Inquérito concluído
"Ele queria matar o máximo possível de pessoas", afirma delegado sobre ataque em Saudades
Polícia Civil confirmou que Fabiano Kiper Mai, 18 anos, planejou a chacina sozinho durante meses e tinha consciência do que estava fazendo
Autor do ataque a Escola Pró-Infância Aquarela, em Saudades (SC), Fabiano Kipper Mai, 18 anos, planejou a chacina sozinho, tinha consciência do que estava fazendo, agiu motivado por ódio e pretendia matar o maior número possível de pessoas. Essas são as principais conclusões da Polícia Civil de Santa Catarina sobre o crime que tirou a vida de três bebês e duas professoras na manhã de 4 de maio. Os detalhes da investigação foram divulgados em coletiva de imprensa nesta sexta-feira (14).
Na manhã do crime, Fabiano trabalhou na fábrica de confecção de roupas e calçados entre 5h e 9h15min. No horário do intervalo, foi em casa e depois saiu de bicicleta para ir até a Aquarela. Invadiu a escola 9h50 com um facão que comprou por R$ 400 na internet e foi entregue cinco dias antes do ataque.
— Ele queria matar o máximo possível de pessoas. Ele agiu com esse objetivo e estava com pressa. Ele tentava entrar em uma sala, não conseguia e ia para outra, algo que era importante para atingir o objetivo dele. Ele agiu consciente do que fez o tempo todo. Ele planejou o ataque há vários meses, desde o ano passado. Ele agiu sozinho, demos profundidade suficiente na investigação para dizer que não há indicativo de que alguém tenha o auxiliado — afirmou o delegado Jerônimo Marçal Ferreira em coletiva de imprensa na manhã desta sexta-feira (14).
Fabiano foi indiciado por cinco homicídios triplamente qualificados e uma tentativa de homicídio triplamente qualificada. As vítimas são Sarah Luiza Mahle Sehn, 1 ano e 7 meses, Anna Bela Fernandes de Barros, 1 ano e 8 meses, Murilo Massing, 1 ano e 9 meses, Mirla Amanda Renner Costa, 20 anos, e Keli Adriane Aniecevski, 30.
Ao longo dos 10 dias de investigação, foram ouvidas mais de 20 testemunhas, e analisados os conteúdos do computador e do pen drive do criminoso. A Polícia Civil também contou com suporte da Embaixada Americana em Brasília.
Fabiano foi ouvido formalmente na segunda-feira (10) quando ainda estava internado no Hospital Regional do Oeste, em Chapecó. Ele teve alta na quarta-feira (12) e foi encaminhado para cadeia, onde vai aguardar o julgamento. Na coletiva, o delegado optou por não dar detalhes da fala do matador. Disse que o criminoso confessou o crime e admitiu que planejou e agiu sozinho. Os investigadores chegaram a motivação do ataque com o apoio de uma psicóloga da Polícia Civil de Santa Catarina.
Ele tentava entrar em uma sala, não conseguia e ia para outra, algo que era importante para atingir o objetivo dele. Ele agiu consciente do que fez o tempo todo. Ele planejou o ataque há vários meses, desde o ano passado. Ele agiu sozinho, demos profundidade suficiente na investigação para dizer que não há indicativo de que alguém tenha o auxiliado.
JERÔNIMO MARÇAL FERREIRA
Delegado de Pinhalzinho (SC)
— Não quero ter a pretensão de entrar na cabeça do rapaz e tentar simplificar. Mas ele era uma pessoa isolada, tinha dificuldade de relacionamento em um nível muito acima do normal. Tem muita gente que é fechada mas com ele isso era em em um outro patamar — disse o delegado.
Durante as refeições em casa, Fabiano pegava o prato e ia para o quarto. Quando precisava de uma peça de roupa, pedia para a mãe comprar. Em perfil publicado por GZH, familiares e conhecidos de Fabiano o descreveram como um jovem de poucos amigos, introspectivo e fechado inclusive com a família. Não tinha celular e nem perfil nas redes sociais. Passava a maior parte do dia trancado no quarto, tendo acesso a conteúdo inapropriado, especialmente fotos e vídeos — e contato com pessoas que tinham pensamentos e sentimentos ruins como ele.
— Ele foi se isolando do nosso mundo cada vez mais. Ao navegar na internet, começou a ter contato com material e ideias muito violentas e pessoas que pensavam parecido com ele. Foi alimentando esse ódio dentro dele a ponto de querer descontar em alguém, na população. Não era ódio contra alguém específico. Ele tinha ódio generalizado — explicou Marçal.
A partir do momento em Fabiano passou a querer externar o ódio que vinha alimentando dentro de si, apontou como alvo inicial pessoas do seu próprio convívio. Tentou comprar arma de fogo de várias formas e não conseguiu. Pensou em atacar a Escola de Educação Básica Rodrigo Alves, onde cursava o terceiro ano do Ensino Médio, mas achou que não daria conta de enfrentar os adultos que frequentavam a instituição. O criminoso então decidiu comprar um facão pela interne.
— O ato já seria covarde se fosse na escola. Agora contra crianças e mulheres, que não tem como se defender, foi ainda mais covarde. Ele decidiu descontar a raiva em quem não tinha nada a ver com ele — afirmou o delegado.
Ainda segundo a polícia, integrantes da família de Fabiano — ele morava com o pai, a mãe, a irmã e a avó — viram o facão chegar mas não entenderam o porquê da compra. A investigação também apurou que as pessoas que convivam com o criminoso não tinham ideia do que se passava pela cabeça dele e nem do que poderia acontecer. Na avaliação do delegado, Fabiano era uma pessoa normal — sem distúrbio psicológico — e tinha noção do que fazia:
— O planejamento do crime deixa isso muito claro. Ao conversar com ele, demonstrou consciência de que o que ele fez foi errado. Sabia que estava errado e fez mesmo assim. Falou que estava arrependido mas não consegui aferir se era genuíno ou não.
Não era ódio contra alguém específico. Ele tinha ódio generalizado.
JERÔNIMO MARÇAL FERREIRA
Delegado de Pinhalzinho (SC)
O depoimento de Fabiano corroborou o que a polícia já vinha apurando. Conforme a investigação, o matador mirou a Escola Aquarela pela fragilidade das vítimas. O planejamento do crime também incluía tirar sua própria vida. Fabiano chegou a dar golpes contra si e foi internado em estado grave.
— A raiva dele era contra qualquer pessoa. Ele atacaria qualquer pessoa. Quando a arma chegou na casa dele, definiu o alvo e escolheu aquele local. É algo que ele vinha trabalhando na cabeça dele, no seu isolamento. Para mim, está tudo bem esclarecido, quem fez, por que fez, de que forma fez — afirmou Marçal.
O delegado-geral de SC, Paulo Koerich, explicou que a troca de informações com os norte-americanos permitiu identificar outras pessoas que poderiam ter a intenção de planejar ações semelhantes em outros Estados brasileiros. As informações foram encaminhadas às respectivas autoridades policiais para que pudessem agir e impedir ataques parecidos. A extração de informações dos equipamento eletrônicos de Fabiano também facilitou essa busca. Os nomes e a quantidade de estados não foram divulgados.
— Talvez conseguimos evitar danos maiores a outras pessoas. Não podemos divulgar essas informações pois são muito sensíveis. Não havia nada de concreto, nada que você pudesse dizer que havia um planejamento. A população não precisa ficar preocupada — disse Koerich.
O governo do Estado de SC também anunciou segurança remota e física nas 1.064 escolas estaduais de Santa Catarina.