Força-tarefa Cyber
Trabalho de inteligência e retirada de perfis do ar: como a polícia combate golpes envolvendo a enchente no RS
Força-tarefa foi montada para apurar esse tipo de crime e identificou, até o momento, 40 casos de estelionatos e fraudes, além de 11 casos de fake news ou difamação
No início de maio, uma influenciadora digital gaúcha criou uma campanha e divulgou uma chave Pix pedindo doações para as vítimas da enchente. A ação era legítima e a conta era vinculada à mulher. No entanto, criminosos criaram outras chaves similares, mudando apenas um dígito, para se aproveitar daqueles que, porventura, errassem na digitação. Embora sutil, a estratégia conseguiu desviar valores de doações e foi descoberta pela polícia, assim como outros esquemas bem menos discretos.
Pedidos falsos de doações, chaves Pix adulteradas e casos de fake news inundaram os canais de denúncia da Polícia Civil durante a enchente que atingiu o RS no último mês. Enquanto pessoas de todo o país se mobilizavam para ajudar as vítimas da cheia, criminosos se aproveitaram do momento delicado enfrentado pelo Estado para aplicar golpes.
Com o objetivo de coibir a ação dos bandidos, os órgãos de segurança pública montaram a Força-Tarefa Cyber para investigar este tipo de denúncia. Dados do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) apontam que, até o momento, 40 casos de golpes e fraudes, além de 11 casos de fake news ou difamação foram identificados. Além disso, foram instaurados 31 inquéritos e 41 medidas cautelares foram obtidas.
Também foram efetuadas três prisões preventivas e cumpridos cinco mandados de busca e apreensão. Durante as investigações, 21 sites, 18 contas bancárias e 39 perfis em redes sociais utilizados pelos criminosos foram derrubados.
Segundo o delegado João Vitor Herédia, titular da Delegacia de Repressão aos Crimes Informáticos e Defraudações (DRCID), as 39 publicações em redes sociais somavam 80 milhões de visualizações.
Após a identificação da origem das publicações, o Deic solicitou via judicial às plataformas e servidores a derrubada dos sites e perfis. Segundo a delegada Vanessa Pitrez, diretora do Deic, as redes sociais mais usadas pelos criminosos foram o Instagram e o X (antigo Twitter), embora também houvesse posts no Tik Tok e Facebook.
Combate às fake news
A disseminação de informações falsas foi outro ponto combatido pela polícia durante a operação. Conforme o delegado João Vitor Herédia, as fake news repassadas atrapalham os órgãos empenhados no auxílio aos desabrigados, como a informação falsa de que a Defesa Civil não estaria distribuindo alimentos recebidos ou que as marmitas doadas precisariam passar por avaliação de nutricionista.
— Essas publicações, de fato, estavam atrapalhando, porque estavam evitando o recebimento de Pix pelo governo e evitando o recebimento de doações pela Defesa Civil para repasse. Tudo por causa de fake news, então, essa foi uma frente que a gente trabalhou também — pontua o delegado.
Trabalho de inteligência
O maior volume de golpes e fraudes foi identificado entre os dias 5 e 10 de maio. O pico ocorreu no dia 7, quando houve 13 registros. No dia 8, foram 11 ocorrências. Herédia comenta que assim que reduziu a quantidade de casos, principalmente de fake news, as equipes de inteligência da Polícia Civil se debruçaram sobre a identificação dos criminosos.
Ele lembra que, em um primeiro momento, a atuação da polícia ficou limitada, pois a sede do Deic, localizada no bairro São João, foi destruída pela enchente. Já realocados no prédio da antiga sede da CEEE, as investigações puderam ser retomadas.
— Então a gente começou a trabalhar, a identificar quem eram os proprietários dessas chaves pix, começou a pesquisar com técnicas de inteligência para chegar às autorias. Conseguimos acessos junto às empresas de telefonia e de internet para identificar e constatar que se tratava de fraude. A partir daí, começamos a pedir os mandados e criar as operações — explica.
A delegada Vanessa Pitrez frisa que além do Deic, todas as delegacias têm suas divisões de inteligência, que são responsáveis pela coleta e aprimoramento de informações e fornecimento de subsídios às equipes que atuam nas ruas. Segundo ela, esse trabalho integrado foi fundamental para que as contas fossem identificadas e os perfis derrubados.
— O que a gente tira de lição dessa operação é que o trabalho baseado na troca de informações e no uso da inteligência policial como ferramenta de investigação surte efeito de forma mais rápida e eficaz.
Quadrilhas usam adolescentes
O trabalho da força-tarefa resultou em duas operações que desarticularam esquemas com braços fora do RS. Em ambos os casos, adolescentes eram usados para operacionalizar os golpes.
No dia 15 de maio, a Polícia Civil cumpriu três mandados de prisão preventiva contra um grupo suspeito de aplicar golpe do Pix falso, que simulava doações para as vítimas das enchentes. Durante a Operação Dilúvio Moral, um homem e uma mulher foram presos na cidade de Santo André, em São Paulo.
O grupo criou perfis falsos nas redes sociais que imitavam publicações com a chave Pix oficial do governo do Estado remetendo as doações para as contas dos bandidos. Quem gerenciava o golpe era um adolescente de 17 anos.
No dia 27 de maio, o Deic identificou uma cobertura de alto padrão na beira-mar em Balneário Camboriú, Santa Catarina, com aluguel de R$ 30 mil, que funcionava como um tipo de QG, usado para aplicar golpes pela internet. Entre as trapaças, está a que simulava campanhas de doações para as vítimas da cheia. No imóvel, a polícia localizou um adolescente de 16 anos, que já era alvo de investigação. Além dele, mais dois suspeitos, um de 17 e outro de 20 anos, foram identificados.
Segundo a diretora do Deic, nos casos de estelionato virtual, é comum que os grupos criminosos se aproveitem de adolescentes, em razão da sua familiaridade com as redes sociais e sistemas cibernéticos, além da certeza de que não serão presos.
— Os casos mais elaborados, como aqueles que envolvem criptomoedas, por exemplo, exigem um conhecimento cibernético maior, por isso, são aplicados por pessoas mais jovens. Já o golpe dos nudes, por exemplo, é mais simples e os envolvidos variam de faixa etária — explica Pitrez.
Força-Tarefa Cyber
- 40 suspeitas de golpes e fraudes
- 41 medidas cautelares obtidas
- 31 inquéritos abertos
- 11 por fake news
- 18 contas bancárias bloqueadas
- 39 perfis retirados do ar
- 21 sites retirados do ar
- 3 presos
*Resultados compilados até as 16h do dia 5 de junho de 2024.
Dicas
- Não compartilhe notícias das quais não tem certeza sobre a veracidade da informação. Busque confirmar as informações que recebe por conversas de WhatsApp, por exemplo, em canais oficiais e pela imprensa.
- Quem compartilha e dissemina as notícias falsas também pode ser responsabilizado por isso, não somente aquele que criou a informação falsa.
- Verifique a confiabilidade da campanha para onde pretende doar algum valor. Na hora de realizar e concluir o pagamento, via Pix, por exemplo, confira se a conta e o destinatário do valor é a mesma pessoa física ou jurídica que solicitou a doação.
- Se não souber para quem doar, busque campanhas oficiais, como do governo do Estado, por meio da campanha SOS Rio Grande do Sul.
- Também é possível acessar o portal “Para quem doar”, que faz a certificação de credibilidade das campanhas.
- Informe a polícia sobre casos de suspeita de golpes ou mesmo de divulgação de fake news.
Fonte: Polícia Civil – RS
Como denunciar
Caso seja vítima de algum golpe ou perceba que uma página ou perfil está disseminando notícias falsas, registre o fato na Polícia Civil. Só assim será possível investigar os crimes e chegar aos responsáveis. A comunicação pode ser feita por meio dos números 197, 181 ou no (51)98444-0606. Também é possível registrar ocorrência nas delegacias ou pelo site da Delegacia Online.