Papo Reto
Manoel Soares: "A paulada"
Colunista escreve no Diário Gaúcho aos sábados
Peço que imaginem uma paulada na cabeça. Ela causa uma tontura imediata, e, depois que o impacto inicial passa, vem a dor. Essa dor perdura por um tempo, e aí começa a ficar roxo. Nesse momento, temos que analisar se essa paulada não causou hemorragia interna ou fratura.
Quando falamos do trauma gerado pelas chuvas, é a mesma coisa. Virar a página não é uma decisão, é um processo. Não adianta tentar fazer tratamento de choque, dizendo que a pessoa tem que se levantar e recomeçar. Isso não ajuda, aliás, só atesta como a pessoa está frágil. As pessoas, quando a água estava alta, imaginavam como estavam sua casa, mas existia a esperança de que não estivesse tão ruim. Quando a água abaixa, se deparam com a realidade. Esse impacto pode causar um trauma emocional a ser tratado. A pessoa precisa se observar e ser observada: amigos e parentes que estão mais estabilizados emocionalmente evitam deixar a pessoa sozinha e, quando ela quiser falar, eles ouvem.
Querer trazer fórmulas prontas gera na pessoa que está sofrendo uma dor dobrada, uma por viver o drama, outra por não conseguir superar o drama com a rapidez que exigem dela. Não podemos esquecer que existem medicamentos que podem ajudar a pessoa a superar esse momento, porém precisa ser com orientação médica, muitos remédios mexem com a pressão arterial, fluxo sanguíneo e outras situações que geram risco de vida.
Muitas pessoas que estão vivendo esse drama são idosas, isso agrava ainda mais, pois muitas não perderam só o bem material, mas pedaços preciosos de sua história de vida. Dar a essas pessoas acesso a amparo emocional é fundamental. Em alguns casos vai ser terapia, em outros amparo espiritual e até ambos, mas não podemos esquecer que existe um coração ferido e uma mente tomada pelo desespero. A chave é, antes de tudo, acolher e dar afeto. Mesmo que essa pessoa esteja agressiva, perdida ou apática, o afeto será percebido.