Ressocialização
Em Charqueadas, apenados do regime semiaberto reformam escolas e lar de idosos
Iniciativa é realizada há três anos na Região Carbonífera e envolve presos do anexo da Penitenciária Estadual do Jacuí
Os preparativos para receber os alunos de volta na Escola Estadual de Ensino Fundamental Mineiro Nicácio Machado, em Charqueadas, ganharam reforço nas últimas semanas. Em mais um projeto de ressocialização realizado pela Penitenciária Estadual do Jacuí (PEJ)— a segunda maior prisão do Estado —, apenados do regime semiaberto reformam escolas e, mais recentemente, passaram a fazer a manutenção de um lar de idosos no município da Região Carbonífera.
Localizada na área central de Charqueadas, a escola conta com cerca de 130 alunos. Esta é a segunda vez que a direção recorre à PEJ para a realização de melhorias nas dependências da escola. Os presos, que já fizeram a reforma do telhado e, no ano passado, pintaram todo o prédio pelo lado de fora, atualmente se dedicam aos acabamentos dentro das salas de aula. Além de pintar paredes, consertam classes e quadros, deixando tudo preparado para o início do ano letivo.
A diretora Márcia Luciana Schonhofen relata que a escola sempre teve bastante demanda de serviços, e nem sempre era possível dar conta de tudo com a verba disponível. Foi quando ficaram sabendo que a PEJ mantinha esse projeto, que permite a algumas instituições solicitar mão de obra prisional de forma gratuita.
— Não teríamos como fazer tudo isso com a mesma celeridade. Acredito que é bom para todos os lados. Tanto para a sociedade, que está vendo que eles estão doando um pouco deles, e, ao mesmo tempo, os nossos alunos, que valorizam muito mais. Depois que a pintamos a escola ano passado, não teve mais parede riscada. Estamos fazendo um trabalho de conscientização de manter a escola bonita — diz a educadora.
Entre outras tarefas realizadas pelos detentos neste ano, está a reestruturação da pracinha, onde inclusive instalaram dois balanços novos nesta quinta-feira (20), demarcação da quadra de esportes e limpeza do terreno. O trabalho iniciou na segunda-feira (17) com quatro apenados e deve seguir até o fim do mês. Pelo menos mais uma escola de Charqueadas já solicitou os serviços dos presos para este ano.
Da mesma forma, no Asilo Sociedade Lar Esperança e Sabedoria, que atende 52 idosos em Charqueadas, os presos iniciaram os trabalhos na semana passada. Esta é a primeira vez que o lar conta com este serviço. Outros quatro detentos estão realizando pinturas e reformas em paredes, melhorias hidráulicas, jardinagem, reforma de ventiladores, entre outros.
— Nossa entidade foi criada em 1987, e a direção é toda voluntária. Essa parceria está excelente, acima da expectativa. Para os presos, também é um ganho, acumular esse conhecimento. Além da parte social, tem isso de poderem enxergar o lado dos idosos, de ajudar o próximo e se ajudar. Tenho pensamento que deveria ser usado para vários asilos, escolas, creches. Seria uma mão de obra, que se torna barata, e o preso também ganha nessa parte social — diz o presidente do asilo, Pedro Edson Rosa Ataia.
Mais empatia
No caso do asilo, a administração do local vai remanejando os idosos para que os quartos possam ser reformados. Já nas escolas todas as obras são realizadas no período de férias. Em todos os casos, o trabalho é fiscalizado por policial militar, que realiza a custódia dos presos. Os apenados chegam aos locais durante a manhã e permanecem até o fim da tarde.
No anexo da PEJ, onde atualmente há 76 apenados, todos estão envolvidos em alguma atividade de trabalho, seja dentro da casa prisional ou nesses locais na comunidade. Para os trabalhos nas escolas e no asilo, são selecionados de acordo com as demandas e os perfis de cada um.
— Estar num ambiente escolar traz esse vínculo com a família. Muitos têm filhos, e poder como hoje instalar esse balanço que as crianças vão usar, isso traz uma empatia emocional, desperta memórias. A mesma coisa no asilo, onde eles lembram dos familiares. Traz esse impacto afetivo — afirma o tenente José Fernando Pinheiro da Silva, um dos responsáveis por manter o projeto no anexo da PEJ.
Esta não é a única iniciativa de trabalho realizada na penitenciária. Em dezembro, GZH mostrou que uma usina de reciclagem funciona dentro da casa prisional. No ano passado, mais de 46 toneladas de resíduos foram recicladas no local. No caso dos trabalhos nas escolas e asilo, os presos não são remunerados, mas igualmente recebem a remissão da pena (a cada três dias de trabalho, um é descontado).
— Os presos se sentem valorizados, fazendo algo útil para as demais pessoas. Se sentem bem por estarem lá. É uma ação em que todo mundo ganha. Ele sai do ambiente prisional, vai para ambiente escolar, lembra do tempo que ele estudou. Acho que até que, se analisar, o preso é quem ganha mais. Ele se revigora, para a autoestima dele é muito bom. Buscamos que eles encontrem dignidade fazendo algo que é bom para ele e para todos — diz o diretor da PEJ, major Fabiano Dorneles.