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Especialistas explicam quando vale a pena fazer o empréstimo consignado do Auxílio Brasil   

Para ajudar quem pensa em fazer o empréstimo, o Diário Gaúcho conversou com especialistas e tira dúvidas sobre o tema.

03/12/2022 - 05h00min

Atualizada em: 03/12/2022 - 05h00min


Caroline Tidra
Caroline Tidra
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André Ávila / Agencia RBS
Valéria Boeira é uma das usuárias que conseguiu fazer o empréstimo

Reta final do ano e, com ele, chegam os gastos adicionais, alguns inevitáveis, desse período. A saída para muitas famílias é recorrer ao empréstimo para ter um pouco mais de tranquilidade e começar o ano com um respiro nas contas. Desde outubro, quem recebe o Auxílio Brasil, assim como outros benefícios de transferência de renda do governo, pode fazer empréstimo consignado com desconto direto na fonte. 

O consignado do Auxílio Brasil tem juros de no máximo 3,5% ao mês, mas cabe ao banco definir essa taxa. Na Caixa Econômica Federal, a taxa é de 3,45% ao mês, beirando o limite estabelecido pelo Ministério da Cidadania. A prestação máxima é de 40% do valor do Auxílio Brasil, considerando R$ 400 – visto que o atual valor do benefício de R$ 600 é válido só até este mês. Assim, o valor da parcela será de, no máximo, R$ 160.

– Os empréstimos consignados têm uma taxa de juros um pouco menor do que a do empréstimo pessoal, pois essa instituição financeira vai ter a garantia desse pagamento. A pessoa recebe o seu benefício já com o valor descontado. Diferente do empréstimo pessoal, em que ela vai fazer os pagamentos mensais por boleto ou por débito em conta e a garantia do banco é um pouco menor – esclarece Dina Prates, educadora financeira, sobre o que é o consignado. 

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Nos planos da autônoma Valéria Letícia Rocha Boeira, 34 anos, fazer empréstimo tinha uma finalidade: melhorias na casa. Há pouco mais de um mês, ela, os sete filhos, um neto e o companheiro se mudaram para um novo endereço no bairro Lomba do Pinheiro, na Capital. 

No entanto, o valor acabou sendo alternativa para suprir necessidades mais urgentes:

– Eu queria arrumar o telhado, colocar um portão e minha intenção era ajeitar a casa. Só que estávamos parados (sem trabalho) e o grosso da casa, como o alimento, é comigo. Fiz (o empréstimo) para a gente comer e usei uma parte para pagar contas. 

André Ávila / Agencia RBS
Dinheiro de Valéria, no final das contas, foi para a compra de alimentos

A compra da casa também foi possível por meio de empréstimo. Para cobrir as contas do mês, Valéria se vira com os bicos, como diarista, manicure, cabeleireira e, nos finais de semana, trabalha em um restaurante. Em outubro, ela procurou saber mais sobre o consignado do Auxílio Brasil em um grupo no Facebook. Lá, pessoas compartilham se conseguem ou não o valor, os problemas enfrentados na solicitação, entre outras dúvidas sobre o processo. 

– Eu recebia muitas propostas (de empréstimo) falsas, até de outros Estados, em que me pediam dados pessoais. Comecei a procurar no grupo para saber se alguém tinha recebido o valor do empréstimo do Bolsa Família (antigo nome do programa). Postei lá quando recebi, porque estava desacreditada de que ia conseguir – relembra. 

Após algumas tentativas e idas à Caixa, ela conseguiu obter o crédito e pagará o teto da prestação, tendo o desconto de cerca de 40% do benefício em 24 meses.

O Auxílio Brasil tem 21,1 milhões de famílias beneficiárias. Segundo dados divulgados na 

segunda-feira (28) pelo Banco Central (BC), esses empréstimos consignados chegaram a R$ 5 bilhões em outubro. O levantamento considera as concessões de empréstimos do dia 

11 de outubro até o fim do mês. Conforme o BC, em razão dessa possibilidade de obtenção de crédito, os bancos registraram uma alta de 328,6% na concessão de empréstimos consignados em outubro. 

A contratação do crédito ficou suspensa por cerca de 15 dias, entre o final de outubro e início de novembro. 

A suspensão ocorreu antes do segundo turno, após recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU), e o bloqueio seguiu após a eleição para processamento da folha de pagamento do benefício. Atualmente, o serviço está normalizado. 

Risco de endividamento

Especialistas alertam que é preciso ter cuidado ao optar pela medida liberada pelo governo, pois existe o risco de agravar o endividamento da população, que hoje já atinge 77% das famílias brasileiras.

– Conceder crédito consignado para quem vive em situação de vulnerabilidade, que não tem consciência de educação financeira, que não tem preparo para fazer esse enfrentamento, é uma situação extremamente delicada porque não vai alcançar o objetivo. Não é uma renda vitalícia. Muitas famílias entram e saem dos programas – disse a coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim, em entrevista à Rádio Gaúcha. 

Para a defensora pública Ana Carolina Sampaio Pinheiro de Castro Zacher, coordenadora do projeto Direito em Conta, um dos grandes problemas do público que vai até a Defensoria Pública do RS (DPE/RS) é a falta de informação sobre o que estão contratando. O projeto atende pessoas que estejam endividadas ou que queiram aprender mais sobre o mercado financeiro. 

– As pessoas fazem os negócios e não sabem muito bem as consequências. Fazem o empréstimo no dia de urgência e, depois, quando começa a ser descontado, não entendem o valor. A instituição bancária ou financeira tem a obrigação de fornecer todas as informações. Só que, como hoje fazemos tudo online, é muito distante o contato, o que acaba dificultando ainda mais o exercício desse direito e essa obrigação também, por parte da instituição bancária – explica Ana Carolina.

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Além do empréstimo vinculado ao Auxílio Brasil, foi autorizado o consignado no Benefício de Prestação Continuada (BPC), que é a garantia de um salário mínimo por mês ao idoso com 65 anos ou mais e à pessoa com deficiência. Ana Carolina explica que para esse tipo de crédito o cuidador do beneficiário precisa de uma autorização judicial. 

– As pessoas querem fazer empréstimo para pagar dívidas de conta de luz, para pagar botijão, para supermercado, para esses tipos de conta. Só que no mês que vem chegam mais contas e a pessoa vai ter sua renda diminuída, porque terá que pagar esse empréstimo, todo mês, por anos – diz Ana Carolina. 

Parceira no projeto, Wendy Haddad Carraro, professora de Ciências Contábeis da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e coordenadora do programa de extensão Educação Financeira para Todos e para Toda Vida, outro problema é a falta de controle das finanças: 

– As pessoas que procuram a Defensoria já estão muito endividadas e precisam se organizar. Já pegaram vários consignados, e não se dão conta de fazer uma simulação, acabam pagando um juro bem mais alto. Por exemplo, muitos pagam contas básicas usando o cartão de crédito, sendo que o juro é na faixa de 14%, 15%. 

A professora alerta sobre o pensamento que deve ser feito:

– Um dos temores é de que essas pessoas usem esse dinheiro em gastos com presentes. Elas não vão estar gastando R$ 2.500 que receberam, por exemplo, e sim o total do empréstimo, de R$ 3.800. 

Quando o empréstimo é uma saída?

As especialistas ponderam que o empréstimo consignado pode valer a pena quando há alguma necessidade que é urgente e, portanto, inadiável.

– O dinheiro é o fruto da renda, então pensar é importante. O empréstimo pode ser um investimento, por exemplo: quebrou a geladeira e é preciso comprar uma nova. Uma geladeira não se pode esperar seis meses, porque normalmente é uma coisa mais urgente. Então, tudo bem, você está investindo num patrimônio para sua casa. Caiu o telhado, bom, é preciso de dinheiro para trocar. É algo a ser construído, é patrimônio. Agora, pagar uma conta de supermercado ou despesas correntes, não é uma boa ideia – explica Ana Carolina. 

Dina segue a mesma linha de pensamento, mas reforçando que é preciso começar pelo levantamento do que são as prioridades antes do empréstimo. 

– Se a pessoa está vendo que o orçamento está muito apertado e tem algumas dívidas e isso está embolando, é entender qual é a prioridade do orçamento e quanto é necessário para as despesas, por exemplo, para me alimentar. Porque, às vezes, as pessoas estão buscando um empréstimo para tentar pagar dívidas, mas não tentaram a via da renegociação. 

O caminho da renegociação pode ser pela Defensoria Pública. Segundo Dina, tentar negociar as dívidas em parcelas pode ficar mais acessível para o contexto financeiro familiar do que optar pelo empréstimo para pagar essas contas. 

Dina destaca também o cuidado que se deve ter em relação a golpes que frequentemente chegam a beneficiários: 

– Muitas pessoas caíram em golpes durante a pandemia e agora teve um aumento, principalmente com quem recebe o Auxílio Brasil. Os golpistas ofertam empréstimos fáceis e dizem que vão depositar um valor maior se a pessoa pagar uma garantia, tipo R$ 50, para liberarem a quantia. Isso é um dos golpes mais comuns hoje. Não existe pagamento para ter a liberação. 



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