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Retratos da Fama

Ary Fontoura comemora 60 anos de carreira em 2013

Em entrevista ao Diário Gaúcho, o ator fala sobre os papéis mais marcantes, a trajetória de vida e seus planos para o futuro

14/10/2012 - 14h02min

Atualizada em: 14/10/2012 - 14h02min


Cristiane Bazilio
Cristiane Bazilio
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Em 2013, Ary Fontoura completará 60 anos de carreira e 80 de vida. Com uma das trajetórias artísticas mais brilhantes do país, transitou com magnitude pela televisão, teatro, cinema e até pela música. Não à toa, se diz um vitorioso. Encarou de frente as dificuldades de uma juventude humilde e a contrariedade dos pais para seguir a carreira com a qual sonhava. Hoje, orgulha-se do legado que admite deixar para a arte brasileira. Na reta final de Gabriela, em que interpreta o coronel Coriolano (o ator já gravou as suas últimas cenas na novela, que termina no próximo dia 26), Diário Gaúcho antecipa-se às comemorações do ano que vem e presta uma homenagem a este curitibano que mora há 49 anos no Rio de Janeiro, de onde concedeu esta entrevista, por telefone. O eterno Nonô Correia, de Amor Com Amor se Paga (1984), enumera os seus papéis mais marcantes, fala sobre o seu futuro na televisão e revela que nunca se sentiu só, apesar de jamais ter se casado ou ter tido filhos.

Diário Gaúcho - Que balanço o senhor faz da sua trajetória?

Ary Fontoura - Observo as coisas que fiz e sei que é uma bagagem muito extensa. Teve muita coisa errada e muita coisa certa neste percurso. Sessenta anos tem um significado grande. Sou um privilegiado. Poucas pessoas conseguem fazer o que gostam permanentemente. É muito difícil, neste país, ter uma carreira toda calcada neste trabalho. Há muita procura, é preciso ter sorte e, desculpe a falta de modéstia, mas talento (risos)! Sou uma pessoa vitoriosa: faço o que eu quero, trabalhando, suando. Olho para tudo o que tenho e me orgulho de ter adquirido de uma forma profundamente honesta, com dignidade.

Diário - O que o senhor aponta como os seus principais acertos?

Ary - Acabei de completar 48 novelas na Globo. Neste trajeto, teve coisas que me agradaram, que pude fazer com mais propriedade. Se eu tivesse que mudar de nome, seria Nonô Correia, de Amor Com Amor se Paga. Foi o papel mais popular que fiz na tevê. Teve o Silveirinha, de A Favorita (2008), para o qual fui muito bem escalado pelo (autor) João Emanuel Carneiro. O coronel Artur da Tapitanga, de Tieta (1989), foi um papel muito forte. E guardo muitas lembranças do (autor) Dias Gomes. Eu era o ator preferido dele. Fiz o lobisomem de Saramandaia (1976) e um dos trabalhos de que mais gosto, o professor de botânica (Baltazar Camará) de O Espigão (1974). E um grande acerto foi atuar durante três anos no Sítio do Pica-Pau Amarelo, voltado para as crianças, contribuindo para a formação de plateias.

Diário - O senhor participou da primeira versão de Gabriela, em 1975, como o doutor Pelópidas, papel menos significativo do que o seu Coriolano. Sente a diferença de popularidade?

Ary - Hoje, a repercussão é muito maior. As pessoas se divertem com o Coriolano. As mulheres se insinuam demais para serem as minhas "teúdas e manteúdas" (referindo-se à personagem Glória, mulher dele na novela, interpretada pela atriz Suzana Pires)! E assim vou tirando fotografias nos aeroportos, sendo reconhecido por todo mundo. Me divirto demais. Fazem muita brincadeira com a macheza do Coriolano, e como eu sou muito bem-humorado, sempre faço render.

Diário - Nestes quase 60 anos de carreira, o que mudou no modo de fazer televisão?

Ary - Basicamente, a tecnologia aprimoradíssima. E também a força das redes sociais. O público quebra uma parede da tela e participa mais da televisão, não só como espectador inerte mas opinando, inventado caminhos para a história.

Diário - O senhor faz uso das tecnologias?

Ary - A gente é obrigado a aprender a cada dia com uma série de coisas que estão surgindo. Eu procuro ter domínio de tudo isso, mas não uso efetivamente. Só uso com assiduidade a internet. Não tenho twitter nem facebook. O meu blog (aryfontoura.com.br) é comandando pela minha assessoria, mas fico a par de tudo. Gosto de tudo que é moderno. Mas ainda me comunico da forma tradicional (risos).

Diário - O senhor preocupa-se com o futuro dos artistas da sua geração na televisão?

Ary - Minha profissão é muito generosa. Se eu quisesse entrar agora no ramo, eu poderia. Claro que não faria um galã, mas eu poderia fazer o vovô, um tio, um pai (risos). Mas reconheço que a televisão tem uma grande atração pela audiência e quer chamar a atenção dos mais jovens, tanto para assistirem quanto para estarem dentro dela. A renovação é uma necessidade. Têm que aparecer novos valores e novas pessoas, mas não me sinto ameaçado. Já fiz tanto, que está na hora de apreciar e aplaudir os colegas que chegam, fazendo o que for possível dentro do que me for permitido.

Diário - O senhor é filho de um professor e de uma dona de casa. De onde veio esta veia para as artes?

Ary - Éramos quatro filhos, perdi uma irmã recentemente. Desde muito pequeno, sempre gostei de interpretar. Em Curitiba, aos 20 anos, comecei a fazer teatro. Mas a minha família impunha várias restrições, e eu era obrigado a cumprir. Por isso, cursei Direito, embora eu não quisesse isto. Resultado: não concluí o curso. Abandonei no quarto ano. Eu já estava mais consciente de mim, e a minha vontade era ir para um centro maior, como Rio ou São Paulo, onde eu pudesse desenvolver esta minha capacidade. Eu era autodidata, mas não me bastava. Sabia das minhas limitações e queria aperfeiçoar. Foi quando eu disse: "Chega!". Fiz tudo o que a minha família queria até então e pensei: "Basta de sacrifício! Vou embora".

Diário - E como manteve-se?

Ary - Eu era funcionário público e ganhava um dinheirinho. Pegava outros trabalhos, bicos, o que ia aparecendo para sobreviver. Fazia de tudo um pouco. Comecei como cantor em churrascarias, bordéis e restaurantes. Eu cantava músicas da moda, boleros, Elis Regina, Lupicinio Rodrigues. Basicamente, músicas de fossa, era o que pediam (risos)! Até gravei um LP, o único da minha carreira (risos)! Passei um ano viajando com orquestra, fazendo bailes no Interior do Paraná e de Santa Catarina. Tive uma vida difícil, que poderia ter sido facilitada se tivesse nascido em berço de ouro, se alguém da família me protegesse, me incentivasse. Mas não guardo mágoa. Ao contrário, ter nascido em um berço pobre foi o que me deu a visão de que a vida é muito mais simples do que se supõe e de que a gente se queixa demais.

Diário - O senhor nunca se casou ou teve filhos?

Ary - Não, nunca me casei. Verdadeiramente, da forma tradicional, com a minha mulher de véu e grinalda, nunca. Mas já tive muitos problemas na minha vida. Eu classifico como problemas todos eles (os relacionamentos). Nunca fui a favor do casamento.

Diário - Mas o senhor foi muito namorador?

Ary - Fui e ainda sou (risos)! Tem um restinho de vida aqui que ainda dá para funcionar (risos)...

Diário - E nunca se sentiu solitário?

Ary - Moro com muita gente na minha casa. Só empregados, tenho quatro! Mas ainda que eu não morasse com ninguém, não me sentiria solitário, absolutamente. A vida é um leque, você tem que se abanar. Eu aprendi a extrair da experiência que é viver o melhor possível. A vida é um banquete. A maioria morre de fome. Eu, não!

Diário - E como o senhor passa o seu tempo quando não está gravando?

Ary - Tenho mais de 5 mil títulos de filmes em casa. Uma coleção de cinema com tudo que eu vi até hoje, desde os dez anos de idade. Tem muitas falhas, porque muitos títulos ainda não foram comercializados, mas estou sempre comprando, esse é meu hobby. Gosto de qualquer tipo de música, de balé, de arte, de ópera, de tudo. Tocou a minha sensibilidade, eu tô presente (risos). Faço ginástica, caminho bastante, levanto uns pesinhos para deixar a pele um pouquinho mais rígida. Massagear o ego é bom, às vezes (risos).

Diário - Qual a sua receita para manter o fôlego à porta dos 80 anos?

Ary - Ter uma cabeça boa, muito humor, ver a vida de uma maneira otimista, gerar energias positivas pra você, não ficar se lamentando ou martirizando com o que passou. Quem anda pra trás é caranguejo. O futuro não adianta premeditar, porque você pode ser surpreendido. Viva o dia de hoje intensamente.

Marcas no cinema e no teatro

Foram quase 40 peças e mais de 20 filmes estrelados pelo ator. Na telona, destacam-se as comédias A Guerra Dos Rocha (2008), na qual deu vida a uma senhora pra lá de maluca, e Se Eu Fosse Você 1 e 2.

Nos palcos, além de atuar, Ary dirigiu diversos espetáculos, como Corra Que Papai Vem Aí e Marido de Mulher Feia Tem Raiva de Feriado.

Personagens inesquecíveis nas novelas

- 1978: Dancin' Days - Ubirajara Martins Franco

- 1983: Guerra Dos Sexos - Dino

- 1985: Roque Santeiro - Prefeito Florindo Abelha, o Seu Flô

- 1988: Bebê a Bordo - Nero Petraglia

- 1989: Tieta - Coronel Artur da Tapitanga

- 1990: Araponga - General Perácio

- 2003: Chocolate Com Pimenta - Ludovico Canto e Melo

- 2007: Sete Pecados - Romeu

- 2011: Morde & Assopra - prefeito Isaías


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