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Exemplo de vida

Adolescente de 14 anos dá aulas de balé para 50 meninas em Alvorada

Claudia Souza Malta Costa se dedica a ensinar o amor pela dança

05/11/2014 - 08h03min

Atualizada em: 05/11/2014 - 08h03min


Jeniffer Gularte
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Mateus Bruxel / Agencia RBS
Claudia ensina bale no ginasio da Escola Estadual de Ensino Medio Mauricio Sirotsky Sobrinho


Nenhum final de semana da estudante Claudia Souza Malta Costa é igual ao da maioria das adolescentes de 14 anos. Há dois anos, ela acorda todos os sábados às 7h45min e vai para a Escola Estadual Maurício Sirotsky Sobrinho, no Bairro Maria Regina, em Alvorada, onde é aluna do primeiro ano do ensino médio. Neste dia, ao invés de aluna, ela vira a profe Clau.
Até às 17h, dá aulas de balé para 50 meninas. Entre bailarinas de quatro a dez anos, ela é a líder de garotas que esquecem a realidade quando estão de sapatilha, meia-calça e collant. No assoalho do ginásio, os passinhos ensaiam a coreografia para um mundo novo a partir da dança.
- Aqui é um espaço para sonhar, porque a realidade lá fora é brava. É lindo ver o empenho delas, aqui elas se sentem - comenta a mãe de Claudia, a vendedora autônoma de cosméticos e figurinista Marlene Costa, 48 anos, que supervisiona todas as aulas.

Espacate é pura emoção
Aula de vitalidade e de amor ao balé em Alvorada
 

As novinhas têm mais flexibilidade e as mais velhas demonstram equilíbrio. Com a música de fundo, a professora dá a ordem e os joelhos flexionam, os braços curvam em um movimento delicado e os pezinhos sobem e descem. Muitas delas jamais se imaginaram capazes de fazer um espacate - movimento de abrir as pernas para que fiquem paralelas ao chão.
- Dá uma emoção quando a gente dança. Algumas não conseguem e choram, mas a profe Clau vai lá e nos dá coragem - conta Kauany Nunes dos Santos, dez anos, aluna do balé há dois anos.

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Ela faz a diferença
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Kauany Nunes dos Santos tem dez anos

Fotos: Mateus Bruxel

Só o amor pela dança explica tamanha dedicação. Claudia não só é uma jovem fora do convencional, como também faz a diferença na vida de meninas com realidades semelhantes à sua. Enquanto as amigas estão e entretendo nas redes sociais ou se preparando para festas, ela, voluntariamente, dá lições de paciência e disciplina para meninas que dificilmente teriam contato com o balé de outra forma.
Por intermédio do programa Escola Aberta do governo federal - que incentiva a abertura nos finais de semana de escolas públicas em territórios de vulnerabilidade social - ganha uma ajuda de custo de R$ 20 por aula para passagem e alimentação. Como mora a oito quadras da escola, vai a pé, retorna para casa para o almoçar e poupa o dinheiro para pagar as aulas que faz em uma escola de balé particular em Alvorada.


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Em oito anos de dança, esta é a primeira vez que Claudia consegue, com a ajuda da mãe, pagar aulas de balé. Hoje com movimentos exemplares, ela começou da mesma forma que suas alunas. Aos seis anos, passou a ensaiar balé no Colégio Estadual Érico Veríssimo, na Vila Sumaré, que também oferecia aulas gratuitas pelo Escola Aberta. Ia de ônibus, mas quando faltava o dinheiro para a passagem fazia o caminho a pé. O tempo foi passando e o balé se tornou um vício, como ela mesma define. Após concluir o ensino médio, planeja cursar Dança na Ufrgs.
- Me imagino dançando até quando eu puder, a dança é a minha vida, penso nisso 24 horas por dia. Quando estou dançando, é um dos melhores momentos da minha vida, é a forma que eu tenho de expressar meus sentimentos - diz Claudia.
Ela mora com a mãe e a irmã de dez anos, que também dança, no Bairro Salomé. Há dois anos, se apegou ainda mais ao balé depois da perda do pai. Em casa, treina até duas horas todos os dias e agora tem uma sala especial que a mãe conseguiu dar a ela com a ajuda de doações.
_ Com a morte do meu pai, tive que amadurecer logo para ajudar minha mãe. A dança me ajudou muito a ter disciplina.


Elas também querem ensinar

Nas aulas, as regras da profe Clau são claras: é proibido correr, se empurrar e as maiores não podem pegar as menores no colo.
- Cuido para elas não fazerem muitas voltas e ficarem tontas. Quando dá bagunça, chamo a atenção - conta a profe.
As meninas afirmam que se tornaram mais disciplinadas até na sala de aula. Quem tira notas baixas não pode ir ao balé.
A postura de líder de Claudia as inspira a fazer o mesmo. As irmãs Mariana, 11 anos, e Débora Gomes Magalhães de Souza, dez anos, também querem se especializar na dança para dar aula de balé.

Balé dentro e fora da sala de aula

Para que os movimentos sejam delicados e precisos, Joyce Franciele Pereira, dez anos, treina fora dos ensaios.
- O balé te deixa com uma boa postura de menina, é delicado e tão bonito para uma guria. Estou aqui há dois anos e é muito legal. Além de fazer aulas aqui, temos que ensaiar em casa, na frente do espelho. Uma menina, se quer ser dançarina, tem que treinar para não ter dores - diz Joyce.
As pequenas também se empenham. Kailany Rodrigues de Oliveira tem quatro anos e é a caçulinha da turma. Durante as aulas, não desgruda o olho dos movimentos da profe.
- Ela não fica sem vir, e a dança ajudou a controlar a energia que tem. Sem falar que a Clau orienta elas a terem disciplina, higiene pessoal e a manter os estudos em dia. É um exemplo - conta a mãe, a recreacionista Thais Oliveira Rodrigues, 23 anos.

Sem recursos, mas com vontade

A falta de recursos impõe barreiras, mas elas não deixam de sonhar. Nem todas as meninas têm suas próprias sapatilhas, por isso Claudia faz contato com brechós que vendem as peças a R$ 2. Em dezembro, ganharão um kit de doação de uma loja da cidade. Para a apresentação do final do ano, a escola está rifando uma cesta de Natal. Segundo a diretora Rosangela Melo, com recursos do Escola Aberta também será possível comprar alguns figurinos.
A sapatilha é de segunda mão, a meia-calça pode estar rasgada ou a saia desbotada, mas elas não deixam de ir. Nada atrapalha.
- Se precisa, uma mãe ajuda a outra, porque muitos pais não têm mesmo condições de comprar - comenta a recreacionista Thais Oliveira Rodrigues, que tem duas filhas no balé.
E as dificuldades não vêm de agora. Na escola, as aulas começaram em uma sala onde o quadro negro servia de barra de apoio. A turma foi crescendo, precisou de mais espaço e passou a ocupar o refeitório. Hoje, é o ginásio coberto que abriga as aulas.
- Faz só um ano que conseguimos a barra de ferro - conta Claudia.

Interessados em fazer doações para o projeto podem contatar a escola pelo telefone 3443-3082.

 


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