Zona Leste
Mãe de adolescente assassinado em Porto Alegre espera há seis meses por respostas; policial civil é investigado
João Vitor Macedo, 15 anos, morreu após ser baleado no Beco dos Marianos, no bairro Agronomia. Garoto foi encontrado ferido na noite de 28 de março. Um agente confirmou ter atirado na direção dele
Juliana Lopes Macedo, 34 anos, não conseguiu se desfazer de nenhum pertence do filho. João Vitor Macedo, 15, morreu após ser baleado no bairro Agronomia, na zona leste de Porto Alegre, há seis meses.
Um policial civil confirmou ter atirado na direção dele, e uma investigação foi aberta para apurar as circunstâncias da morte. A Polícia Civil afirma que ainda aguarda o resultado da reprodução simulada dos fatos — popularmente conhecida como reconstituição — para poder concluir o caso.
João Vitor foi alvejado no Beco dos Marianos, próximo à Avenida Bento Gonçalves, no dia 28 de março. Imagens de uma câmera de segurança flagraram uma viatura da Polícia Civil entrando no beco, logo após ele e outro adolescente correrem naquela mesma direção. O veículo deixou o local logo depois.
Socorrido por um pastor e por familiares, João Vitor foi levado para atendimento médico. No trajeto até o Hospital de Pronto Socorro (HPS), o próprio adolescente disse, segundo a família, que havia sido baleado por um policial civil. Ele não resistiu aos ferimentos e morreu no mesmo dia.
A Corregedoria da Polícia Civil iniciou uma investigação para elucidar como aconteceu a morte do adolescente. O policial, suspeito de ter baleado o garoto, foi identificado e, quando ouvido, confirmou ter atirado na mesma direção dele.
A polícia passou a apurar se foram os disparos do policial que alvejaram João Vitor e como isso aconteceu. Desde então, a família aguarda por respostas e pelo encerramento da investigação.
— É uma dor diária. Faz seis meses já. É muito tempo sem meu filho. Não quero que ninguém sinta o mesmo que estou passando. Não tirei nada dele de dentro de casa. Parece que em algum momento ele vai sair de dentro do quarto dele. É um vazio — diz a mãe, que visita toda semana o túmulo do filho no Cemitério Jardim da Paz.
No último dia 28, quando completaram seis meses da perda de João Vitor, não foi diferente. Desde a morte do adolescente, Juliana coordenou um protesto para despertar atenção para o caso e tem buscado acompanhar a evolução das investigações. Um dos pontos questionados pela mãe é o fato de João Vitor não ter sido socorrido.
— Se meu filho estava fazendo algo de errado, ou se ele (policial) pensou que estava, ele, ainda assim, tinha o direito de ser socorrido. Ele teria uma chance de estar vivo — desabafa.
Reconstituição
Na noite de 5 de agosto, foi realizada a primeira etapa da reconstituição, somente com a participação do policial civil. Juliana não havia sido informada sobre essa parte da perícia, mas, ao saber da movimentação no local, foi até o bairro Agronomia para acompanhar o andamento.
Na mesma semana, em 9 de agosto, as testemunhas que auxiliaram no socorro do adolescente passaram pela mesma reprodução simulada. Mais uma vez, a mãe acompanhou a perícia, que se estendeu ao longo da tarde e da noite.
O intuito da reprodução é compreender se as versões ouvidas durante a investigação são compatíveis com a realidade. Para isso, cenários são reproduzidos e testados pelos peritos, que verificam se o relato é condizente. É um tipo de técnica comum quando se tem dúvidas sobre a forma como se deu a dinâmica dos acontecimentos.
Durante a reconstituição, as pessoas envolvidas são ouvidas, as versões são verificadas e tudo é registrado. Depois, cabe à perícia fazer a análise de todo material coletado e produzir um relatório com o resultado.
Segundo o chefe da Polícia Civil, delegado Fernando Sodré, a corporação aguarda o resultado desses laudos para poder concluir a investigação do caso.
— Ainda não está pronta a perícia devido à complexidade — diz.
Segundo o Instituto-Geral de Perícias (IGP), "o laudo encontra-se em redação e, devido à complexidade dos exames e das diversas versões", não há como estimar data para a conclusão. O policial civil foi afastado das atividades, em razão de licença de saúde.
Vazio
João Vitor cresceu no bairro Ipanema, na zona sul de Porto Alegre. O adolescente residia com a mãe e os irmãos, mas, quando foi morto, estava morando havia 28 dias na casa da avó paterna, no bairro Agronomia.
— Vou sobrevivendo. Acredito que um dia vou ter uma resposta e não vou descansar enquanto não tiver — afirma a mãe.
O caso
- Protesto – No dia 2 de abril, a família fez uma manifestação, com pedidos de justiça, e fechou a Avenida Bento Gonçalves. Foi quando a morte de João Vitor se tornou pública. No mesmo dia, o chefe da Polícia Civil confirmou a existência de indícios que apontavam para a possível participação de policiais na morte.
- Falta de socorro – A mãe de João Vitor diz que o filho já havia cumprido medida socioeducativa e acredita que, em razão disso, ele tenha escapado correndo. Um dos pontos questionados pela família, que deve ser esclarecido pela investigação, é por qual motivo o policial não acionou o socorro após atirar na direção do adolescente. O garoto foi levado ao hospital por populares.
- Coletiva – No dia 12 daquele mês, a Corregedoria da Polícia Civil afirmou em coletiva que um agente havia confirmado ter atirado na direção do adolescente. Pelo que se apurou até o momento, o policial teria disparado três vezes. As circunstâncias em que se deram os disparos passaram a ser apuradas. A promessa foi de que a investigação seria concluída em até 90 dias.
- Imagens – Uma câmera de segurança registrou cenas de João Vitor e outro adolescente correndo na Avenida Bento Gonçalves, indo ao Beco dos Marianos, e de uma viatura seguindo na mesma direção, com o giroflex ligado. Algum tempo depois, o outro garoto retorna correndo e o veículo da Polícia Civil deixa o beco. Neste momento, João Vitor já teria sido baleado. O veículo do Departamento de Polícia Metropolitana foi identificado, assim como o policial que estava nele.