Vale do Sinos
Polícia investiga se há envolvimento de empregados de distribuidora em furto de energia para mineradora de criptomoedas
Ação no início do mês constatou desvio de luz para abastecer equipamentos que faziam geração de moeda digital
A Polícia Civil investiga se empregados da concessionária RGE podem ter ajudado a fazer uma ligação de energia elétrica irregular em um sítio que funcionava como central mineradora de criptomoedas no interior de Morro Reuter, no Vale do Sinos.
Uma ação foi deflagrada no último dia 1º e constatou o desvio de luz para abastecer os equipamentos que faziam a geração de moeda digital. Conforme estimativa da RGE, a medição indicou que o consumo de energia na propriedade chegaria a R$ 100 mil mensais, se ocorresse de forma regular.
De acordo com o delegado de Dois Irmãos, Felipe Borba, responsável pelo inquérito, o furto de energia era feito de um poste da RGE que passa pela propriedade. A mineração de criptomoedas é uma atividade regular, mas, segundo o delegado, as ligações elétricas clandestinas na chácara configuram crime de furto qualificado de energia.
— Estamos trocando informações e em contato com a RGE para tentar esclarecer se há ou não envolvimento de funcionários da distribuidora ou de empresas terceirizadas contratadas por ela nesse esquema de furto de energia. Também buscamos identificar se há mais pessoas que tenham participado dessa ação, que possam ter ajudado nessa instalação elétrica ou que tenham se aproveitado dela — detalha.
A RGE afirma somente que "está auxiliando as autoridades policiais, com o objetivo de esclarecer os fatos" e que "aguarda pelos resultados da investigação policial". Segundo o delegado, o advogado do responsável pelo sítio havia informado que procuraria a concessionária para quitar o débito, mas a RGE não informa se houve contato.
Um laudo do Instituto-Geral de Perícias do Estado (IGP), que participou da ação, foi enviado à polícia na segunda-feira (14) e comprova que houve desvio de energia no local, segundo o delegado. Entre outros detalhes, o documento indica que não havia medidor de consumo de energia no espaço, o que impossibilita a tarifação.
No dia 1º, quando ocorreu a ação, a polícia cumpriu mandado de busca e apreensão na chácara. Foram encontradas 106 máquinas atuando na mineração de criptomoedas, cada uma avaliada em cerca de R$ 9 mil, conforme a polícia. Um transformador, com valor estimado em R$ 100 mil, também foi apreendido.
O maquinário foi localizado no interior de uma construção, que se assemelhava a um bunker e contava com um complexo sistema de cabeamento. O delegado estima que o investimento em estrutura e equipamentos utilizados ultrapassee R$ 1 milhão.
Na ação, duas pessoas foram presas em flagrante. Um dos detidos é o proprietário da chácara, pelo crime de furto qualificado de energia elétrica. O homem, que é empresário do ramo da indústria com atuação em Dois Irmãos e Campo Bom, foi localizado em uma de suas empresas. Ele foi liberado no dia seguinte, depois que a Justiça concedeu liberdade provisória. GZH tenta contato com a defesa dele.
O outro homem foi preso em flagrante por posse ilegal de arma de fogo, já que a polícia encontrou um revólver municiado em uma residência na chácara. O homem estava no sítio no momento da ação e foi identificado como chacreiro contratado para cuidar do local. Ele pagou fiança e foi liberado pouco depois da prisão.
A apuração começou no final de 2021, após denúncias anônimas que relatavam que a atividade desenvolvida no local estaria prejudicando o abastecimento de energia elétrica na região, provocando quedas de luz. Ao longo da investigação, um constante ruído vindo da propriedade também chamou a atenção, assim como a contratação de duas empresas de internet para prestar serviço e a adquisição de máquinas para a mineração.
Objetivo de empresário era lucrar com criptomoedas
Apesar de a investigação policial já indicar que o local operava como mineradora de criptomoedas, o cenário visto no sítio teria surpreendido as equipes em razão da estrutura e maquinário encontrados, afirma o delegado. O objetivo do empresário seria lucrar com a aquisição de moedas digitais.
Criptomoeda é uma moeda digital que não é emitida nem controlada por governos e bancos. São basicamente linhas de código criptografadas, que só podem ser acessadas com as chaves de cada usuário. A transação com essas moedas é feita entre os agentes que as detêm, de forma totalmente online. Há diferentes tipos de criptomoeda — o bitcoin é o mais conhecido.
As criptomoedas podem ser compradas no mercado financeiro, com pagamento em moeda corrente, ou obtidas por meio da mineração, processo que permite que novas unidades de uma criptomoeda sejam geradas. Para isso, computadores precisam solucionar problemas matemáticos. Quando são resolvidos, o minerador recebe uma determinada quantidade de moeda digital.
— Minerar é resolver esses protocolos criptográficos que garantem a veracidade das informações. Então, os mineradores estão competindo para resolver esses protocolos o mais cedo possível. Assim, ele é remunerado: as moedas são criadas e vão pra a conta do minerador — explica o gestor de renda variável da Warren Eduardo Grübler.
Há dois custos principais para trabalhar com essa atividade: o investimentos em equipamentos e o gasto com energia elétrica.
— Essas máquinas precisam de muita energia, porque elas estão computando, fazendo cálculos, em uma velocidade muito, muito rápida. Por isso, essa atividade costuma ser realizada em lugares em que o custo com energia é mais barato, como na Sibéria e na Islândia. É comum que quem trabalha com isso migre para essas regiões — pontua Grübler.
Segundo o gestor, é possível chegar ao valor que recebido pelo empresário de Morro Reuter, mas seria necessária um perícia trabalhosa.
O delegado afirma que, no dia da prisão, o empresário teria confidenciado, informalmente, que a usina lhe rendia o equivalente a R$ 12 mil por mês, o que será investigado. A polícia irá apurar também se outros delitos, além do furto de energia, podem estar relacionados ao caso, como lavagem de dinheiro.
Informações que possam ajudar nas investigações podem ser passada para a polícia, de forma anônima, pelo WhatsApp (51) 98543-7318 ou pelo telefone (51) 3564-1190.