Barbárie em terreno abandonado
Os crimes que levaram a uma sentença de quase meio século de prisão em Canoas
Caseiro de fábrica desativada foi condenado por três homicídios em caso descoberto no final de 2019, quando a polícia encontrou corpos carbonizados, esquartejados e enterrados em uma área de mata
Uma série de crimes com contornos macabros, descoberta em 2019, chegou a um desfecho em Canoas. O Tribunal do Júri condenou um homem a 49 anos e oito meses de prisão por homicídio e ocultação de cadáver de três pessoas. Lacir Lopes, de 47 anos, era caseiro de um terreno onde as vítimas — uma colega de trabalho, um vizinho e o próprio sobrinho do réu — foram mortas e enterradas. O julgamento dele ocorreu na última quinta-feira (22).
Os primeiros crimes foram cometidos em meados de abril de 2018, mas as mortes só foram descobertas um ano depois, no final de 2019, quando os corpos enterrados foram encontrados, carbonizados e esquartejados. Segundo a denúncia do Ministério Público (MP), Lacir matou as vítimas espancadas, esquartejou e queimou os corpos antes de enterrá-los.
Em um dos casos, o homem teve a ajuda de um comparsa, que também foi condenado no júri, e de seu sobrinho, que depois virou sua vítima.
Durante as investigações, Lacir confessou à Polícia Civil a autoria dos três assassinatos. Pelos policiais, foi descrito como "um homem quieto, frio, que não altera o tom de voz ou demonstra violência". Ele não tinha relações próximas com a família e morava sozinho.
Antiga fábrica foi o cenário dos crimes
O réu era caseiro de uma antiga fábrica desativada que fica nas proximidades da Avenida Guilherme Shell. Todas as vítimas conviviam de alguma maneira com Lopes naquele local. Foi lá que os crimes aconteceram e onde os corpos foram enterrados.
Leila dos Santos Miguel, 35 anos, era colega de trabalho dele e foi sua primeira vítima, em abril de 2018. Conforme a denúncia do MP, o réu acreditava que a mulher teria furtado do imóvel bens de pequeno valor. Lopes chegou a registrar uma ocorrência contra ela no mesmo ano, queixando-se que Leila teria subtraído itens como furadeira, esmeril e bujão de gás. Teria sido a suspeita de furto que motivou o homicídio.
Outro homem, que não teve o nome divulgado, foi acusado de ser comparsa do autor na morte da mulher. Ele foi condenado por lesão corporal seguida de morte, com pena de quatro anos de reclusão.
O sobrinho do caseiro, Gilmar Pedro Rodrigues de Oliveira, 29 anos, também teria participado do assassinato de Leila. Depois, ele teria ameaçado denunciar o caso à polícia e, assim, se tornou a segunda vítima de Lacir. Gilmar foi morto ainda em abril de 2018.
A terceira morte foi de Marcelo Gomes Franceschina, 25 anos, que estava morando em uma edificação no terreno cuidado por Lacir. O crime teria acontecido após uma discussão entre Marcelo e Lopes.
Segundo o promotor Rafael Russomanno Gonçalves, que atuou em plenário, todas as mortes foram violentas:
— Os jurados reconheceram que todos os crimes foram praticados por meio cruel, ante a violência e brutalidade das agressões que causaram a morte das vítimas, sempre com repetidos golpes de instrumento contundente, como pauladas e barra de ferro.
Descoberta dos corpos
Segundo o promotor, outras pessoas tinham conhecimento ou suspeitas dos crimes cometidos por Lacir. Uma delas seria a irmã de Marcelo. Quando o jovem desapareceu, em novembro de 2019, a irmã procurou a polícia e fez uma denúncia.
— Quando ele não apareceu mais e nem deu notícia, ela logo imaginou o que poderia ter ocorrido — disse o promotor.
As informações dadas por ela forneceram uma linha de investigação, que culminou na localização dos três cadáveres e na prisão dos suspeitos.
— Não fosse isso, talvez a polícia não tivesse descoberto e quem sabe até poderiam ter ocorrido mais mortes — afirma o promotor.
Os corpos foram encontrados após escavações e uso de cães farejadores, entre novembro e dezembro de 2019. Lacir esteve preso desde então.
Linha do tempo
Abril de 2018
- Leila dos Santos Miguel é assassinada por Lacir Lopes com ajuda de outro réu e de seu sobrinho, Gilmar Pedro Rodrigues de Oliveira.
- Gilmar entra em conflito com o tio sobre a morte de Leila. O MP estima que ele tenha sido assassinado ainda em abril de 2018.
Novembro de 2019
- Dia 23: a família de Marcelo Gomes Franceschina comunica o desaparecimento dele à polícia. Uma irmã da vítima revela suspeitas sobre Lacir Lopes.
- Dia 30: A Polícia Civil obtém um mandado de busca e vasculha o local, com peritos, bombeiros e cães farejadores. Os corpos Leila e Marcelo são encontrados, enterrados e carbonizados. Lopes é preso.
Dezembro de 2019
- Dia 3: A polícia, a perícia e os bombeiros voltam ao local e localizam a terceira ossada. Exames de DNA confirmariam ser de Gilmar.
Agosto de 2024
- Dia 22: Lacir Lopes é condenado a 49 anos e oito meses de prisão pelos três homicídios qualificados e três ocultações de cadáver. O cumprimento inicial da pena é em regime fechado.
Contraponto
A reportagem de Zero Hora entrou em contato com a Defensoria Pública, que representa os homens condenados, mas não recebeu retorno até a publicação desta reportagem.
* Produção: Camila Mendes