Foi trágica - mas dentro da rotina de um mês violento na região - a volta de um baile funk no Bairro Santa Tereza, Zona Sul da Capital, no final da madrugada de ontem. Deivid da Silva Vargas, 23 anos, e Roger Vinícius da Cunha Machado, 20 anos, foram executados a tiros quando seguiam, com outros três jovens, até a casa da mãe de um deles, na Rua Dona Otília, por volta das 5h.

Com os dois homicídios, dez pessoas já foram mortas em 22 dias no Território da Paz do Santa Tereza. De acordo com os investigadores da 4ª DHPP, a região é palco de confrontos entre pequenas quadrilhas do tráfico.

Polícia mapeou as áreas de conflito

O Diário Gaúcho teve acesso ao mapeamento desses conflitos, feito pela 4ª DHPP. São pelo menos cinco pontos de violência - as vilas Pantanal, Prisma, Rio Branco, Barracão e o grupo que domina uma área da Rua Caixa Econômica.

- Todo dia tem um ferido lá. Na semana passada, estávamos atendendo um local onde um rapaz foi morto e um tiroteio acontecia na vila rival - contou o delegado Gabriel Bicca.

Mortes também na Barracão

Dessa vez, as mortes aconteceram na Vila Barracão, em uma provável briga interna. Um dos suspeitos é Luís Felipe de Oliveira Godói, o Felipinho, 20 anos, que, curiosamente, havia jantado com as vítimas uma semana atrás.

Ele foi preso pela Brigada Militar pouco tempo depois do crime. A polícia já tem outro suspeito das mortes.

De acordo com o delegado adjunto da 4ª DHPP, Rodrigo Pohlmann, o grupo de jovens foi surpreendido, na volta do baile funk, por um homem com uma pistola .380. Foram mais de dez disparos, tendo como alvos Roger e Deivid.

Os amigos das vítimas teriam visto Felipinho e pediram socorro. Mas foram surpreendidos.

Tiros na cabeça para "arrematar"

O rapaz teria se aproximado dos dois e "terminado o serviço". Com um revólver calibre 38, deu um tiro na cabeça de cada um.

Até o fim de agosto, o ritmo dos crimes seguia a média dos dois anos anteriores, como aponta o levantamento do Diário Gaúcho, com no máximo dois assassinatos por mês. Mas, em setembro, a média aumentou.

Moradores sob fogo cruzado

Num dos conflitos do Bairro Santa Tereza, moradores de duas pequenas vilas vivem sob fogo cruzado. De um lado está a turma da Rua Caixa Econômica. De outro, a Vila Pantanal. Nos dois locais funcionam bocas de fumo que não movimentam grandes somas. É o que os policiais chamam de "tráfico de subsistência" - a droga que vendem hoje garante a compra de nova carga na semana que vem. Mesmo assim, o movimento de usuários é frenético, despertando o interesse dos rivais.

A disputa entre as gangues da Pantanal e da Caixa Econômica fez três vítimas. Uma morte de um lado é vingada com uma do outro.

O primeiro assassinato aconteceu no dia 2 de setembro, quando uma adolescente de 17 anos foi morta a tiros.

Tiroteio entre gangues

No dia 9 de setembro, teria ocorrido a vingança. Um grupo da Pantanal teria chegado atirando na Caixa Econômica. Foram recebidos à bala.

No fogo cruzado, policiais do 1º BPM chegaram e também atiraram. Anderson Keis de Almeida, o Andi, 18 anos, caiu morto com ao menos um tiro nas costas. Dois dias depois, um novo crime desempatou o trágico placar. Israel Kowalski da Silva, 21 anos, foi executado na Vila Pantanal.

IMPUNIDADE FAZ CRESCER VIOLÊNCIA

Conforme as autoridades, os confrontos do Santa Tereza confirmam uma lógica comum em todas as regiões da Zona Sul da Capital onde há aumento nas mortes em 2013. Quem mata e quem morre é jovem, tem acesso fácil a armas e geralmente é beneficiado pela impunidade.

Neste aspecto, o histórico de Felipinho, preso ontem, impressiona. Somente em junho, no intervalo de dez dias, ele foi preso duas vezes pela Brigada Militar por porte ilegal de arma. Já havia sido preso pelo mesmo tipo de crime em dezembro passado. Em fevereiro ele foi preso por roubo de veículo.

Respeitados pelos comparsas

Felipinho responde na Justiça ainda pela morte de Giovani dos Santos Trajano, o Ganso, aos 21 anos, em dezembro do ano passado, na Vila Cruzeiro.

- Quando as pessoas veem que os envolvidos em crimes continuam nas ruas, eles se fortalecem. Tanto pelo medo de testemunhas quanto pelo respeito que ganham entre os comparsas - avalia Rodrigo Pohlmann.

SAIBA MAIS

(*) Levantamento do Diário Gaúcho de homicídios na Região Metropolitana.

Homicídios no Território da Paz do Santa Tereza*:

- 2011 - 18 mortes até 22/9 - 22 no ano todo

- 2012 - 21 mortes até 22/9 - 28 no ano todo

- 2013 - 25 mortes até 22/9

Média de mortes por mês*:

- 2011 - 1,8

- 2012 - 2,3

- 2013 - 2,7

O mapa da violência

As zonas de conflito: 

Pantanal x Caixa Econômica - Dois grupos de traficantes rivais disputam o controle das pequenas bocas. Briga é reforçada por interesses de traficantes de fora do bairro. 

Prisma x Rio Branco - Os pontos de tráfico entre as duas vilas pertenceriam a um mesmo líder. Mortes estariam relacionadas a um conflito interno na quadrilha. 

Barracão - Desentendimentos internos na quadrilha estariam causando o confronto. 

A sequência de mortes: 

2 de setembro - Uma jovem de 17 anos foi morta com dois tiros na Vila Pantanal. A 4ª DHPP suspeita que ela teria ligações com a quadrilha local. 

2 de setembro - William de Carli, 23 anos, foi executado na Rua Correia Lima, Vila Prisma, com um tiro de calibre 12 no rosto. 

5 de setembro - Douglas Santos e Gabriel Dias, ambos com 18 anos, foram executados com tiros nas costas no Beco Um da Rua Dona Zaida, Vila Rio Branco. A suspeita é de tenham sido mortos por traficantes que não os queriam no local. 

6 de setembro - Ricardo dos Santos Brasil, 29 anos, foi executado com tiros no rosto na Vila Barracão. 

9 de setembro - Anderson Keis de Almeida, o Andi, 18 anos, foi morto durante um tiroteio com traficantes rivais na Rua Caixa Econômica. 

11 de setembro - Israel Kowalski da Silva, 21 anos, foi executado a tiros no Beco Flores, na Vila Pantanal. 

12 de setembro - Átila Santos Galvão, 20 anos, foi morto com um tiro no peito na Rua Joracy Camargo. A suspeita era de que o crime fosse um acerto de contas. 

22 de setembro - Deivid da Silva Vargas, 23 anos, e Roger Vinícius da Cunha Machado, 20 anos, foram executados a tiros na Vila Barracão.