, participando de projetos esportivos, culturais, desenvolvendo outras capacidades depois das aulas normais, ficam apenas no básico, sem ter acesso a novas experiências.
Apesar das dificuldades, os pais se esforçam para que todos se saiam bem nos estudos.
- Tem que estudar porque a nota vale muito - afirma a faxineira Fabiane Cardoso Gomes, 34 anos, mãe de três filhos.
O Todos Pela Educação é um movimento da sociedade civil que tem como objetivo contribuir para que o Brasil garanta a todas as crianças e jovens o direito à educação básica de qualidade.
"Não posso ficar parada"
Assim como na adolescência da faxineira Fabiane Cardoso Gomes, 34 anos, - a mais velha entre sete irmãos -, o filho mais velho dela, Benhur, 13 anos, é o responsável pelos dois manos menores quando os pais não estão.
- Benhur é o meu braço direito - conta Fabiane.
Na ausência dela e do marido, o servente de obras Anderson Nascimento de Oliveira, 32 anos, Benhur toma conta de Anderson Júnior, oito anos, e Kayky, seis anos. Fabiane deu um celular para os filhos.
- Fico preocupada com eles. Não posso ficar parada. Já perdi várias oportunidades de trabalho porque não tinha com quem deixá-los - diz a mãe.
Benhur está na sexta série e, quando vai para a aula de manhã, leva Kayky, que fica o dia todo na Escola Municipal América. Depois do almoço, deixa Anderson Júnior na aula da segunda série. Os pais dividem a tarefa de buscar boletins e ir a reuniões da escola. Os guris se ajudam nos temas de casa.
De acordo com o Sinduscon-RS, o setor da construção civil responde por 4% a 5% do PIB nacional. No país, dois em cada dez trabalhadores com carteira assinada atuam na construção civil. Considerando os informais, o número chega a quatro.
"Eu preciso trabalhar para trazer as coisas para eles e eles se cuidam"
Quando sai da Restinga para trabalhar, a auxiliar de limpeza Elisabete Santos de Souza, 35 anos, fica com o coração apertado. Ela é mãe de cinco filhos e, quando não estão na Escola Municipal Nossa Senhora do Carmo, uns cuidam dos outros.
- Fico num impasse. Quando tenho que sair e não tenho quem fique com eles, intercalo: ou fica a Kymberlyn (14 anos), ou a Monique (12 anos), que são as mais velhas. Eu preciso trabalhar para trazer as coisas para eles e eles têm de cuidar uns dos outros - conta.
Quando isso acontece, uma das irmãs falta aula no turno da manhã para cuidar de Alessandro, dez anos, que estuda à tarde, Lauanda, quatro anos, e Yago, três anos, que não estão na educação infantil.
- Nunca consegui uma vaga em creche (para os pequenos). Seria maravilhoso, uma bênção se fossem para escolinha porque iam brincar e os irmãos poderiam fazer as atividades deles -- diz a mãe.
Controle por telefone
À distância, Elisabete monitora os filhos. Até reprimendas são dadas por telefone. A mãe deixa o café e o almoço encaminhados, e às vezes as mais velhas preparam arroz ou feijão. Depois, a criançada brinca e faz os temas. Em alguns turnos, Monique e Alessandro fazem atividades no Instituto Dunga.
Quando consegue tempo, a mãe, que cursou até a quinta série, dá uma olhada nos cadernos:
- Hoje, a prioridade deles é estudar para ser alguém, ter um emprego bom.
Em 2009, o setor terciário correspondeu a 68,5% do PIB (a soma de tudo o que o país produz) brasileiro e por mais de 75% dos empregos formais, segundo o IBGE. De acordo com o números da Associação Brasileira do Mercado de Limpeza Profissional (Abralimp), no ano de 2010, o setor movimentou entre R$ 14 bilhões e R$ 15,2 bilhões.
Fala, especialista!
* Euclides Redin, doutor em Educação e professor da Unisinos
O professor acredita que, para reverter a posição negativa do Brasil, é preciso investimento maior em infraestrutura (escolas completas, bem construídas e bem equipadas).
- Os espaços também educam. É preciso que (a escola) seja um espaço aberto, grande, bem ventilado. Isso ajuda a formar a visão de mundo.
Outro fator importante é a formação dos professores:
- Enquanto o professor não receber incentivo da sociedade, não vai mudar muita coisa.
Euclides destaca, também, a importância da família neste processo, já que o aprendizado não se restringe apenas à escola.
- O aluno precisa de outras experiências. A família é importante quando cria um espaço de aprendizado e estímulo.
* José Paulo da Rosa, doutor em Educação e diretor regional do Senac
É preciso que a educação seja eleita como prioridade: melhorando a aplicação dos recursos (hoje o Brasil destina 5,1% do PIB para educação. O Plano Nacional de Educação estabelece 10%), contando com professores qualificados, motivados, oferecendo escola em tempo integral, com infraestrutura boa e gestão modelo de excelência.
- Priorizar é fazer escolhas e o Brasil precisa escolher a educação como prioridade.
* Helena Sporleder Côrtes, professora da faculdade de Educação da Puc
- É preciso aumentar os recursos destinados à educação, mas também controlar e fiscalizar o uso do recurso.
- Antes, faltavam escolas. Hoje, estamos com as portas abertas, mas temos uma escola de má qualidade, sem estrutura física nem humana. Há falta capacitação para os gestores e falta de uma família que cobre - observa.
Segundo a professora, a educação formal vem da escola, mas há outras fontes de conhecimento: os meios de comunicação, a igreja, família, as manifestações culturais.