Violência urbana
"Eu fui para um samba, não para a guerra", diz mulher arrastada por carro em Porto Alegre; veja vídeo
Vítima assistia a um show no bairro Bom Fim quando teve a bolsa puxada por assaltantes em um carro e ficou pendurada por quase três quadras

Com lesões por todo o corpo e com os dois pés enfaixados, a vítima de um assalto no bairro Bom Fim, em Porto Alegre, relata o terror vivido no domingo (2). A psicóloga de 33 anos, que prefere não ser identificada, teve a bolsa puxada do corpo e saiu arrastada por um carro ao longo de quase três quadras.
Quatro dias depois, a mulher só consegue sair da cama com a ajuda do companheiro. Não consegue ficar em pé, pois é impossível tocar o chão devido à dor causada pelos ferimentos.
A vítima conta que estava junto de outras amigas assistindo a um show de samba na Rua João Telles, quase esquina com a Avenida Osvaldo Aranha, quando, às 19h46min, um Logan prata com dois homens passou pelo local. O carona tentou arrancar a bolsa que ela usava.
— No trajeto, eu estava segurando a bolsa o tempo todo porque ela estava junto ao meu corpo e era tudo o que eu tinha para me agarrar. A jaqueta protegeu bastante de eu não ficar ainda mais machucada. Ele dava facadas na minha mão e no meu braço com o carro em movimento e gritava: "Solta que tu vai morrer, tu vai morrer" — conta.
Pouco antes da Rua Garibaldi, ela se desvincilhou, e o veículo dos assaltantes saiu em fuga levando a bolsa com celular e cartões da vítima. Imagens de câmeras de segurança (veja o vídeo acima) mostram pessoas correndo e gritando entre os carros pela avenida. Um carro que vinha logo atrás parou, e o motorista prestou socorro. A mulher foi levada para atendimento no Hospital de Pronto Socorro (HPS).
O contato do corpo com o asfalto resultou em lesões nas costas, barriga, pernas e braços. Os pés foram os mais atingidos. Ela também precisou fazer pontos em uma das mãos por conta dos ferimentos de faca.
Foi tudo tão rápido que eu não consigo lembrar. Talvez durou um minuto, eu não sei. Meu único raciocínio foi pensar como eu poderia me soltar do carro em movimento. O medo era eu parar debaixo do carro ou ser atropelada pelos outros que vinham atrás na avenida.
PSICÓLOGA, 33 ANOS
Vítima de assalto no Bom Fim
Amigas em desespero e prestação de socorro
Uma das amigas mora na rua onde tradicionalmente ocorre shows aos finais de semana. Naquele fim de tarde, também aproveitava o samba e presenciou a ação dos assaltantes. O grupo de amigas correu por três quadras implorando que os criminosos cessassem a ação.
— Saí atrás do carro e gritei pelo nome dela. Outras pessoas começaram a correr comigo gritando, gritando, e eles arrastando minha amiga. Quando ela se soltou, a recolhemos para a calçada. Estava com a jaqueta toda rasgada dos golpe de faca e os pés muito machucados. Fiquei traumatizada e não consegui dormir, nem pensar em outra coisa – conta a amiga, que também quis ter a identidade preservada.
Outra mulher, que coincidentemente tem bolsa idêntica à que a psicóloga usava no dia, e também falou com Zero Hora sob anonimato, relembra:
— Olhei para o carro e ela já estava sendo arrastada. Meu corpo ficou inerte de medo. Mas quando vi, eu já estava na Santo Antônio. Foi tudo muito rápido. Era todo mundo correndo sem entender, uns achando que era briga. Sigo tentando montar as imagens do que aconteceu, foi um horror.
Homem parou o carro para ajudar
Um bancário de 43 anos saiu de casa no último domingo com o mesmo objetivo: ir ao show de rua no bairro Bom Fim. Próximo ao local, presenciou a ação dos criminosos. Ele seguiu de carro pela Avenida Osvaldo Aranha e estacionou. A cena da mulher sobre o meio-fio ainda causa revolta.
— Ela estava atordoada, em choque e sentada sem conseguir falar muita coisa. As amigas chegaram e ofereci para levá-las ao hospital. É uma coisa que não pode acontecer: alguém estar no seu momento de lazer no final de um domingo e passar por tudo isso.
A imagem do que aconteceu está difícil de sair da minha cabeça. É absurdo e chocante.
HOMEM DE 43 ANOS
que prestou socorro à vítima
Criminosos ainda não foram identificados
Assim que saiu do hospital, a psicóloga registrou ocorrência policial. A 17ª Delegacia de Polícia (DP) investiga o caso.
Conforme o delegado Daniel Ordahi, responsável pela investigação, já foram solicitadas imagens de câmeras aos estabelecimentos próximos de onde começou a ação dos criminosos e ao longo da via por onde a mulher foi arrastada. A polícia informou que segue em oitivas para identificar a autoria do crime.
Vim de Ijuí e minha vida é em Porto Alegre há quase três anos, meu trabalho é aqui. Mas agora como fica? Tenho repensado. Eu saí de casa com minhas amigas para me divertir. Saí para ir em um samba, não para uma guerra.
VÍTIMA DO ASSALTO
Assaltos no Bom Fim reduziram 24%
A violência sofrida pela psicóloga não retrata o dia dia do Bom Fim, que teve redução de assaltos, segundo a Brigada Militar.
Conforme o 9º Batalhão de Polícia Militar (9º BPM), o ano de 2024 teve 106 ocorrências registradas, 24% a menos do que em 2023 e 50% a menos do que em 2022.
— A queda nos últimos anos reflete o trabalho dedicado, ações preventivas, aumento do policiamento ostensivo e resposta rápida às demandas da comunidade. Seguiremos firmes no propósito de reduzir ainda mais os índices criminais e garantir tranquilidade aos moradores e frequentadores do bairro Bom Fim – afirma o tenente-coronel Hermes Völker, comandante do 9⁰ BPM.
De janeiro a outubro deste ano, segundo a Brigada Militar, já foram 75 casos de roubo a pedestres no Bom Fim. Os dados também mostram os bairros com maior número de ocorrências, e o Centro Histórico lidera o ranking, com 759 casos.