Estrelas da Periferia
Síganus: grupo de trap gaúcho traz "Drill Popular Brasileiro"
Da zona sul de Porto Alegre, o trio está prestes a lançar álbum que mistura gênero gringo com ritmos brasileiros.
Surgido na cidade americana de Chicago nos anos 2000, o drill é um subgênero do hip-hop, caracterizado pelas batidas pesadas. A palavra que dá nome ao ritmo significa “perfurar”, devido às letras que, tipicamente, trazem histórias reais e profundas.
O ritmo ganhou uma nova cara quando chegou ao Reino Unido, com o nome UK drill, onde foi combinado com elementos eletrônicos, tornando, assim, o som seco, um ritmo mais dançante.
Hoje, o gênero se espalhou pelo mundo, em cada lugar com suas variações e individualidades.
Primo brasileiro
Felipe de Freitas, 26 anos, Djimtiri Rodrigues, 28, e Ericsson Oliveira, 29, formam o grupo Síganus, que está ajudando a dar vida ao “primo brasileiro” do UK Drill, misturando melodias nacionais com as batidas perfurantes dos gringos.
Felipe Deds, DaNova e Dj Ericão, como são conhecidos, lançaram, entre 2021 e 2022, o seu primeiro EP, chamado BECO, projeto que soma mais de 60 mil acessos no YouTube e Spotify.
Uma das faixas, Samba Drill, mistura a alegria do ritmo brasileiro com a intensidade do som europeu. A música conta com um videoclipe gravado na comunidade, com a participação de uma passista.
Síganus está em processo de lançamento do álbum Drill Popular Brasileiro, no qual ostentam uma gama de referências musicais.
O primeiro single, que já foi lançado, chama-se Bom Dia Brasil. A música faz uma releitura de Garota de Ipanema e conta com a participação da rapper porto-alegrense Cristal.
O videoclipe da faixa reproduz uma cena matinal, que qualquer trabalhador gaúcho reconheceria: os artistas aparecem sentados em uma mesa pequena, coberta com uma toalha xadrez vermelha e branca, enquanto tomam um café preto, servido em uma daquelas típicas xícaras de vidro marrom, enquanto leem — é claro — o Diário Gaúcho.
A letra, inclusive, cita estas memórias e sentimentos compartilhados, para mergulhar na realidade das periferias.
Em março, o grupo lançou a canção Luz, com participação do cantor Maui. A faixa representa o propósito do grupo, um objetivo traçado em sua fundação: eles querem ser luz na escuridão. Mas, para entender porque eles adotaram essa meta, é preciso voltar às suas origens.
A missão
O trio se conhece das antigas — são crias do mesmo local, uma comunidade no bairro Vila Nova, zona sul de Porto Alegre. Sempre estiveram ligados pela vizinhança e se uniram pela música. A partir de 2014, Deds e DaNova estiveram no grupo Família 38, participando de batalhas de rimas, shows e festas.
Em 2016, enfrentaram uma das suas maiores batalhas, que marcou suas vidas e carreiras de maneira permanente. Eles perderam para a depressão um dos membros do grupo, o artista Arabim.
Com isso, os outros membros se separam, mas Deds e DaNova permaneceram juntos, com um propósito em comum:
— Mostrar que nosso sonho do rap ainda estava de pé. A gente tinha uma missão, pelo nosso irmão que se foi — contou Deds.
Com a chegada do DJ Ericão, surgiu Síganus.
O nome representa a vontade dos artistas de guiar os jovens pela música.
— Vem da palavra “seguir”. Queremos mostrar outras possibilidades e oportunidades para o jovem de periferia, para o jovem negro. (Mostrar) que ele só pode achar luz na arte e, assim, sair de momentos de escuridão — conta Deds.
Poetas vivos
— Acreditamos que nossa maior potência está na amizade, na cumplicidade, na empatia de entender as dificuldades da vida pessoal de cada um e transformar elas em força para seguir em frente — diz Deds sobre as adversidades enfrentadas.
Sendo artistas independentes e periféricos, os desafios viram combustível para a música. O trio não só usa sua realidade como tema das letras, como trabalha ativamente para mudá-la.
Eles integram, junto aos artistas Mariana Marmontel e Maicon PNA, o coletivo Poetas Vivos, que promove projetos culturais e sociais e já foi matéria no DG.
A iniciativa pretende valorizar e potencializar a arte preta e periférica, por meio da literatura, da educação, da música e do afroempreendedorismo.
Pitaco de Quem Entende
A rapper porto-alegrense Cristal, reconhecida nacionalmente pelo seu talento, fala sobre os artistas:
— A Síganus para mim é a junção de muita luta e de muito sonho. Pude fazer parte de um trechinho da caminhada dos guris e com muito orgulho fazer parte desse grande sonho também. É uma família para mim e tenho certeza que para tantos jovens que precisam tanto de uma frase, uma palavra de estímulo, de ver a Síganus no palco, nas escolas, universidades, festivais, viajando… Ver que é possível!
AQUI, O ESPAÇO É TODO SEU
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*Produção: Camila Mendes