Polícia



Violência

 A história de Gabriela, 18 anos, vítima de feminicídio na zona sul de Porto Alegre

O caso de jovem encontrada morta na quarta-feira (3) em motel no bairro Ipanema revela drama familiar

05/10/2018 - 19h13min


Hygino Vasconcellos
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Hygino Vasconcellos / Agência RBS
Gerci mostra fotos da filha na casa em que viviam no bairro Restinga, no extremo sul de Porto Alegre

Já era noite quando Gabriela da Rosa Silva, 18 anos, saiu de casa na última terça-feira. Vestia legging preta, casaco de moletom e tênis branco “de marca”, recém comprado. Ainda brincou com o filho Davi, de seis meses, antes de deixar a casa simples da família no bairro Restinga, zona sul de Porto Alegre, acompanhada de uma amiga.

Dois dias se passariam até a mãe dela receber uma ligação da polícia. Primeiro, questionaram se ela sabia quem seria o dono de um Santana vermelho – o carro foi usado pelo homem que matou sua filha. Depois, veio a notícia de que Gabriela foi encontrada sem vida dentro de um motel no dia anterior. A identificação da jovem havia sido confirmada pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP) após análise das digitais.

— Não acreditei — conta em lágrimas a mãe da jovem Gerci da Rosa, 52 anos.

Em seguida, correu para o Departamento Médico Legal (DML), onde confirmou o desfecho trágico.

— Foi muito triste vê-la naquela situação, toda machucada — lamentou a mãe,  na sexta-feira, ainda trêmula, após o enterro no Campo Santo da Santa Casa.

Ainda sem saber o que motivou o crime, a mãe relata que Gabriela era usuária de drogas desde os 11 anos. O pouco dinheiro que Gerci conseguia juntar com o trabalho de serviços gerais era gasto para pagar as nove internações da filha. Em seis oportunidades, ficou de 20 dias a um mês reclusa. Na última ocasião, passou três meses sob cuidados médicos.

Devido ao consumo de drogas, segundo a mãe, a jovem apresentava comportamento agressivo. Chegou inclusive a bater no ex-companheiro em um ataque de fúria, e decidiu terminar o relacionamento em maio deste ano. A jovem deixou o colégio e, conforme Gerci, parou na 5ª série.

“Minha pequeninha. Sei que não voltar”

Quando soube que a filha estava grávida, a mãe imaginou que Gabriela tomaria novo rumo. Mas, logo que a criança completou um mês, o laço materno com o menino ficou estremecido. Ela reclamava que seria trabalhoso cuidar do pequeno. A avó, preocupada, assumiu a responsabilidade. Com o dinheiro da pensão do pai, cerca de R$ 300, colocou o menino em um creche no período que trabalhava.

— Se falasse alguma coisa, ela gritava e dizia que já tinha 18 anos – lembra.

Segundo a polícia, a jovem tinha antecedentes por roubo e agressão. A família acrescenta que Gabriela chegou a ficar internada na Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase) pelos delitos.

Ainda desolada com a perda, a mãe da jovem não esconde a raiva com o autor do crime. Ao mexer em fotos de Gabriela quando criança, soluça:

– Minha pequeninha. Sei que não vai trazê-la de volta, mas queremos justiça. Quero ele atrás das grades.

Gabriela ainda deixa dois irmãos e o pai, que é separado da mãe.

Na Polícia Civil, análise de câmeras e depoimentos


A polícia apura a morte de Gabriela da Rosa Silva, 18 anos, como feminicídio – quando o assassinato de uma mulher é motivado por questões de gênero. O corpo da jovem foi encontrado na manhã de quarta-feira dentro de um quarto de motel na zona sul de Porto Alegre.

Conforme a delegada Tatiana Bastos, há duas circunstâncias que fortalecem a tese de feminicídio – basicamente relacionadas à dinâmica do crime. A primeira delas é violência sexual e física sofrida pela vítima – com lacerações e lesões pelo corpo. Tatiana observa que esses indícios eliminam a tese de uma possível ligação com o tráfico de entorpecentes – já que a mulher era usuária de drogas.

— Não é comum ter crime sexual em ocorrências ligadas ao tráfico de drogas. Neste caso, ela foi tratada de maneira vil (com desprezo) pela questão de gênero — salienta a delegada.

Além disso, a escolha do motel como local do crime reforça a hipótese de feminicídio. Segundo a delegada, o suspeito do assassinato pagou antecipado o pernoite, o que demonstra a disposição de permanecer no estabelecimento e revela que os dois se conheciam há tempos. A jovem morava com a mãe no bairro Restinga, na Zona Sul, e deixa um filho de seis meses com um ex-namorado. A família não tinha certeza se a jovem fazia programas.

— Não era uma coisa declarada, mas a família desconfiava. Não tinham muito controle — conta Tatiana.

A delegada obteve imagens de câmeras e está analisando o material. A intenção é descobrir a placa do veículo utilizado pelo assassino. Familiares, amigos e outras pessoas foram ouvidos pelos investigadores, mas é desconhecida a motivação do crime.

— Eles se conheciam e tinham algum tipo de relacionamento. Alguma coisa aconteceu para ela ser agredida dentro do motel, que ainda não sabemos.


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