Polícia



IGP gaúcho

Quase 90% das perícias em aberto no RS estão paradas há mais de 6 meses

16,4 mil de um total de 18,6 mil perícias deveriam ter sido realizadas há mais de 180 dias

17/04/2018 - 10h37min

Atualizada em: 17/04/2018 - 14h20min


Vitor Rosa
Vitor Rosa
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Adriana Franciosi / Agencia RBS
IGP gaúcho enfrenta falta de servidores, que causa longos atrasos na realização de pericias

O Instituto-Geral de Perícias (IGP) tem 16.433 perícias por fazer há mais de seis meses no Rio Grande do Sul, o que representa 88% do total de laudos em aberto. O atraso é considerado crítico pelo próprio órgão, que não vem conseguindo dar conta de forma rápida da demanda. Ainda há outros 2.217 procedimentos a serem feitos que ainda não chegaram a ficar sem andamento há mais de 180 dias. Os números foram informados pelo instituto a pedido de GaúchaZH. 

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Os maiores problemas se concentram em Porto Alegre. Há 3,3 mil perícias paradas na capital gaúcha. Depois de Porto Alegre, as cidades que enfrentam os piores atrasos são Caxias do Sul, Pelotas, Passo Fundo, Viamão e Novo Hamburgo.  

O número de perícias acumuladas cresce desde o mês de agosto de 2017. Apesar da quantia por fazer ainda ser considerada crítica, é 26% menor do que a registrada no momento com o maior atraso dos últimos três anos. Em 2015, o IGP acumulou quase 25 mil laudos por fazer. Após isso, uma força-tarefa foi feita e ajudou a reduzir a demanda.

Atualmente, o maior problema aos peritos se encontra na área de microcomparação balística — um procedimento que ajuda a desvendar de qual arma partiu o tiro envolvido no crime. Muitas vezes, é a prova principal nos inquéritos policiais. De acordo com o IGP, há uma dificuldade quando a comparação é feita em corpos de vítimas de homicídio atingidas por múltiplos disparos. Se uma pessoa foi atingida por 10 tiros, cada bala deve ser comparada pelo perito.

O IGP também admite "problemas crônicos" na área de informática. Para o trabalho ser mais próximo do ideal, também seriam necessários investimentos em equipamentos para o órgão. O sonho atual dos peritos seria ter o sistema de banco de dados para projéteis e estojos percutidos. O procedimento armazenaria dados de balas recolhidas de diferentes cenas de crimes para comparação com armas apreendidas. O sistema custa cerca de R$ 15 milhões. 

A principal causa dos atrasos no Instituto-Geral de Perícias é o mesmo que afeta a Brigada Militar, Polícia Civil e Susepe: o baixo efetivo. Atualmente, há nos quadros do IGP 642 servidores. O número representa 38% do considerado ideal para pleno funcionamento, de aproximadamente 1,7 mil. Há cinco anos, o número de servidores era de 820. A queda no período é de 21% no quadro. 

O grande número de aposentadorias impulsiona o baixo quadro no IGP. Aliado a isso, o último chamamento de servidores foi referente ao concurso público para o órgão foi feito em 2008. O quadro atual é um dos menores da história do IGP gaúcho. 

O diretor-geral do IGP, Eduardo Lima, reconhece que o baixo efetivo é o maior problema do instituto. No entanto, ele lembra do concurso realizado em 2017 para preencher vagas como uma possibilidade para melhorar a situação ainda em 2018.

— Hoje, a dificuldade real é a falta de pessoal, mas é uma situação que estamos trabalhando para resolver há algum tempo e acreditamos que em mais alguns meses conseguiremos recompor nosso quadro de pessoal — afirma o diretor.

A Secretaria de Segurança Pública (SSP) confirma que 106 servidores devem começar a trabalhar nos próximos meses no IGP. Para o diretor do órgão, o funcionamento razoável necessitaria, pelo menos, do dobro do número que deve ser nomeado. Lima afirma que só assim os servidores poderiam "não só dar conta da demanda, mas também produzir estudos e pesquisas para melhorar o trabalho".  

Atualmente, cada perito tem uma média de 40 trabalhos feitos por mês, de acordo com dados do órgão. 

Peritos enfrentam falso descanso, diz sindicato

 O presidente do Sindicato dos Servidores do IGP gaúcho (Sindiperícias), Henrique Bueno Machado, alega que a falta de chamamento dos servidores que passaram no último concurso aumenta a demanda dos que já trabalham. Segundo ele, por isso, muitos colegas trabalham até mais que as 20h extras permitidas por lei. 

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— O pessoal faz um plantão e não consegue sair da cidade. Acabam trabalhando mais que as 40h da carga horária e até mais do que as 20h adicionais possíveis, quase sempre sem receber — critica o perito. 

Ainda de acordo com o Sindiperícias, por causa do baixo efetivo, os peritos do Interioracabam ficando de sobreaviso. 

— É um falso descanso, falsas férias. Sai por um dia só. A equipe em boa parte não está completa e o pessoal acaba tendo que ir trabalhar — reclama.  

Fechamento de postos no Interior 

 Aliados ao baixo número de servidores, o órgão também enfrenta o fechamento de dois postos médicos-legais no Interior do Estado. As unidades de Lagoa Vermelha e de Camaquã, que teve prédio novo construído em 2016, não abrem mais por falta de servidores. O problema também afeta cidades grandes, como Novo Hamburgo e Osório, que tiveram os postos de criminalísticas absorvidos por Porto Alegre em alguns dias da semana por não ter peritos necessários para operar.

Com o fechamento dos postos no Interior, peritos precisam fazer viagens longas para atender, por exemplo locais de crime. Se não estiver resguardado por policiais, o tempo para chegada pode afetar a coleta de provas.

O atraso em perícias gera graves problemas ao andamento de inquéritos pela Polícia Civil, que muitas vezes depende dos laudos para poder seguir ou descartar linhas de investigação ou interrogar com propriedade e tentar pegar controvérsias em depoimentos de suspeitos. Com isso, famílias de vítimas de crimes acabam aguardando mais por uma resposta da polícia, o que também facilita na fuga dos criminosos das regiões onde antes se encontravam. 

Exemplo claro de como o baixo número de servidores no IGP afeta processos judiciais é o da morte do estudante de Medicina Fernando Zucuni Furlan, em uma festa na zona sul de Porto Alegre, no dia 2 de dezembro de 2015. Desde então, paira um mistério sobre a família: o estudante morreu após cair nas proximidades de uma piscina, como dizia a polícia inicialmente, ou alguém o matou? Ainda não se tem certeza, já que as perícias solicitadas ainda não foram concluídas. 

O processo está classificado como homicídio qualificado. Mais de dois anos depois, já em 2018, o IGP finalizou o laudo de análise do telefone do estudante. Ainda faltam perícias no computador dele

Outro caso recente e de grande repercussão em que o atraso do IGP faz com que o inquérito não ande é aquele que investiga a queda da estrutura do Atmosphere Festival, em Esteio, que resultou na morte do DJ Kaleb Freitas. Sem a informação sobre o motivo da queda, a Polícia Civil não consegue definir se irá responsabilizar os organizadores do evento. 

O IGP garante que trabalha em conjunto com a Polícia Civil, Ministério Púbico e Judiciário para minimizar os casos de atraso em inquéritos e conseguir as provas necessárias. 

O que diz a SSP

A Secretaria de Segurança Pública (SSP) reconhece o déficit e afirma que 106 aprovados no concurso de 2017 devem começar a trabalhar ainda neste ano. Entre 9h14min e 12h17, a informação que a reportagem divulgou, após contato com a pasta, era de que já havia o chamamento dos peritos, o que ainda não ocorreu. De acordo com a assessoria da SSP, o secretário de segurança, Cézar Schirmer, trabalha pessoalmente para que a nomeação seja feita com brevidade. 

Além do concurso, a SSP também lembra o investimento no prédio do IGP, que está sendo construído no terreno da SSP e chegou a 40% de conclusão.

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