Justiça Federal
Taurus é condenada a pagar R$ 10 mil a cada voluntário que resgatou armas de aeroporto no lugar de crianças durante enchente no RS
Inicialmente, os voluntários pediram indenização por danos morais de R$ 1,2 milhão; a União, que também era ré no processo, foi absolvida


A Justiça Federal condenou a fabricante de armas Taurus a pagar indenização de R$ 10 mil para cada um dos seis voluntários que participaram de uma operação que retirou armas do aeroporto de Porto Alegre durante a enchente histórica no Rio Grande do Sul, em maio de 2024.
Os voluntários teriam sido induzidos a acreditar que resgatariam crianças ilhadas. Inicialmente, eles pediram indenização por danos morais de R$ 1,2 milhão.
Em nota, a empresa afirma que não houve qualquer coação e que recorrerá da decisão (leia a íntegra abaixo).
De acordo com a sentença, a informação foi repassada em áudios enviados em um grupo de WhatsApp na noite de 8 de maio. A mensagem dizia que a missão era urgente e sigilosa para salvar crianças, considerada uma das prioridades do Estado. A condenação é em primeira instância, e cabe recurso.
Ao chegarem ao ponto de encontro, em Canoas, os voluntários teriam descoberto que a operação tinha outro objetivo: retirar um estoque de armas da Taurus, que estava ilhado no aeroporto Salgado Filho.
Ainda segundo a decisão judicial, uma funcionária da empresa informou que o sigilo era para evitar que facções criminosas soubessem da carga.
O juiz Rodrigo Machado Coutinho entendeu que houve violação da boa-fé objetiva no primeiro momento, quando os autores se mobilizaram sob falso pretexto.
"A indução em erro limitou-se ao deslocamento e à quebra de expectativa", escreveu.
Em audiência, um dos voluntários relatou o momento em que descobriu a verdadeira missão.
— Foi quando eles apresentaram as armas pra gente, não ostensivamente, mas estavam portando armas, e falaram pra gente assim, ó: "ou vocês vão com a gente, ou vocês vão ficar aqui sob observação até o final da operação, porque agora vocês já sabem do que se trata".
Os voluntários alegaram coação. O juiz disse ter encontrado contradições, como postagens em redes sociais após a operação.
— Eu quis dar como se fosse uma satisfação pras pessoas que pra quem eu fui pedir ajuda, né? Pra salvar as crianças que de fato eu estava lá — afirmou um dos voluntários, em audiência.
A União, que também era ré no processo, foi absolvida. O magistrado entendeu que a Polícia Federal atuou corretamente para garantir a segurança da operação, considerada legal e necessária diante do risco de facções criminosas e do contexto de calamidade pública. Os voluntários e autores do processo foram condenados a pagar honorários de R$ 6 mil à União, divididos em partes iguais, mas a cobrança está suspensa porque eles têm gratuidade da justiça.
Contraponto
A Taurus se manifestou por meio de nota; leia a íntegra:
Sobre a matéria “Taurus é condenada após pessoas resgatarem armas em vez de crianças no RS”, veiculada no dia 03.12.2025 no UOL Notícias, em que se noticiou a sentença proferida pela Justiça Federal de Porto Alegre/RS, são necessários alguns esclarecimentos.
A sentença reconheceu que, ao contrário do alegado pelos autores da ação, não houve qualquer coação por parte da empresa. Os autores participaram voluntariamente da operação, utilizaram seus celulares, mantiveram contatos amistosos com colaboradores e demais presentes, inclusive após o evento.
O Juízo foi claro ao destacar que os autores se deslocaram por decisão própria, em veículos particulares, registraram imagens com seus celulares e mantiveram conversas em tom cordial com os demais participantes.
Também foi afastada a alegação de que os autores teriam sido expostos a risco anormal. A sentença registrou que a operação ocorreu em contexto de calamidade pública, com forte esquema de segurança coordenado pela Polícia Federal, além de escolta armada contratada pela própria Taurus para o transporte terrestre do material, sem qualquer risco indevido aos participantes.
Quanto à exposição dos autores na mídia, a sentença observou que a cobertura jornalística e a repercussão subsequente nas redes sociais não decorreram de atos da Taurus. Ao contrário, reconheceu-se a participação ativa dos autores na gravação e divulgação das imagens, razão pela qual não se atribuiu à empresa qualquer responsabilidade pela veiculação de suas imagens.
A Taurus também demonstrou que não determinou, autorizou ou controlou a convocação dos autores nem teve qualquer ingerência sobre eventuais mensagens trocadas em grupos de aplicativo. A empresa não criou, divulgou ou autorizou a divulgação de qualquer história falsa sobre a operação.
A Taurus tomará as medidas cabíveis decorrentes de informações difamatórias e inverídicas divulgadas na mídia a respeito da operação.
A empresa também recorrerá da sentença em relação ao ponto em que foi condenada. A empresa está confiante de que as instâncias superiores reconhecerão a inexistência de qualquer responsabilidade que lhe possa ser imputada.