Notícias



Educação aos pedaços

Escolas da Capital abrem o ano letivo com problemas de estrutura

Na volta às aulas, alunos encontraram espaços improvisados, salas diminutas e obras inacabadas ou ainda no papel

05/03/2013 - 08h22min

Atualizada em: 05/03/2013 - 08h22min


Além do contato com livros e da convivência com professores e colegas, o ambiente no qual os estudantes vivem experiências relacionadas à aprendizagem também educa. Ou deseduca, como é o caso das três escolas desta reportagem, todas estaduais, em Porto Alegre.


Pior: o drama é comum para estudantes de 117 escolas estaduais da Capital, que aguardam obras emergenciais em seus colégios. Nesta volta às aulas, encontraram espaços improvisados, salas diminutas e obras inacabadas ou ainda no papel.


O Diário Gaúcho voltou a três escolas que foram assunto no ano passado e mostra o esforço das direções para solucionar a falta de espaço e motivar os alunos a iniciar mais um ano em condições precárias. Tudo estoura nos estudantes, como Cristiano Soares da Luz, 15 anos. Ele estava na segunda série quando viu um prédio começar a ser construído na sua escola:


- Já estou na sétima. Queria aproveitar as salas, mas...


ALUNOS INTIMAM O GOVERNO POR MELHORIAS


O cartaz pendurado na fachada da Escola Estadual de Ensino Fundamental Tancredo Neves, no Bairro Aberta dos Morros, Zona Sul da Capital, escancara um clamor dos  alunos sobre a demora na construção do prédio que dará fim às instalações improvisadas. Ao lado de um trabalho em que professores pediam "faça o seu melhor", as crianças da quinta série emendaram: "Esperamos que o governo também faça o seu melhor".


E não é para menos, a intimação. Na volta às aulas, eles encontraram um pavilhão com quatro salas de aula interditado e também o acesso à quadra de esportes proibido.


- Veio uma comissão e interditou o prédio, mas não há nada no papel. Se a interdição é formal, a obra entra como emergencial - conta a professora Ana Cristina Nardi, mãe de aluna e presidente do CPM da escola.


Educação Física sem pátio ou ginásio


Para receber os alunos, o refeitório virou sala dos professores, e a merenda está sendo consumida nas salas. O local dos professores, por sua vez, está ocupado por alunos, e o espaço de duas salas de aula tem divisórias para atendimento a três turmas. A biblioteca também abriga estudantes, e os livros estão nas salas ou guardados, assim como os computadores, encaixotados por falta de espaço. A Educação Física se restringirá a brincadeiras num pequeno pátio porque não há acesso às quadras.


- Não estamos recebendo mais alunos. Tínhamos uma demanda de 500 e, agora, atendemos, no máximo, 400 - diz a diretora, Rita Maria Bonapace.


Os prédios em uso também apresentam desgastes, como buracos no forro e cupins - já os rombos no telhado foram solucionados pelas telhas do prédio interditado. Segundo a diretora, o projeto da nova escola, com três pavimentos, está pronto. 


Professora lamenta: "Estamos amontoados"


Agora, a comunidade escolar espera pela execução que, segundo ela, pode ocorrer entre abril e junho.  


- Está caindo, mas a gente faz o que pode. Digo para os alunos: estamos amontoados, está ruim de se mexer, mas depois virá o nosso prêmio. Em agosto, terei tempo para me aposentar, mas quero a escola pronta antes - planeja Ana.


O que diz o governo


O projeto para construção de uma nova escola está pronto, orçado em R$ 2 milhões, mas está em análise se a obra fará parte da lista de 524 escolas contempladas pelo Plano de Necessidades de Obras (PNO) ou se será tocada independente. Se a Secretaria de Obras Públicas der parecer favorável ao início da obra fora do PNO, ela deverá ser feita imediatamente e, após, poderá ser complementada por outros itens que compõem o plano.


UM PATRIMÔNIO... AO APERTO


De um lado, uma sala de aula para apenas 15 alunos. Depois de uma divisória, funciona o Serviço de Orientação Educacional (Soe).


- A sala ficou muito apertada, é difícil de se mover - comenta Vitor De Bem, 12 anos, da sétima série.


Esse é apenas um dos transtornos que professores e 350 alunos da Escola Estadual Professor Olintho de Oliveira, no Bairro Cidade Baixa, vêm passando neste início de ano letivo, desde a interdição do prédio administrativo, em 2012.


O imóvel de 1919, conhecido como Casarão, é patrimônio cultural da cidade, mas fissuras e rachaduras nas paredes tornaram perigoso o uso do espaço, que abrigava biblioteca, sala de audiovisual e arquivo morto (onde ficam guardados documentos dos servidores e o histórico escolar dos estudantes).


Documentos continuam em ambiente lacrado


Os tapumes que cercam o imóvel interditado já estão ficando danificados pelo tempo. Os módulos que serviriam para a biblioteca, depósito e secretaria ainda não chegaram à escola.


- Tivemos que unir duas turmas de primeiro ano. A secretaria e a sala dos professores também estão juntas - conta a diretora, Clarisse Marroni Bello Tarantino.


Segundo ela, quem precisa da documentação que está no Casarão (documentos desde 1960) ou livros que estão na biblioteca não consegue entrar. A direção espera a formalização das orientações de segurança para acessar o local. 


O que diz o governo


O prédio interditado é histórico e, por isso, demanda tratamento especial. A obra é emergencial e, depois de fazer o laudo estrutural, a Secretaria de Obras Públicas está trabalhando no projeto e no orçamento.


Quanto aos módulos, a secretaria informa que há uma concorrência pública para selecionar a empresa que fornecerá esse tipo de sala. A expectativa é que cheguem à escola ainda neste ano. O diretor administrativo da Seduc, Claudio Sommacal, afirma não ter sido informado sobre a necessidade de acesso ao prédio interditado e promete inteirar-se da situação para tomar alguma providência.


NOVELA QUE SE ARRASTA HÁ CINCO ANOS


Os quase mil alunos da Escola Estadual de EnsinoFundamental Aparício Borges, no Bairro Partenon, encontraram nesta volta às aulas o cenário que se repete desde 2009: o esqueleto do prédio anexo inacabado. Há alunos sendo atendidos num depósito, em condições precárias. A sala de informática foi desativada para acomodar turmas.


A obra iniciada em abril de 2008 foi custeada com recursos do governo do Japão (R$ 180 mil) e teve de ser interrompida porque o dinheiro não foi suficiente para a construção de seis salas. De acordo com a diretora, Sílvia Regina Pinheiro Neis, o Estado complementaria o valor, o que não ocorreu.


- Quando começaram a fazer esse prédio, eu estava na segunda série. Agora, estou na sétima. Queria aproveitar as salas novas, mas estou quase saindo - lamenta Cristiano Soares da Luz, 15 anos.


Vistorias apontaram que, mesmo feito com material de má qualidade, o prédio teria condições de ser concluído. Foi elaborado um projeto, mas depois de realizada a licitação, a vencedora não quis assinar o contrato. Com isso, o caso voltou à estaca zero.


- Eu queria que essa obra seguisse em frente porque faz falta aos nossos filhos. Eles estão se criando aqui, esta é a casa deles - ressalta a cozinheira Maria Alice Vicente Moreira, avó de Maria Rita, cinco anos.


O que diz o governo


Depois que a primeira empresa vencedora da licitação rescindiu o contrato em 2012, um outro processo foi aberto e uma nova empresa escolhida.


Como o valor passou de R$ 190 mil para R$ 1 milhão (por conta da deterioração da obra), o processo foi encaminhado à Procuradoria Geral do Estado (PGE), que avalia se é conveniente terminar a obra ou demolir a construção. Depois da resposta, poderá ter andamento o processo.


"São improvisações temporárias"


O diretor administrativo da Seduc, Claudio Sommacal, admite o prejuízo aos alunos, que precisam estudar em locais precários, improvisados, por conta de obras pelas quais as escolas deverão passar: 


- Entendemos que a qualidade do ensino fica prejudicada por ambientes inadequados, mas são improvisações temporárias, um transtorno que, infelizmente, vai durar o tempo que vamos fazer as obras. 


Sobre as três escolas citadas na reportagem, Claudio não dá prazos. 


CRONOGRAMA


- Pelo menos 40% dos 2,5 mil colégios de ensino fundamental e médio do Estado, um total de 1.028 escolas, precisam de algum tipo de obra. 


- O Plano de Necessidade de Obras (PNO) está com atraso de pelo menos um ano. 


- São 524 escolas com projetos em fase de licitação. A previsão do início das obras é dia 25 de outubro. Se isso se confirmar, as melhorias serão concluídas somente em 2015.


- O investimento é de cerca de R$ 1 bilhão. 


- A burocracia de um obra passa por cinco secretarias: a de Educação, que constata o problema, repassa para a de Obras Públicas. Depois vem a Administração, que realiza as licitações, posteriormente a da Fazenda, que libera o recurso e, por fim, o Planejamento, que verifica se a obra está dentro do regramento normal. 


Informações: secretário estadual da Educação, José Clóvis de Azevedo


Fala, especialista!


Doutor em Educação e professor da Unisinos, Euclides Redin destaca a importância do ambiente escolar. É nele que o aluno constrói a perspectiva de vida:


- A educação se faz com infraestrutura digna, pessoal preparado, motivado e com as crianças, que são o futuro. A escola precisa ter ambiente bonito, artístico,

seguro, onde os alunos queiram ir por prazer.


Segundo o educador, a melhoria depende de decisão política, que coloque a criança como prioridade do Estado.


Chiadeira online (facebook.com/diariogaucho)


"Na Escola Municipal Erna Wurth (Canoas) há total falta de estrutura: crianças de todas as séries misturadas, poucos professores."

Raquel Ferreira


"A Escola Estadual Diogo Penha, de Balneário Pinhal, está com problemas na estrutura e em reforma." 

Gabriela Oliveira


"Na Escola Estadual Mariz e Barros, em Porto Alegre, fomos recebidos sem luz e com salas cheias de tralhas." 

Taiana Rodrigues


MAIS SOBRE

Últimas Notícias