Polícia



Violência

Bairro Restinga sofre com tiroteios quase diários há uma semana

Três já ficaram feridos e toda a vizinhança está amedrontada com os tiros

21/09/2013 - 09h05min

Atualizada em: 21/09/2013 - 09h05min


Tiroteios tiram o sossego dos moradores da Primeira Unidade da Restinga Nova

- Sabe filme de faroeste? Parece pipoca na panela quando começam os tiros. É isso.
O resumo da dona de casa de 56 anos, moradora há 22 na Primeira Unidade da Restinga Nova, dá noção do medo que ronda a vizinhança na última semana. Desde sexta-feira passada, os arredores da Avenida Ignês Fagundes viraram palco de tiroteios praticamente diários. Sempre a partir das 18h, quando boa parte dos trabalhadores sequer chegou em casa.

Desde então, dois jovens, envolvidos em confrontos armados, foram baleados na região. Na noite de quarta, dois integrantes da gangue local fizeram uma "incursão" ao outro lado do bairro, ferindo um jovem na Avenida Vereador Pozzolo de Oliveira. Um foi preso, e o outro é procurado pela polícia.

Mas os feridos, integrantes de gangues, não são os únicos prejudicados.

- Até pouco tempo atrás, pelo menos esse ponto da Restinga era muito tranquilo. Mas desde que chegou esse tal de crack, toda a nossa rotina fica transformada - diz a dona de casa.

Ela parou de frequentar o centro espírita à noite. As compras, no mercado perto de casa, faz no começo da tarde para evitar ficar na linha de fogo. A casa dela fica em frente a um campo de futebol. Com iluminação precária, o local vira campo de guerra entre as gangues da Restinga.

Dentro de casa, a mulher já mudou até a televisão de lugar. Ficava na linha reta da porta, deixando-a exposta a uma possível bala perdida. E quando começam os tiroteios, ela refugia-se em uma espécie de bunker.

- Nos fundos de casa tem uma chapa de metal. Fico lá até parar aquele barulho - resume.

O que mais assusta os moradores é o horário dos recentes confrontos. Antes, os tiros eram ouvidos durante as madrugadas.

- Não respeitam mais nada - lamenta uma comerciante.

Moradores afirmam que, há uma semana, um suposto integrante da gangue dos Primeira (Maconhão) teria saído da cadeia. Usuário de drogas, foi ferido na segunda-feira. Não morreu. Ele e os comparsas continuam no alvo, provavelmente, da gangue dos Bitas, da Vila Bita.

De acordo com o delegado Gabriel Bicca, que investiga os homicídios na Restinga pela 4ª DHPP, o desentendimento entre as gangues acontece desde o começo do ano. Mas foi acirrado nos últimos dias. Parece ser um contra-ataque dos Bitas.

Nas disputas entre as gangues locais, os Primeira teriam relação em pelo menos 60% dos tiroteios e concentrariam o maior número de jovens armados. Têm inimigos entre todos os vizinhos.

Entre o medo e a solidariedade

No começo da noite de segunda, uma comerciante de 32 anos viu-se diante de um dilema. Reconheceu, ferido, um rapaz que já havia tentado assaltá-la. Acabou levando o rapaz, baleado nas pernas, até o Pronto-Atendimento, onde a Brigada foi acionada. Era o segundo baleado dos recentes confrontos.

- Um guri largou a moto aqui na frente e saiu atirando no outro. Ali, do outro lado da rua - conta.

Do seu estabelecimento, a comerciante viu o começo de todos os duelos dos últimos dias. Fica justamente no limite imaginário entre os territórios das duas gangues.

- Estamos reféns. É impossível deixar a loja aberta até às 19h30min, como eu costumava fazer. Tenho que trancar as portas antes das 18h _ diz.

Como a família mora ali, a rotina também precisou ser alterada. A filha de sete anos já não pode brincar no pátio. A outra, de 14 anos, só volta da escola quando a mãe a busca.

Na última quinta, a menina até combinou de estudar em casa com uma colega, moradora da Restinga Velha. Não deu. A colega ligou apavorada, pois tinha se deparado com um tiroteio perto do portão de casa. Ninguém ficou ferido.

A praça é do crime

As ruas estreitas, com pelo menos três praças mal iluminadas, da Primeira Unidade são o terreno propício para a gangue do Maconhão a considerar seu terreno. Na Alameda G, os balanços até estão na praça. Difícil foi encontrar alguma criança ali na última semana.

Na quinta, uma adolescente de 16 anos arriscou levar a irmã, de dois anos, para brincar um pouco.

- A praça é mais deles do que nossa. Só trago a minha irmã quando está assim, bem vazio e com muito sol - diz a menina.

Conforme os investigadores da 4ª DHPP, esse território é como um trunfo para a gangue local. Mas os rivais estariam se arriscando em incursões para executá-los.

Mais de 150 armas apreendidas

Quando escureceu, uma comerciante conta que olhou para uma das praças da Primeira Unidade. Só via os clarões dos tiros. Um dos guris envolvidos no tiroteio passou por ela.

- Carregava uma arma grande assim, bonita e brilhosa. E são umas crianças - lamentava, mostrando nas mãos a distância de dois palmos.
De acordo com o comandante do 21º BPM, tenente-coronel Oto Amorim, o maior problema no bairro, considerado um território da paz, é a presença de armas. Em oito meses, 153 armas foram apreendidas na região. Além de 1,7 mil munições. Outros 50kg de drogas já foram apreendidos.

- A cada tiroteio, procuramos não apenas os autores, mas informações que ajudem a explicar o crime. E assim mantemos um contato muito próximo com a 16ª DP e a 4ª DHPP - afirma o oficial.

Segundo ele, nos últimos dias o patrulhamento foi reforçado na região da Primeira Unidade. Ao menos nos números de homicídios a parceria dá seus primeiros resultados. Foram 23 pessoas assassinadas na Restinga em 2013 - três desde a metade do mês passado.


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