Estelionato
"Me sinto fracassado": morador de Porto Alegre que perdeu R$ 1,8 milhão revela como agia falsa corretora de investimentos
Vítima, de 72 anos, relata que queria melhorar a rentabilidade do patrimônio construído na vida pública. Confira a entrevista

A busca por obter rentabilidade do patrimônio levou um aposentado do Rio Grande do Sul a perder R$ 1,8 milhão em um golpe de uma falsa corretora de investimentos. A história resultou, na semana passada, em uma operação da Polícia Civil gaúcha no Rio Grande do Norte, onde os suspeitos do esquema moravam.
O grupo se apresentava com uma assessoria internacional de investimentos vinculada a um dos principais bancos do mundo.

Os golpistas solicitaram depósitos à vítima e prometeram a valorização do patrimônio com a compra de ativos financeiros, o que nunca ocorreu.
Nesta segunda-feira (26), Zero Hora conversou com a vítima, de 72 anos, que mora no Litoral Norte e tem casa em Porto Alegre, onde buscou ajuda da polícia após descobrir o golpe, no início de 2024. O aposentado, que foi funcionário público por mais de 30 anos, pediu para não ser identificado. Leia abaixo a entrevista:
ZH: Por que o senhor buscou uma assessoria de investimentos?
Vi muitos comentários de pessoas que trabalham em casa, e quis arrumar algo assim para não “parar”. Fui pesquisando na internet, uma menina me ligou, disse ser captadora de investidores e que tinha uma empresa muito boa. Ela me passou os dados e me falou que uma pessoa me atenderia, e foi o que aconteceu.
Como foi o contato com o suposto assessor de investimento?
Era um homem de 52 anos, que disse ser nordestino e morador de Londres (Inglaterra). Ele contou que era formado em economia na UFRGS. Era um cara formidável, diferenciado, inteligente, experiente e sabia tudo de investimentos. No início, foi o melhor amigo que arrumei na minha vida. Dizia que teria US$ 100 milhões (aproximadamente R$ 567 milhões na cotação atual) na conta dele até dezembro de 2024.
Como foi o golpe?
Eles estabeleciam metas de investimento, então eu ia depositando e não podia sacar. Só operava acompanhado pelo analista, via o rendimento em dólar e fui me empolgando. Havia muitas promessas. A ideia era que eu pudesse retirar todo o valor no dia 20 de dezembro de 2023. Em novembro, comecei a sentir que era golpe. Quis parar e sacar, mas ele disse que eu iria perder tudo. Quando decidi parar, eu tinha US$ 1,3 milhão (aproximadamente R$ 7,3 milhões na cotação atual).
Qual a origem do dinheiro que foi investido?
Uma parte era das minhas economias. Depois, fui pegando empréstimos em vários bancos para atingir as metas deles, pois eu não tinha mais de onde tirar. Fui achando que estava certo; quando me dei conta, não podia recuar, pois falaram que ia perder tudo se parasse. Foi assim que acabei me afundando.
Qual o tamanho da dívida com os bancos?
Não gosto nem de falar o montante. Penhorei um apartamento para atingir uma meta final, que ele me prometia uma boa poupança e aposentadoria.
O que o senhor queria fazer com o rendimento do investimento?
Quem é que não quer uma vida boa? Pensava em usar o dinheiro para viajar, ajudar meus filhos e investir na minha empresa. Todo mundo quer ganhar dinheiro, essa é a verdade. Como eu tinha um pouco e ouvia falar que as pessoas ganhavam com isso (investimentos), pensei que o caminho seria por ali, mas acabei me dando mal.
Como o senhor se sente hoje após o golpe?
Eu me sinto fracassado. Cresci trabalhando na roça, venho de uma família pobre. Nasci na década de 1950, quando não havia energia elétrica, TV ou rádio; a vida era muito difícil. Passei em concurso público e segui carreira por mais de 30 anos. Minha vida foi toda de trabalho e batalhas para conquistar as coisas.
Que dica dar para quem procura investir?
Meu conselho é para que as pessoas tenham cuidado com a internet. Há muitas coisas sérias, mas me parece que falta fiscalização, o que deixa muitas brechas para bandidos e golpes. Essas pessoas conseguem fazer algo tão bem estruturado que parece uma coisa boa.