Suspeitas
Delegado interrogará PMs que participaram de ação de cárcere privado em Sapucaia do Sul
Delegado que investiga o homicídio seguido de suicídio, ocorrido na quarta-feira, fez série de perguntas aos peritos que analisam o caso. Ação da BM é questionada
O titular da 2ª DP de Sapucaia, delegado Eduardo Moraes, pediu ontem ao Hospital Getúlio Vargas mais informações sobre o homicídio seguido de suicídio que chocou o Estado na manhã de quarta-feira. O policial civil tem dúvidas em relação ao estado e as condições em que a dona de casa Rosimeri da Silva Anório, 51 anos, e o ex-companheiro, Jerri Eder Aguiar de Oliveira, 41 anos, chegaram à instituição. Ele também encaminhou perguntas ao IGP sobre a cena do crime e sobre o exame dos corpos. Por volta das 7h, o Gate invadiu a casa da Rua São Caetano após mais de 21 horas de cárcere privado.
Rosimeri, resgatada inconsciente, foi reanimada por socorristas do Samu, mas não resistiu a uma nova parada cardíaca e faleceu às 9h18min de ontem. Desde que foi internada, ela respirava apenas com a ajuda de aparelhos.
Ontem à tarde, legistas do DML de Canoas examinaram o corpo de Rosimeri. O resultado do exame, que tenta esclarecer o que aconteceu com a mulher durante o tempo em que ficou refém, será enviado para a 2ª DP. O delegado pediu aos legistas mais informações sobre o tipo de agressões que ela sofreu e sobre o modo como foi estrangulada por Jerri. Ele quer saber ainda se ela sofreu abusos durante o período.
Responsável pela equipe médica do hospital, Marcelo Saldanha afirmou que a paciente já chegou em coma. Segundo o médico, Rosimeri teve lesão cerebral grave devido à falta de oxigenação no cérebro.
- Tomamos todas as medidas que tinham de ser tomadas para mantê-la viva e evitar sequelas, mas ela teve um comprometimento neurológico importante e faleceu- resumiu.
O diretor clínico não confirmou se Rosimeri sofreu violência sexual. Ele disse que, em respeito ao sigilo médico e à dor dos familiares, prefere não se manifestar:
- Não damos este tipo de informação. O filho dela (Marcos) sabe tudo o que aconteceu e pode informar se houve ou não o estupro. Isso eu não posso dizer, só o filho pode.
Parente confirma agressão sexual
A nora de Rosimeri, Helena Silveira dos Santos, 24 anos, foi enfática:
- A médica que atendeu minha sogra no hospital disse que ela tinha sido violentada, e que encontrou sangue no meio das pernas. Ela tinha marca de fio no pescoço e manchas roxas numa das pernas.
Helena disse que o marido está abalado. Filho mais velho de Rosimeri, Marcos Juliano da Cunha, 29 anos, foi até o DML de Canoas para liberar o corpo da mãe. O velório e sepultamento serão realizados hoje no Cemitério Pio XII, em Sapucaia do Sul.
Versão do estrangulamento gera dúvida
O delegado Eduardo vai ouvir os PMs que participaram das negociações e os socorristas do Samu. A ideia é montar o cenário encontrado pelo Gate, que invadiu a casa da Rua São Caetano, na Vila Vargas, após o negociador não conseguir mais contato telefônico ou pessoal com Jerri.
- O perito disse que as marcas no corpo de Jerri não condizem exatamente com a cena que a Brigada descreveu - disse Eduardo.
Os PMs, conforme o delegado, relataram ter achado Jerri enforcado na sala. O fio preso em seu pescoço estava atado a uma viga, e ele não encostava os pés no chão. Mas, segundo a análise do corpo, a rigidez do fio e a suspensão total provocariam uma marca contínua e profunda no pescoço, o que não havia.
E causaria uma morte rápida, mas Jerri foi retirado com vida pelo Samu e morreu em atendimento, conforme informação da Brigada na quarta.
- Com depoimentos de todos, vamos ter certeza da cena que os PMs encontraram - afirmou o delegado.
Oficial defende a ação do Gate
Subcomandante geral da Brigada, o coronel Silanus Melo falou ontem sobre a ação feita pelo Gate em Sapucaia.
Diário Gaúcho - Por que a energia da casa não foi cortada?
Coronel Silanus Melo - Isso é procedimento técnico. O negociador é quem estabelece o que deve ser feito.
DG - Por que a BM não tomou a casa quando ele entregou o bebê, terça?
Coronel - Eu não posso te responder em que situação foi entregue o bebê porque cheguei lá somente às 19h30min, e isso já tinha ocorrido. Pelo que me consta, ele abriu a porta, botou o bebê no carrinho e o empurrou para fora.
DG - O tempo entre o último contato com o negociador e a invasão do Gate não foi demasiado?
Coronel - Não. Nem nós temos certeza exata, pois as coisas são tão dinâmicas. Mas, com certeza, não houve tanto tempo. O médico que recebeu ela disse que se nós tivéssemos demorado mais um ou dois minutos, talvez nem tivessem conseguido recuperá-la. Em torno de uns quatro minutos antes, pelo que o médico falou, teria acontecido o fato.
DG - Então o enforcamento ocorreu quatro minutos antes da invasão?
Coronel - Provavelmente, sim. Ou não a salvaríamos, palavras do médico.
DG - Por que Jerri foi colocado em contato com o defensor público? Não pode ter prejudicado a negociação?
Coronel - Foi decisão técnica do próprio negociador. Não prejudicou. O defensor falou com ele antes da meia-noite. Nós solicitamos a presença dele depois porque o sequestrador tinha pedido novamente.
DG - O sequestrador não chegou a falar novamente com o defensor?
Coronel - Não. Ele esclareceu a questão da condicional, no que poderia auxiliar se ele (sequestrador) se entregasse naquele momento, pois quanto mais demorasse, pior seria para ele fazer a defesa. E que a integridade física dele seria mantida.
DG - A BM dispõe de equipamento de escuta para colocar na casa?
Coronel - Não.
DG - Quem retirou Jerri do fio? Ele ainda tinha sinais vitais?
Coronel - Somente quem entrou foi o Gate. Assim que os PMs entraram, apanharam ela e a levaram para a ambulância. E, imediatamente, levaram ele. O médico chegou e constatou que ele já estava em óbito. Ele foi levado até próximo a ambulância. Quem constatou o óbito dele foi o médico, já na ambulância.
RELEMBRE O CASO
Assista ao vídeo da invasão:
Por volta das 7h desta quarta-feira, o homem que mantinha a ex-companheira por mais de 20 horas sob cárcere privado foi encontrado morto na casa por policiais em Sapucaia do Sul. O Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) da Brigada Militar (BM) invadiu a casa na Rua São Caetano, bairro Vila Vargas, utilizando bombas de efeito moral.
Cinco minutos antes da ação, policiais militares movimentaram viaturas e cercaram a área da residência. Uma ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) foi posta em frente à moradia. Jerry Eder Aguiar, 41 anos, se enforcou dentro da casa e Rosemeri da Silva Anori, 51 anos, ferida em estado gravíssimo.
- Mantivemos contato de 30 em 30 minutos durante toda a madrugada. Na última ligação, ele pediu que o defensor e a imprensa estivessem presentes, que iria se entregar. Depois, não atendeu mais e a casa ficou silenciosa. O negociador tentou se aproximar à residência e conversar, mas não obteve resposta. Daí determinamos a invasão tática - disse o subcomandante da BM, coronel Silanus Melo, após a ação.
Conforme Silanus, o sofá trancava a porta e Rosemeri estava desacordada sobre o móvel. Aguiar foi encontrado enforcado por uma corda, já morto. Ele teria tentado asfixiar a ex-companheira, de acordo com o coronel. Após atendimento na ambulância, Rosemeri foi transferida para o Hospital Getúlio Vargas.
- A técnica é de que, enquanto há negociação, não invadimos - frisou Silanus.
Por volta das 23h, a polícia colocou Aguiar em contato com o defensor do município Mário Rheingantz. Por telefone, Rheingantz deu orientações jurídicas para Jerry. O defensor prestou esclarecimentos e garantiu acompanhamento do caso.
- Ele queria saber as consequências deste ato - lembrou.
A rua segue isolada até a conclusão dos trabalhos da perícia.
Aguiar invadiu a casa de Rosemeri por volta das 10h30min de terça-feira. Ele a ameaçava com uma faca de cozinha. Meia hora depois, o homem jogou uma carta para a Brigada Militar, na qual dizia estar deprimido e decepcionado com a família.
Devido às brigas constantes, a mulher já tinha uma medida protetiva contra o ex-companheiro, que vinha fazendo várias ameaças. Nesta segunda-feira, ele havia tentado invadir a residência várias vezes, mas sem sucesso.