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Porto Alegre

Viaduto da Capital que ficou famoso durante a Copa do Mundo virou abrigo de moradores de rua 

Com 83 anos, estrutura histórica do Centro da Capital está descuidada e tomada por pessoas sem teto. Insegurança aumenta apreensão de comerciantes do local

24/09/2016 - 11h00min

Atualizada em: 24/09/2016 - 11h02min


Jeniffer Gularte
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Aquele Viaduto Otávio Rocha cuja imagem correu o mundo pela festa que a torcida da Holanda fez durante a Copa do Mundo, em junho de 2014, é muito diferente do cenário visto por quem passa atualmente pela estrutura histórica.
Com 83 anos, o principal ponto da Avenida Borges de Medeiros, no Centro Histórico da Capital, virou abrigo de moradores de rua, que disputam espaço no local tombado em 1988 por suas características arquitetônicas e sua relevância sociocultural.

Torcida holandesa durante o Caminho do Gol, na Avenida Borges de Medeiros, durante a Copa do Mundo de 2014


Em uma sexta-feira, às 8h45min, a reportagem avistou no local 31 colchões, alguns deles com lonas e cobertores, improvisando barracas. No mesmo horário, foram vistos 14 moradores de rua dormindo no Viaduto.

– Virou um condomínio – classifica a comerciante Elaine Lima, 63 anos, que tem loja no viaduto há 15 anos.


Há 30 anos com comércio no viaduto – primeiro em um bar e há 16 anos, em um sebo de livros e discos – o presidente da Associação dos Comerciantes do Viaduto Otávio Rocha, Adacir José Flores, 55 anos, se divide entre o querer uma outra realidade para o local e a tentativa de se colocar no lugar das pessoas que usam o viaduto como única alternativa de moradia.

Há 30 anos como comerciante no viaduto, Adacir vivi diariamente o avanço do problema


Ele diz que, desde o começo do ano, a situação dos moradores de rua passou a ficar fora do controle. A ocupação diminuiu a circulação de pessoas e fez despencar as vendas de quem tem comércio no local. Nos últimos meses, a queda dos negócios chega a 70%, calcula Adacir. A Feira Multicultural que acontecia todos os sábados na calçada, com artesanato e antiguidades, deixou de acontecer devido ao comprometimento do espaço e à falta de público.

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A situação vem sendo apontada com motivo para a redução no número de salas ocupadas. O viaduto tem 36 espaços comerciais, dos quais oito são ocupados por entidades e associações e 16 por lojas e estabelecimentos.

O comandante do 9º Batalhão da Polícia Militar (BPM), tenente-coronel Marcos Vinicius Gonçalves de Oliveira, informa que são feitas abordagens frequentes aos indivíduos do local:

– Eles disputam espaço e brigam entre eles, como acontece em outros lugares. Esse é um problema social, não é de segurança pública.

Projeto de restauração procura investidor

Um projeto de restauração do Viaduto Otávio Rocha foi elaborado pela prefeitura. A obra é orçada em R$ 25 milhões, e prevê correção de problemas de infiltração, novo revestimento e pintura, restauração das escadarias e dos banheiros, além de instalação de iluminação com lâmpadas de led e piso acessível. Com a revitalização, a ideia é transformar o local em um espaço gastronômico e que atraia mais turistas.

O secretário de Desenvolvimento e Assuntos Especiais, Edemar Tutikian, explica que a revisão do projeto está sendo concluída, além de um levantamento geral das lojas e dos contratos de locação. Como não há recurso público para o projeto, a ideia da prefeitura é encaixar esta obra na contrapartida de outro projeto da cidade.

A assessoria do prefeito José Fortunati informou que reconhece que os moradores de rua representam uma dificuldade e ressaltou que está procurando solução para as pessoas que estão lá antes de buscar investidores para a restauração.

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Atrativo para moradores de rua


Moradores de rua abordados pela reportagem, que não quiseram se identificar, comentam que o Viaduto é um lugar bom e seguro para se ficar. A técnica social e pedagoga Patrícia Mônaco, integrante da Central de Abordagem da População em Situação de Rua da Fasc, explica o fluxo de moradores de rua no Viaduto Otávio Rocha aumentou devido ao crescimento da violência envolvendo o tráfico de drogas, que força pessoas ameaçadas a saírem dos bairros e irem para o Centro.


Uma equipe da Fasc visita o viaduto ao menos duas vezes por semana, mas Patrícia admite que, para cada atendimento com sucesso, outros cinco novos casos aparecem:

– Este é um espaço de proteção da intempérie, é largo, tem banheiro nas suas extremidades. A circulação de pessoas garante que o morador de rua não seja apanhado de sorte por outros.

Outro ponto atrativo do local é a forte rede de distribuição de alimentos, principalmente à noite.

– À medida que a alimentação deixa de ser uma necessidade, porque ela é farta na rua, a questão do albergue não é mais atrativa – explica.

Na avaliação de Patrícia, para retirar os moradores do viaduto seriam necessárias políticas públicas de habitação popular, como o aluguel social, e o investimento na inserção destes indivíduos no mercado de trabalho.




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