Barbárie em Planalto
Caso Rafael: mãe terá de mostrar aos policiais e peritos como carregou corpo do filho
Marcada para começar às 18h desta quinta-feira, reconstituição terá acesso restrito e não tem hora para acabar
Marcada para ocorrer a partir das 18h desta quinta-feira (17), a reprodução simulada dos fatos — conhecida como reconstituição — vai recontar os passos até a morte de Rafael Mateus Winques, 11 anos, na cidade de Planalto, no norte do RS. O menino desapareceu em 15 de maio e foi encontrado morto, 10 dias depois, dentro de uma caixa na casa ao lado da que morava com a família.
A mãe dele, Alexandra Dougokenski, 33 anos, admitiu a autoria crime, alegando ter exagerado em doses de medicação, mas disse que não teve a intenção de matar. Laudo do Instituto-Geral de Perícia (IGP) revelou que o garoto morreu por asfixia.
Alexandra e o outro filho, de 17 anos, que também estava na casa no momento do crime, irão participar da simulação. O corpo de Rafael será representado por um boneco com o mesmo peso e altura do menino.
A reconstituição é uma perícia complexa, sem ter hora para acabar. À frente do IGP, Heloísa Helena Kuser explica que o objetivo do trabalho é avaliar se a versão dada pela mãe de Rafael é real e se há viabilidade de ter acontecido da forma como foi narrada:
— É um trabalho que depende de muita leitura de todos os depoimentos e estudo de todos os laudos já elaborados. A perícia é uma busca de vestígios e provas. E isso vai demorar quanto tempo o perito achar necessário até responder todos os quesitos levantados. Pode ser que o trabalho vá até a madrugada. Tudo é feito conforme as versões. É um processo lento — diz.
Ao longo de todo processo, cada passo é registrado por fotos e anotações. Um laudo posterior, que tem até 30 dias para ser concluído, vai confrontar as várias versões, analisar se há alguma disparidade e onde, tecnicamente, elas não são possíveis.
Por simular uma situação que já aconteceu, é necessário que o trabalho ocorra nas condições ambientais do crime — como horário, luminosidade e temperatura. Heloísa explica que quanto mais estes fatores forem semelhantes aos do dia do fato, melhor será a qualidade da reprodução.
Pelo IGP, irão participar do trabalho peritos criminais e fotógrafos. O acesso à casa será restrito a servidores do instituto, delegados, à promotora do caso, Michele Kufner, e ao advogado de defesa, Jean Severo. Quando necessário, policiais civis poderão ser chamados para ocupar o local de alguém que estava na cena.
O trabalho é feito em várias etapas. A Polícia Civil elabora os quesitos técnicos que precisarão ser respondidos pela reprodução. Aos peritos, cabe elaborar a prova para a investigação.
Até a data da reconstituição, é feito um estudo prévio em que os peritos estudam todo inquérito, leem as versões apresentadas, conferem os laudos e preparam todas as versões que serão feitas no local, conforme os vários depoimentos. Até aqui, os delegados ouviram mais de 30 pessoas sobre o crime, entre eles, familiares, professores de Rafael, pais de amigos e o namorado da mãe da criança.
Outras perícias, como necropsia, análise toxicológica e análise do local do crime, permitirão responder a questões complementares, como saber se o menino realmente foi morto na madrugada de 15 de maio e se ele ingeriu medicamento.
Entre os pontos que Alexandra terá de explicar é como teria tirado Rafael de cima da cama, no quarto, e o levado até a caixa na casa ao lado.
— Entrei na casa, existe um espaço pequeno entre a cama e o armário. Ela terá de puxar o boneco, mostrar como ele caiu. O perito vai medir, fotografar e filmar — explica a chefe de Polícia, Nadine Anflor.
Outro detalhe apontado por Nadine é de que a porta do quarto de Rafael não abre completamente, devido a uma escrivaninha próximo à saída:
— Como ela passou com ele, de ombro a ombro, por aquele espaço, simplesmente puxando? Ela vai ter de contar e mostrar como fez cada coisa. O perito vai dizer se tem ou não condições de ela ter feito aquilo. E vamos ver se ela conseguia carregar o filho ou não. Deve ser no escuro, até para ver se ela poderia enxergar a caixa (onde o corpo foi encontrado), se teria condições de carregar o menino no escuro, só com a luz da Lua.
Na quinta-feira, os trabalhos começarão às 18h, na Delegacia de Polícia de Planalto, quando Alexandra será entrevistada pelos peritos.
— Nesse primeiro momento vão criar uma empatia com ela, tem toda uma preparação. Depois, vão todos para o local do crime e aí, realmente, refazer o passo a passo. Vamos dizer que comece dentro do quarto do menino: se for preciso, talvez tenha que repetir 50 vezes a mesma posição em que ela pegou o filho. Ela deixou ele cair? Tem marca no ombro que possa indicar isso? Isso é a reprodução — detalha Nadine.
O irmão de Rafael também terá papel importante nos trabalhos. Em depoimento, o adolescente disse ter ouvido barulho da porta e visto uma luz acesa.
Um ônibus da Polícia Civil, que funciona como sala móvel de comando e controle, da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), estará no local para apoio tático. O isolamento da área terá apoio da Brigada Militar.
— Queremos evitar aglomerações, garantir a segurança da população, da Alexandra, como presa temporária, e dar todo suporte para as equipes — esclarece Nadine.
O advogado de Alexandra, Jean Severo, afirma que a reconstituição trará à tona a dinâmica dos fatos, o que, segundo ele, irá "reforçar a tese da defesa de que foi crime culposo, sem intenção de matar":
— Ela vai comprovar que foi ministrado por ela medicação, mas que nunca teve a intenção de ver o filho morto. Vai indicar que agiu sozinha, que a caixa que havia lá era dos vizinhos e que ela não premeditou e nem pensou em colocar a caixa lá. Também vai demonstrar que a corda não foi comprada, que ela já tinha há muito tempo.