Asa Branca FC
Projeto social da Capital treina guris para jogarem na base; "Se não forem jogadores, cidadãos melhores eles vão ser"
No Intercap, zona leste da Capital, iniciativa usa futebol como ferramenta de transformação social para jovens


“Campão, barro na canela, é arte de chão, ouro de favela”. Até parece que Emicida e Mc Guimê escreveram essas linhas no Intercap, na zona leste de Porto Alegre, ao observar um treino do Vila Asa Branca FC.
Isso porque é na Praça Darcy Azambuja que cerca de 150 guris sujam as chuteiras e alimentam o sonho de se tornarem jogadores profissionais de futebol, com o apoio do projeto social. Mas para manter suas atividades, o projeto, que completa 25 anos em 19 de agosto, precisa de patrocínios.
Quem teve a ideia de preparar meninos das periferias da Capital para jogar profissionalmente em categorias de base foi Cristiano Moraes da Silva, hoje com 44 anos. Incomodado com falsas promessas criadas por outros treinadores e iniciativas, resolveu, no auge de sua juventude, virar esse jogo.
Os treinos começaram no alto do Morro da Cruz, em 2000, quando Cristiano tinha apenas 20 anos. Porém, pela ampla demanda de piás de outras localidades que tinham dificuldades de chegar lá, foi transferido para onde está até hoje.
Uma articulação foi feita com a prefeitura para que o campo da praça fosse emprestado durante as tardes e as manhãs de sábado para a ação.
— Vem guri da Bom Jesus, da Agronomia, da Conceição, da Tuca… Aqui é um acesso mais fácil — justifica o idealizador.
Cidadania entra na jogada
Para participar, Cristiano garante: é só chegar. Todos e todas que têm vontade de treinar são acolhidos pelo projeto, que não se resume a futebol.
Para além da bola e da goleira, a ação também atua construindo disciplina e respeito nos garotos, explica o treinador voluntário Oscar Gonçalves de Souza, 42 anos. E como todo projeto social, oferece uma oportunidade para que as crianças não caiam na criminalidade.
— Queremos manter eles aqui, porque assim a gente tem o controle. Muitos não têm pai, nem mãe, mas nós estamos aqui dando apoio — detalha Oscar, que completa:
— Se não for jogador, cidadãos melhores eles vão ser.
Igualdade
Na questão de disciplina, o preparador físico voluntário André Luiz Gama de Mello, 54 anos, é craque. Chamado carinhosamente de “general”, o ex-militar explica que é muito importante tratar os guris com o mesmo respeito que exige deles. Além disso, reforça a cobrança para que os atletas sigam na escola:
— Tem que estudar. Porque, se tu não estuda, se tu não quer aprender alguma coisa, tu não vai aprender tudo aqui dentro.
Outra lei essencial dentro do Asa Branca FC é a da igualdade. Dentro do campo, são todos iguais, independente de onde vieram. Porém, no início, foi difícil para que alguns entendessem isso, detalha Oscar:
— Os que eram da Bom Jesus não se davam com os da Conceição, por exemplo, e queriam brigar. Mas hoje em dia, um vai na casa do outro. A gente tem que estar sempre orientando. Porque se faltar a orientação, um fim de semana estraga a criança.
De Porto Alegre para o mundo

O meia-atacante Kauan Natel, do Campo da Tuca, e o lateral-direito Jackson Rosa, da Vila Conceição, ambos com 18 anos, são exemplos de sucesso que vão voar do Asa Branca para o mundo. Eles foram contatados por olheiros e irão participar de avaliações em clubes em breve.
Mas não é a primeira vez que isso acontece. Por meio de amistosos e campeonatos, representantes da dupla Gre-Nal e de outros times Brasil afora escolhem prodígios para formar as categorias de base.
Piás que jogaram na quadra do Intercap já atuaram em países como Israel, Espanha, Japão e Alemanha. No Brasil, Figueirense, Novo Hamburgo e São José foram alguns dos times que já receberam atletas vindos dali.
— Eles estão aqui para serem profissionais – resume o voluntário Raul Monteiro, 45 anos, responsável pelas parcerias.
É o caso de Kauan e Jackson. Os dois são tímidos, mas compenetrados. Entraram no projeto por indicações de amigos e gastam as canelas para alcançarem o sonho compartilhado por muitos guris que vivem no país do futebol.
— Queremos que dê tudo certo e que a gente siga em frente. Estamos treinando todo dia para isso. É o caminho de um sonho nosso — diz Kauan.
Patrocínios
No entanto, para oferecer as oportunidades aos garotos, é necessário investimento. Além do tempo dos voluntários, recursos financeiros são essenciais.
Atualmente, o FC conta com algumas parcerias financeiras e com cursos de faculdades — como Educação Física e Psicologia. Na área de uniformes, recebe apoio da marca Arka Clothing, que oferece itens como jaquetas, e da Colortex Estamparia Digital, com coletes e bandeiras.
As principais lacunas do projeto, porém, se concentram nas áreas logística e alimentação.
Oferecer transporte para os guris irem aos campeonatos e proporcionar um lanche pós-treino são desejos dos organizadores.
— Não temos verba. Muitas vezes, tiramos dos nossos bolsos para ajudar eles. Fazemos tudo pelo amor — explica André.
Por isso, Raul faz questão de enfatizar que as portas estão abertas para novas parcerias:
— Somos extremamente competitivos. A gente só precisa de um patrocínio.
Para mais informações sobre parcerias, contate no (51) 98117-7939.
*Produção: Elisa Heinski