Vale do Sinos
A história de vovó Celuta, 93 anos, vítima de ladrões e amparada pelos vizinhos
Alvo de seis assaltos com ameaças e agressões em Portão, idosa mobiliza comunidade e recebe vigilância
A comovente história de Celuta Oliveira está mobilizando Portão, município do Vale do Sinos onde ela vive desde o seu nascimento, há 93 anos. A idosa, que mora sozinha, já foi vítima de seis assaltos em casa. Além desses roubos, houve um arrombamento, em um dia em que ela não estava na moradia. Tudo isso em um intervalo de 11 anos.
Para dar um basta a esses ataques à Vovó Celuta, como é conhecida, que incluem agressões físicas e ameaças com facas, amigos, pessoas da comunidade, comércio local e empresas prestadoras de serviços estão realizando uma espécie de mutirão, que inclui doações para repor bens roubados e, principalmente, para lhe dar proteção.
O assalto mais recente ocorreu na sexta-feira passada (2), durante a madrugada. Pelo menos dois homens entraram na casa após arrombarem a janela. Celuta, que acordou assustada, foi rendida sob a ameaça de uma faca. Enquanto os criminosos reviravam a moradia na busca por objetos que poderiam levar, a idosa se aproveitou da distração deles e saiu pelos fundos.
— Fiquei das 3h até umas 8h escondida, praticamente na rua. Só rezei para continuar viva — conta com lucidez.
Os ladrões, revoltados por não terem encontrado dinheiro — foi a exigência que fizeram, enquanto a ameaçavam –, antes de deixarem a casa, espalharam roupas por todas as peças e quebraram duas dúzias de ovos, os atirando nas paredes. Entre os objetos levados estava a TV da idosa, a segunda roubada em assaltos.
A faca, deixada no local, foi recolhida pela perícia e é uma das pistas com as quais conta a polícia para identificar os assaltantes.
— Esperamos os resultados dos exames para identificá-los pelas impressões digitais — explica o inspetor Fabrício Rampel, do setor de investigações da DP de Portão.
O assalto anterior havia ocorrido apenas dois dias antes, durante o dia. Para entrar na casa, um casal se passou por agentes da saúde do município. Alegando que realizavam trabalho de fiscalização, vistoriaram armários e levaram gêneros alimentícios da vovó.
— De todos os assaltos, só dois foram à noite. O resto foi tudo de dia — conta.
Com memória incrível, a idosa ainda lembra da primeira vez em que foi atacada, há 11 anos.
— Já me agrediram muito. Dois anos atrás, no dia 17 de julho, puxaram e quase arrancaram o meu cabelo. O homem tinha entrado na casa e se escondido no armário. Quando cheguei, ele me surpreendeu — recorda.
Daquela vez, o ladrão fugiu no momento em que Celuta foi procurada por um homem que a procurava para fazer benzedura.
“O bom de cidade pequena é que a gente se ajuda”
A mobilização em defesa da Vovó Celuta começou pelas redes sociais. Foi por uma postagem do fotógrafo Marcio Lacerda, no Facebook, que o município de pouco menos de 35 mil habitantes se aliou para ajudar a idosa.
— Já conhecia a família dela e quando soube dos assaltos, ainda mais sendo dois em uma mesma semana, fui procurá-la para ajudar. Publiquei a história e, felizmente, o comércio e as empresas de vigilância abraçaram a causa. Hoje, a casa está mais vigiada do que a do Big Brother — conta.
Foram três as empresas de vigilância que aderiram à causa. Em uma união de esforços, farão o monitoramento do imóvel, além de instalarem sistema de câmeras de vigilância, sem custos para a idosa.
— Esse é o bom de cidades pequenas: a gente se conhece e a gente se ajuda — diz Júlio Müller, supervisor operacional de uma das empresas.
Já o comércio fez doações como de uma TV e também de um celular, que a idosa diz que terá ainda de aprender a usar.
Vitalidade, lucidez e bom humor
Lucidez e personalidade forte são características marcantes em Celuta Oliveira. Pelo menos três diferentes gerações de portanenses contaram com sua atividade de benzedeira. Mesmo tendo duas filhas, nove netos e 13 bisnetos, mora sozinha desde quando ficou viúva, há cerca de duas décadas. Ao relembrar um fato marcante em sua vida, Vovó Celuta mostra, além de boa memória, bom humor.
– Uma vez, um raio caiu aqui em casa e desde então me assusto com fogos de artifício ou outros estrondos. Eu era nova, tinha 63 anos.
A vizinha Eda Dresch, que hoje tem os mesmos 63 anos, sorri:
– Ela acha nova alguém com 63.
– Para mim, que tenho 93, 63 é nova – responde Celuta, aos risos.
A vovó é caseira, mas se há algo que a tira de casa é o esporte.
– Eles (amigos) vêm me buscar para jogar câmbio. Adoro. Temos um time da terceira idade que joga no ginásio aqui de Portão, mas também viajamos para outras cidades para jogar campeonatos – conta entusiasmada.
Detalhe: câmbio é uma espécie de voleibol adaptado em quadra, disputado em dois tempos de 15 minutos, com nove jogadores em cada equipe.